Gozar a licença de paternidade é um caminho para chegar ao poder no Japão?

Nunca um governante japonês se atreveu a gozar o direito de ficar em casa quando foi pai. Shinjiro Koizumi, de quem se fala como futuro primeiro-ministro, faz um gesto simbólico – a pensar na mudança de mentalidades.

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Shinjiro Koizumi foi incluido pelo "Times" na sua lista de 20 pessoas a observar em 2020 Issei Kato/REUTERS

Nunca um ministro japonês aproveitou o direito que todos os homens do seu país têm de gozar da licença de paternidade. Shinjiro Koizumi, de 38 anos, ministro do Ambiente e estrela em ascensão no firmamento político nipónico, herdeiro de uma dinastia política e apontado por muitos como futuro primeiro-ministro, fez uma pequena revolução ao anunciar que pretende ficar em cada 15 dias quando nascer o seu primeiro filho.

Não vai ser nada radical: não devem ser 15 dias seguidos, e o ministro do Ambiente vai fazer teletrabalho. Ainda assim, Shinjiro Koizumi vai entrar nos 6% de pais japoneses que conseguem gozar da licença de paternidade, segundo estatísticas citadas pelo Le Monde, apesar de ser um direito garantido por lei tanto a mulheres como homens (até um ano de licença).

O problema é que ausentar-se do trabalho é muito mal visto em termos profissionais, por isso espera-se que o anúncio do ministro ajude a mudar mentalidades. Mesmo para as mulheres, ter um filho tem grande probabilidade de significar o fim da vida profissional. “As mulheres são muitas vezes obrigadas a renunciar à carreira para se ocuparem da família”, explicam Matthias Helble e Asami Takeda, do Banco Asiático de Desenvolvimento, numa análise publicada em Dezembro no jornal Japan Times.

Estes constrangimentos ajudam a explicar porque é que a taxa de natalidade japonesa não inverte a tendência de mergulho a pique: em 2018, nasceram apenas 864 mil bebés, o número mais baixo de sempre, diz ainda o diário francês. Isto apesar de o Governo do primeiro-ministro conservador Shinzo Abe promover uma política de promoção da natalidade, com abertura de creches, e ao mesmo tempo de aposta na entrada (e manutenção) de mais mulheres no mercado de trabalho, mesmo depois de terem tido filhos.

Shinjiro Koizumi, que em declarações à BBC um analista japonês, Atsuo Ito, comparou a “um surfista que tem muito bom aspecto na praia mas nunca tenta ir com a prancha para as ondas”, está a surfar esta onda da necessidade de modernização de comportamentos no Japão.

O ministro é o segundo filho, e herdeiro político, de Junichiro Koizumi, que foi primeiro-ministro do Partido Liberal Democrata (no poder actualmente) entre 2001 e 2006. De melena ondulada e rebelde e temperamento a condizer, Junichiro ​Koizumi foi um governante popular, nacionalista mas modernizador da economia, a quem chamavam o “Richard Gere japonês". Após o tsunami que esteve na origem do acidente nuclear da central de Fukushima, manifestou-se contra a energia nuclear no Japão.

Não é a primeira vez que Shinjiro Koizumi dá sinais de querer abanar as estruturas sociais da família no Japão – já postas em causa pelos jovens que não querem casar nem ter filhos. Numa entrevista ao Financial Times em Fevereiro de 2019, confessou ter ficado satisfeito por descobrir, numa visita à Nova Zelândia, que ali havia quatro formas de casamento: o matrimónio tradicional, parcerias, uniões civis e casamentos entre pessoas do mesmo sexo. “Pode-se escolher. No Japão há basicamente uma única forma de casamento”.

Já em 2020, o Times do Reino Unido colocou o ministro do Ambiente japonês na sua lista de 20 pessoas a observar este ano. O diário britânico frisou que há duas opiniões sobre Koizumi: ou é um herdeiro da aristocracia política (quarta geração) com uma cara bonita mas sem ideias originais, ou então é o político japonês mais interessante e prometedor da sua geração, relata o Japan Times

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