Morreu Peter Serkin, o pianista que não conseguiu fugir à sua herança

Filho e neto de nomes grandes da música, Peter Adolf Serkin deixou também a sua assinatura, tanto em gravações como ao vivo, tocando desde Bach a Pierre Boulez.

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Peter Serkin DR

Peter Serkin, um dos grandes nomes mundiais do piano da segunda metade do século XX e também do século XXI, morreu este sábado na sua casa de Nova Iorque. Tinha 72 anos, e foi vítima de um cancro no pâncreas, segundo informou a família.

No seu obituário, o crítico do New York Times disse de Serkin ter sido “um pianista admirado pelas suas interpretações empáticas, performances tecnicamente perfeitas e pelo compromisso tenaz com a música contemporânea”. De facto, a extensa carreira de intérprete, que praticamente começou com Bach e passou por Mozart e Beethoven, demorou-se a partir de certa altura no cultivo da música contemporânea, de Messiaen a Tõru Takemitsu, de Schönberg a Pierre Boulez e a Elliot Carter.

“É muito duro ver assim cair um dos nossos heróis”, disse o maestro americano Alan Gilbert, actual director musical da Filarmónica de Nova Iorque, citado pelo jornal francês Le Figaro, lamentando o desaparecimento de Serkin.

Peter Adolf Serkin nasceu a 24 de Julho de 1947 em Manhattan, filho de outro “monstro” americano do piano, Rudolf Serkin (que tocou com Leonard Bernstein), neto de um violinista e compositor também conceituado, Adolf Serkin — daí o seu nome do meio —, e ainda sobrinho neto de um maestro, Fritz Busch. “Entrei na música sem o ter decidido eu próprio”, partilhara Serkin numa entrevista ao New York Times. Poderá dizer-se que, na sua carreira, acabou por conseguir superar o peso dessa herança, desse destino.

Começou a estudar apenas aos 11 anos, no Instituto Curtis, em Filadélfia, onde completou o curso em 1965. Um ano depois, com 18 anos, conquista um Grammy como intérprete mais promissor na gravação de clássicos — as obras em causa sendo… Variações Goldberg, de Bach, e a Sonata n.º 18 de Schubert (edição RCA Records).

Não se sabe se a fugir desse seu destino musical ou não, no início da década de 1970, já casado e com uma filha, Serkin decide viajar pela Ásia — Tailândia, Índia —, e estabelece-se de seguida numa pequena cidade rural do México. Mas, ao ouvir a música de Bach no rádio de um vizinho, decide assumir o seu destino de vez. Regressa aos Estados Unidos e ao piano. Toca com orquestras como as de Cleveland e Filadélfia, e sob a batuta de maestros como Claudio Abbado, Daniel Baremboim, Pierre Boulez ou James Levine; associa-se a formações como o Trio Tashi (Fred Sherry, violoncelo; Richard Stoltzman, clarinete; Ida Kavafian, violino); retoma a gravação de discos (com Mozart e Messiaen, volta a receber nomeações para os Grammys), e ensina na Juilliard School e no Bard College, em Nova Iorque, e na Universidade de Yale.

E tocava Bach com o mesmo espírito não convencional com que tocava Boulez ou Charles Wuorinen: com camisas floridas e óculos escuros.

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