Instagram, a plataforma de publicidade eficaz aos cigarros electrónicos

Investigadores norte-americanos analisaram mais de 200 mil publicações no Instagram para perceber de que forma os cigarros electrónicos têm vindo a ser retratados nas redes sociais.

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Valentyn Ogirenko/REUTERS

Apesar dos alertas e campanhas de consciencialização de entidades de saúde pública em todo o mundo, os cigarros electrónicos têm vindo a ganhar cada vez mais popularidade entre os jovens. Um estudo, publicado esta terça-feira na revista Frontiers in Communication, analisou mais de 200 mil publicações no Instagram sobre cigarros electrónicos para perceber de que forma estes produtos têm vindo a ser retratados nas redes sociais.

A equipa, composta por cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA) e do Centro de Investigação Integrada em Leucemia Infantil e Ambiente dos Estados Unidos, analisou as publicações relacionadas com cigarros electrónicos no Instagramatravés de hashtags, e chegou à conclusão de que a hashtag #TheRealCost (“O Custo Real”), criada no âmbito da campanha de consciencialização contra o consumo de cigarros electrónicos, lançada em Setembro de 2018, pela Food and Drug Administration (FDA, agência federal norte-americana para a saúde e alimentação), era usada cerca de 50 vezes por mês no Instagram. Por outro lado, as hashtags que incentivam ao consumo de cigarros electrónicos eram usadas cerca de dez mil vezes mais frequentemente do que a #TheRealCost.

Para o estudo, os especialistas reuniram 245.894 publicações no Instagram (através de hashtags como #vape e #ejuice), feitas entre 2017 e 2019, antes e depois do lançamento da campanha #TheRealCost. Realizaram ainda entrevistas a cinco influenciadores — que utilizam as redes sociais para promover produtos e tendências — e oito utilizadores regulares das redes sociais.

“Centrámo-nos no Instagram porque os influenciadores [com campanhas a favor do consumo de cigarros electrónicos] que entrevistámos para este estudo identificaram o Instagram como a sua plataforma mais importante de marketing nas redes sociais”, explica em comunicado a principal autora Julia Vassey, da Universidade da Califórnia. No entanto, em Dezembro passado, o Instagram anunciou a proibição da publicidade a estes produtos devido às mortes nos EUA associadas ao uso destes cigarros.

Sabores e aparelhos com cores vibrantes

As conclusões deste estudo revelaram que a campanha de consciencialização da FDA teve um impacto limitado junto dos consumidores mais jovens de cigarros electrónicos, que continuaram a divulgar estes produtos nas redes sociais. Os cientistas estimam que quase um terço dos adolescentes norte-americanos consome cigarros electrónicos.

“Com base nos resultados, [concluímos que] a campanha da FDA não é muito popular e encontrámos até comentários de utilizadores do Instagram a contestarem as alegações da FDA sobre os efeitos prejudiciais da nicotina na saúde e a classificar a campanha de propaganda”, destaca a autora. Os dados mostraram ainda que as publicações relacionadas com cigarros electrónicos tiveram quase três vezes mais “gostos” depois de a campanha da FDA contra o uso destes produtos ter sido lançada, com a campanha a revelar-se até contraproducente.

Ao analisarem o conteúdo de 49.655 imagens, os investigadores descobriram que mais de 70% retratavam e-juices (líquidos de sabores para os cigarros electrónicos), bem como os próprios dispositivos electrónicos, que muitas vezes são personalizados e têm cores vibrantes e acabam por atrair os jovens e os fumadores recentes. Os dados analíticos partilhados pelos influenciadores mostraram que uma grande parte dos seus seguidores são menores de idade, entre os 13 e os 17 anos.

Travar a sua proliferação entre os jovens

O estudo envolveu ainda uma análise profunda dos dados, de forma a compreender as estratégias de marketing utilizadas pelas empresas de cigarros electrónicos. “As autoridades de saúde pública dos EUA estão a classificar como epidemia o consumo de cigarros electrónicos entre os jovens e têm-se esforçado para impedir tal epidemia ao lançarem a campanha #TheRealCost”, nota Julia Vassey. “O grande desequilíbrio no volume de publicações [contra e a favor dos cigarros electrónicos] fez com que a mensagem da FDA fosse abafada pelo marketing das marcas de cigarros electrónicos”, acrescenta.

O consumo de cigarros electrónicos e vaporizadores tem vindo a aumentar drasticamente entre os adolescentes, que encaram estes produtos como alternativas mais saudáveis ao tabaco convencional. No entanto, os especialistas avisam que os cigarros electrónicos podem causar inflamações, problemas de imunidade e doenças respiratórias.

Segundo os participantes neste estudo, a campanha #TheRealCost fomentou o medo, em vez de dar orientações sobre estratégias para deixar de fumar. No futuro, os investigadores esperam que esta análise ajude a orientar as próximas campanhas de intervenção em saúde pública e pretendem analisar de que forma estas publicações se traduzem num consumo real destes produtos.

“Esperamos que as descobertas forneçam aos reguladores de saúde pública informações sobre os canais mais populares usados pelos influenciadores para promover conteúdo a favor dos cigarros electrónicos entre a população menor de idade, para ajudar a combater a publicidade aos cigarros electrónicos e travar a sua proliferação entre os jovens”, conclui Julia Vassey.

Em Dezembro passado, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) portuguesa alertou para os riscos do tabaco aquecido e cigarros electrónicos e aconselhou os consumidores a não usarem este tipo de produtos. Nos Estados Unidos, o número de casos de doenças pulmonares e de mortes associadas ao consumo de cigarros electrónicos ou dispositivos de vaporização tem vindo a aumentar ao longo dos últimos meses.

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