BE propõe compromisso para a mobilidade ciclável no Porto

Bloquistas criticam fraco desempenho do executivo liderado por Rui Moreira na criação de condições para que o uso deste modo de transporte aumente na cidade. Mas acreditam que, com algum investimento e vontade política, o panorama pode mudar.

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Cidade continua ter poucos circuitos segregados para circulação em bicicleta, queixa-se o BE Paulo Pimenta

O Bloco de Esquerda apresentou esta quinta-feira doze propostas que, na perspectiva deste partido, poderiam ajudar o Porto a decuplicar – ou seja, multiplicar por dez – o peso das deslocações em bicicleta que, no último Inquérito à mobilidade se situava nuns sofríveis 0,4%, muito longe dos 7% da média europeia. Apesar de considerar que o actual executivo não está comprometido com o incremento de utilização da bicicleta na cidade, o BE insiste na necessidade de acrescentar esta alternativa às políticas de mitigação do uso do automóvel e, nesse sentido, vai tentar, na assembleia municipal desta segunda-feira, fazer aprovar um compromisso político nesta matéria.

A reunião extraordinária da AM foi convocada a pedido do PCP e tem como tema a mobilidade no Porto. Nesta área tem estado na ordem do dia o desempenho do transporte público – entre o sucesso do Programa de Apoio à redução Tarifária e a pressão que o aumento da procura coloca sobre os serviços do metro e da STCP – mas o Bloco insiste em acrescentar ao debate os modos suaves e, nestes, principalmente a bicicleta. Para o executivo municipal não há dúvidas de que a prioridade, no reordenamento da via pública, deve ser dada aos peões, algo com que o Bloco concorda, mas à equipa liderada por Moreira falta, para o BE, empenho na criação de condições para aumentar as deslocações em duas rodas, ao contrário do que vêem acontecer em Lisboa.

Confrontado com este quadro político, o Bloco já ficaria minimamente satisfeito se o município se comprometesse em elevar o “share” das deslocações em bicicleta aos 4%, em 2025, ano em que Lisboa planeia ter 15% das viagens quotidianas feitas desta forma. “Por nós seríamos mais ambiciosos, mas não somos o Governo da cidade”, assumiu o deputado municipal Pedro Lourenço, que dará a cara pela proposta, na segunda-feira.

Assim, mais do que tentar convencer todas as bancadas, e principalmente a da maioria que suporta Rui Moreira, do detalhe das propostas concretas que esta quinta-feira divulgou, o BE já se dará por satisfeito se conseguir fazer passar uma recomendação mais genérica, com três pontos: que a câmara avance com um plano de mobilidade ciclável; que o PDM cuja revisão está a terminar incorpore, nos mapas e no regulamento, essa decisão política e que o Orçamento de 2021 o orçamento municipal inclua já dotações para as obras necessárias.

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A ciclovia da Boavista apresenta erros de concepção que não foram ainda resolvidos Paulo Pimenta

Rede municipal e intermunicipal

O BE considera que as obras que têm sido executadas carecem de visão estratégica e de um sentido de rede. E a sua primeira proposta é a de execução de um plano pensado, e projectado, com participação e envolvimento da sociedade civil. Faria sentido, para este partido, que à semelhança do que já acontece em Braga e em Lisboa, o Porto tivesse um “Mayor” para a bicicleta, alguém cujo exemplo e conhecimento pudesse contribuir, também, para o incremento do uso deste modo de transporte e servir de contacto entre utilizadores e o poder local.

Do ponto de vista das infra-estruturas, o Bloco defende a construção de uma rede municipal – que não passa pelo investimento massivo em vias segregadas para bicicletas, mas uma conjugação destas com vias 30 Km/h, de trânsito partilhado e outro tipo de canais. Pede também a criação de percursos intermunicipais, o que nalguns casos significaria tão só reabilitar circuitos antigos, como o que usava a berma da Avenida AEP (para Matosinhos) ou a própria ponte da Arrábida (para Gaia), fazendo uso, neste último caso, dos elevadores da ponte, para a ligação entre a cota alta e a marginal ribeirinha.

O BE desafia também o município a disponibilizar parqueamento “adequado, seguro e gratuito” para bicicletas na cidade, o reforço das ligações mecanizadas entre as cotas que permita desmistificar a questão da orografia da cidade – que aparece sempre como justificação para um uso incipiente das duas rodas sem motor. “Esta seria uma medida de baixo custo e alto impacto”, nota o activista Miguel Barbot, “ciclista” diário, no Porto, há uma década, candidato independente pelo Bloco nas últimas autárquicas e principal autor destas propostas. Que sintetizam um trabalho de auscultação de várias entidades, explicou Lourenço.

De olhos postos noutras experiências internacionais, o BE propõe transformar alguns bairros em “zonas bicicleta”, onde esta pudesse ser o complemento do transporte público para as pequenas deslocações diárias. Para isto basta “tinta”, notam os bloquistas, e o impacto multiplicador de uma iniciativa deste género, que podia ter um projecto-piloto num primeiro espaço, seria também elevado, acreditam. Nos doze trabalhos que propõe à cidade, o BE inclui, na área da segurança, medidas de acalmia de tráfego, que permitam levar a bicicleta, sem riscos, mesmo para ruas onde não haja faixas dedicadas. E pede que as faixas bus sejam abertas a este tipo de veículos, tal como hoje já acontece com os ciclomotores.

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Um guia para pedalar na cidade

Num quarto grupo de medidas dedicado à mudança de mentalidades, os bloquistas pedem dinamização de campanhas de incentivo à deslocação em bicicletas e de promoção de segurança na estrada, a criação de um sistema de bicicletas partilhadas na cidade, articulado com os municípios vizinhos e não dependente da oferta privada; a adesão à Semana Europeia da Mobilidade e ao dia Mensal sem Carros. Pedro Lourenço não esquece o compromisso, não cumprido pelo executivo, de fechar algumas ruas ao trânsito, mensalmente, e considera que essa iniciativa continua a fazer sentido. A última medida deste leque de propostas seria a publicação de um guia bilingue e mapa ciclista do Porto.

Para o Bloco, o município não pode ignorar os contributos da mobilidade ciclável para os objectivos locais de redução das emissões de gases com efeito de estufa e de combate às alterações climáticas. O grupo municipal deste partido vê a bicicleta como um entre vários modos alternativos a um quotidiano excessivamente dependente do automóvel e, principalmente, como um complemento ao transporte público, que requer, lembram, investimentos mais pesados. Mas, dada a emergência climática em que nos encontramos, consideram que as mudanças são “urgentes”, o que não se coaduna com o ritmo e a qualidade das intervenções que vêm sendo realizadas, considera Pedro Lourenço. 

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