Partidos preocupados com directiva da PGR pedem esclarecimentos

Maioria dos partidos quer ministra da Justiça e procuradora-geral da República a dar explicações no Parlamento.

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Lucília Gago LUSA/HUGO DELGADO

A polémica do da directiva da procuradora-geral da República chegou ontem à política e em força, com a maioria dos partidos a mostrar preocupação com o seu conteúdo. E há mesmo forças políticas que já anunciaram ir pedir a presença da ministra da Justiça e da procuradora no Parlamento, para prestarem esclarecimentos.

Nem o Presidente da República escapou a ser questionado sobre o caso. Marcelo Rebelo de Sousa recusou fazer grandes comentários, alegando que o caso vai para tribunal, referindo-se ao facto de o Sindicatos dos Magistrados do Ministério Público já ter prometido pedir judicialmente a revogação da directiva sobre a hierarquia no MP. “O que o Presidente da República diz é que o Ministério Público é autónomo e os tribunais são independentes”, disse Marcelo.

O chefe de Estado frisou que “o máximo” que pode dizer, para não se “imiscuir na autonomia do MP”, é que sempre defendeu a necessidade de se “apurar a verdade toda, doa a quem doer, sobre a questão de Tancos”, estando para isso disponível para responder a “tudo”, acrescentou numa alusão à circunstância de na origem da directiva contestada estar a decisão, comunicada pelo director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal aos procuradores que investigavam o caso de que não seria ouvido o Presidente da República.

O vice-presidente da bancada parlamentar do PSD Carlos Peixoto defendeu nesta sexta-feira que a directiva da PGR contém orientações que “ofendem a legalidade e até a própria Constituição”. “A senhora procuradora [geral da República] pode dar as suas explicações, pode eventualmente até mudar de posição, deixando cair uma directiva que por escrito mandou transmitir a todos os procuradores, orientações que nos parecem que ofendem a legalidade e até a própria Constituição da República Portuguesa”, afirmou o deputado, em declarações à agência Lusa.

Apesar de o PSD não prever dar entrada de nenhum pedido da audição ou iniciativa legislativa, o vice-presidente da bancada adiantou que os sociais-democratas vão votar favoravelmente os requerimentos que sejam apresentados por outros partidos, porque “é evidente que o PSD não tem nada a obstar que a senhora procuradora seja ouvida, para esclarecer exactamente aquilo que quer e aquilo que pretende com uma directiva destas”.

Já o BE pediu “transparência” para evitar “apropriações indevidas” na acção do MP. “Para que a hierarquia seja garantia de unidade, mas não esteja aberta a apropriações indevidas na acção do MP, quer na base quer no topo, é necessário que haja transparência daquilo que são as directivas hierárquicas que são colocadas em qualquer momento dos processos penais”, considerou o deputado José Manuel Pureza.

Os bloquistas não colocam, para já, a hipótese de avançar com uma iniciativa parlamentar, por considerarem que, nesta fase, o debate ainda “precisa de ser amadurecido no interior do MP e o Parlamento não tem nem deve ter qualquer interferência que vá para lá da separação de poderes”.

O PCP, por sua vez, defendeu que nunca se foi “tão longe” na limitação da autonomia do Ministério Público, sustentando que a directiva sobre a hierarquia do MP carece de “cobertura legal”, sendo de “duvidosa constitucionalidade”. “O PCP expressa a sua preocupação pela recente directiva emanada da Procuradora-Geral da República, cujo alcance e conteúdo estão a causar justificada perturbação e indignação dentro e fora do Ministério Público”, escreve o partido numa nota.

O CDS-PP defendeu que a directiva coloca em causa a autonomia do MP, com a gravidade acrescida de não serem registadas instruções ou ordens que sejam dadas. O deputado Telmo Correia sublinhou que o MP é autónomo nas suas funções, quer internamente quer externamente, e que esta instrução se assume “muito claramente contra esse principio de autonomia”. Para Telmo Correia, acresce a “gravidade maior ainda de não ser sequer registado no processo as instruções e as ordens que são dadas”.

O CDS acrescenta que terá “o máximo interesse” em acompanhar os esclarecimentos entretanto pedidos por outras forças partidárias e não julga necessário aditar um pedido aos já existentes. “Será importante ouvir a procuradora-geral da República e a ministra da Justiça”, concluiu Telmo Correia.

O PAN também se mostrou preocupado com a directiva, alegando que podem estar “princípios constitucionais em causa” e admitiu requerer esclarecimentos à ministra da Justiça e à procuradora-geral da República. “É com bastante preocupação que olhamos para isto que se está a passar e que esperamos que não penhore, em medida alguma, aquilo que são os poderes e a autonomia do MP, no âmbito a condução dos processos, e que, acima de tudo, não haja aqui qualquer tipo de confusão ou mistura de poderes relativamente aquilo que entre é a justiça e aquilo que é o poder político”, disse Inês Sousa Real.

A deputada admitiu chamar ao Parlamento a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, e a procuradora-geral da República, Lucília Gago, manifestando disponibilidade para votar a favor dos requerimentos que entretanto outros partidos apresentarem.

O Chega foi o primeiro anunciar que vai propor a audição parlamentar da ministra da Justiça e da procuradora-geral da República para prestarem esclarecimentos sobre directiva e pediu intervenção do Presidente da República. “As notícias que saíram ao longo da última semana relativamente ao Ministério Público causam em todos os cidadãos preocupados com a democracia uma enorme perplexidade”, refere o deputado único do Chega, André Ventura.

Na óptica do também líder do partido, “as investigações a políticos não podem estar condicionadas a autorizações hierárquicas ou a decisões hierárquicas arbitrárias”, pelo que “retirar autonomia aos magistrados pode acabar em processos arbitrários contra políticos e arquivamento injustificáveis de processos dos amigos do regime”.

A Iniciativa Liberal também quer ouvir com “urgência” a procuradora-geral da República no Parlamento, por considerar que a nova directiva pode pôr em causa “investigações criminais a políticos” e “transparência” dos processos. “Este pedido, com carácter de urgência, resulta da directiva da procuradora-geral da República, que pode levar ao fim das investigações criminais a políticos. Perante a gravidade dos factos conhecidos, a IL considera que “a transparência de todos os processos passará a estar em causa”, escrevem em comunicado enviado à imprensa.

O PÚBLICO pediu, através de um assessor, uma reacção à direcção do grupo parlamentar do PS, mas não obteve resposta até ao fecho desta edição.

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