Quatro anos à direita e um líder

Começando na construção autárquica, invertendo a tendência atual, aproveitando o desgaste natural do executivo com o tempo, o centro-direita deverá reunir-se e agregar-se na ambição de ser de novo Governo para fazer as reformas que Portugal precisa e que têm sido sistematicamente adiadas. Está demasiado fragilizado para o conseguir sem ser coligado, sejamos realistas.

Os próximos quatro anos serão particularmente desafiantes para o centro-direita que, além de enfraquecido em número, está fragmentado em diferentes representações parlamentares. Num cenário destes será fácil cair na tentação da competição pela espuma dos dias e pela visibilidade junto do eleitorado, que numa visão de curto alcance até pode satisfazer pelo espaço conquistado no imediato, mas que a médio prazo pode facilmente hipotecar um posicionamento estrutural e a fidelização de certos grupos da população. Perante a fragilidade em que o centro-direita se encontra, impõe-se uma atitude especialmente séria e sóbria, atenta a tendências mais do que a faits divers, que em tempos de redes sociais são sempre fáceis de plantar.

Paulo Portas tinha o instinto capaz de antecipar movimentações no mundo e à esquerda. Um faro político que se ganha com a experiência e que é especialmente importante para marcar agenda própria na contemporaneidade dos dias. Junto com um trabalho maturado e aturado de escrutínio, que permita ir ao fundo dos temas por oposição ao trabalho pela rama, é muito do que é necessário em política. Algo que, por exemplo, João Almeida fez, e bem, na comissão de inquérito à CGD. Num tempo em que o jornalismo de investigação rareia, não pode faltar a política de fundo, já que no âmago das questões se encontram tantas vezes os trunfos da oposição.

Em Democracia, o pior que podemos conceber é uma oposição frágil, pobre em conteúdos ou desnorteada nos seus propósitos. Ninguém quer uma oposição fraca, seja de direita, seja de esquerda. Todos sabemos no pântano socialista em que o país se torna sempre que a direita está fraca, como de resto também nos lembramos dos defeitos da monocultura cavaquista quando a oposição à esquerda (e também à direita) fraquejou.

De resto, Montesquieu, ainda que se referisse a outras dimensões, ajuda a compreender a ideia: “Todo o homem que tem o poder é tentando a abusar dele (…). É preciso que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder.” Uma fraca oposição nunca é desejável e a sua força resulta das características antes referidas mas ainda de um outro aspecto: a politica enquanto arte da negociação e do diálogo. Tanto a vontade política quanto as habilidades de negociação são decisivas e igualmente relevantes para um determinado resultado.

Num período de fragilidade, a concertação de esforços e forças, o permanente diálogo, a coesão na diversidade, são fundamentais e têm de estar presentes nas forças ao centro e à direita, se quiserem ser alternativa ao socialismo. Quem preferir excluir ou olhar a silos ideológicos não será capaz de dialogar devidamente, estabelecer pontes ou ganhar amplitude eleitoral. O CDS deve olhar para o seu futuro também nesta dimensão. Pela frente terá um exigente período de negociação com um objetivo simples: voltar a ser Governo.

O maior erro do centro-direita foi achar que a “geringonça” cairia à primeira rabanada de vento. Ou que o Diabo estaria à espreita. Com esta interpretação esqueceu que tradicionalmente os ciclos políticos em Portugal são de dois mandatos. O que, infelizmente, tem coincidido com a vinda de crises que, curiosamente, surgem sempre na sequência de governações socialistas. Ora, chegados a esta fase, o Partido Socialista entra no seu segundo mandato. Com uma eventual saída de Centeno e um refrear da atividade económica, toda a dinâmica política em Portugal poderá mudar.

A pressão do eleitorado do centro e da direita estará especialmente focada na assunção de responsabilidades e na construção de entendimentos e não tanto em impulsos descomprometidos ou fogachos populistas. Caso contrário, o Partido Socialista perpetuar-se-á nos comandos do país.

Sem “geringonça” formal e com um caleidoscópio parlamentar, com quatro partidos além dos tradicionais, serão muitos os ângulos e momentos para concertação.

Serão exigidos acordos à direita, seja em sede de Orçamentos, seja em sede de comissões eventuais, seja em conferência de líderes. O faro político amadurecido e experimentado é de enorme mais valia na condução de um partido nestas situações, tanto quanto fundamental é a experiência e espírito negocial.

2021 traz Presidenciais em janeiro, a presidência portuguesa da União Europeia que pode levar a uma remodelação no executivo, seguida de umas autárquicas em Outubro desse ano. É, pois, um ano chave, que pode inverter tendências e por isso se torna particularmente desafiante para o centro-direita e o CDS em particular, que o deve preparar encetando desde já diálogos nacionais e locais para afirmar coligações fundamentais a um mapa alternativo ao socialismo.

O CDS preside hoje a seis câmaras e está em coligação em duas dezenas. São peças fundamentais ao tecido autárquico de direita que obrigam a uma visão de verdadeira cooperação e diálogo para que possam crescer nessas eleições. O próprio PSD também sabe dessa necessidade e de quão fundamental é o CDS na equação se quiser que o centro-direita volte a ser quem tem mais câmaras e juntas de freguesia e quiser reconquistar, inclusive, a Associação Nacional de Municípios Portugueses. Em tudo o diálogo e a concertação é chave.

Começando na construção autárquica, invertendo a tendência atual, aproveitando o desgaste natural do executivo com o tempo, o centro-direita deverá reunir-se e agregar-se na ambição de ser de novo Governo para fazer as reformas que Portugal precisa e que têm sido sistematicamente adiadas. Está demasiado fragilizado para o conseguir sem ser coligado, sejamos realistas.

O CDS tem o seu Congresso no próximo fim de semana onde tudo isto estará em jogo. Todas as capacidades antes referidas serão exigidas ao novo líder.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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