Nem tudo o que cresce é ouro!

Desprezar o crescimento extraordinário e, sobretudo, o crescimento sustentado, tendo em conta as condições do país, é um misto de contradição e de enviesamento rudimentar da nossa realidade.

A direita, e alguns dos seus comentadores, na falta de melhores argumentos, tem trazido para a discussão o tema do crescimento económico do país e, principalmente, a ideia de que, apesar de tudo, Portugal cresce menos que o grupo dos países da coesão. Nesta tentativa de desvalorizar três anos de crescimento económico acima da média da UE, o PSD, e o resto da companhia, não conta a história completa e escolhe cirurgicamente argumentos (apenas) para poderem ir a jogo no debate político, depois de anos (perdidos) a bater na tecla de que o diabo” ia comprometer os resultados previstos pelo Governo.

Desprezar o crescimento extraordinário e, sobretudo, o crescimento sustentado (porque está baseado no dinamismo das exportações e no investimento privado), tendo em conta as condições do país, é um misto de contradição, pelo modelo económico baseado na procura externa e investimento, abundantemente defendido por estes partidos, e de enviesamento rudimentar da nossa realidade mas, sobretudo, do nosso ponto de partida. 

É verdade que em 2018 a média do crescimento dos 16 países da coesão foi de 3,9% e Portugal cresceu 2,4%. Mas este não é um cenário novo: foi sempre assim desde 2011, Portugal cresceu sempre abaixo da média do crescimento dos países de coesão. Entre 2011 e 2018 a média de crescimento dos países de coesão foi de 2,4%, já Portugal cresceu 0,4%.

Mas em que circunstâncias ocorreu este crescimento? No nosso país, apesar do esforço de redução da divida da anterior legislatura e de o orçamento de 2020 impor um caminho robusto, através de um histórico excedente orçamental, a dívida em relação ao PIB ainda está muito acima do desejado e do necessário. Na análise da década, os países da coesão apresentam uma dívida média de 64% do PIB e Portugal de 127%. Não é um pormenor insignificante.

Se analisarmos as razões do crescimento da quase totalidade destes países compreendemos que ali o investimento público assumiu uma grande expressão, puxando pelo crescimento económico numa lógica keynesiana pura e dura. Sabemos que não foi uma opção do nosso país evitar um choque de investimento público. Foi apenas a construção de um caminho que garantia a consolidação das contas públicas. Os resultados são, porém, incontestáveis: a devolução de rendimentos, mas também um modelo sustentável de crescimento económico, conforme aliás propagava a direita vezes sem conta. É por isso que, em Portugal, o investimento público em percentagem do PIB foi em toda a década de 2,2%, enquanto a média do investimento público em percentagem do PIB nos países da coesão foi de 3,9% entre 2011 e 2018. Estes valores representam praticamente o dobro do investimento público do nosso país, permitindo taxas de crescimento económico acima dos 3% apenas” pela injeção maciça de dinheiro dos contribuintes e, aqui sim, com carga fiscal pesada. Portanto, está fácil de observar que se trata de crescimentos muito menos sustentáveis do que o de Portugal que, nos últimos anos, tem baseado o seu dinamismo nas exportações e no investimento privado.

O labirinto de contradições de alguns partidos exige que expliquem direitinho o caminho que propõem, porque os seus argumentos levam a uma equação de solução sofrível.

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