Vitória de Setúbal é um “poleiro” mais desejado do que nunca

Nas eleições desta sexta-feira, os sócios vitorianos poderão escolher entre cinco listas. O Vitória é um clube tradicionalmente problemático, mas agora também surpreendentemente desejado.

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O V. Setúbal vai a votos na sexta-feira Mário Cruz/Lusa

Um dos clubes portugueses com mais problemas internos neste milénio. Um local tradicionalmente pouco apetecível para governar. Um dos emblemas com mais casos conhecidos de incumprimento financeiro, quer com entidades diversas, quer com atletas e trabalhadores. Este é o Vitória de Setúbal. Mas é, também, o clube que, neste momento, seduz cinco candidatos à presidência do histórico sadino.

Cinco listas é um recorde absoluto nos 109 anos do clube e supera largamente o cenário dos últimos actos eleitorais. Nesta sexta-feira, este emblema centenário vai eleger a direcção para o período 2020-2023. Ou talvez não…

É que o Vitória tem sido, neste milénio, um autêntico “cemitério de presidentes”. Desde 2000, o clube teve, precisamente, 11 mandatos. Desses 11, cinco não se completaram e três foram em comissões de gestão. Noutras palavras: em 20 anos, apenas três direcções – Jorge Goes (99-01), Chumbita Nunes (03-06), e Fernando Oliveira (09-12) – completaram o mandato para que foram eleitas.

Estes dados atestam a instabilidade directiva permanente do Vitória, como causa ou efeito – ou ambas – da instabilidade desportiva de uma equipa de futebol raramente confortável nos campeonatos e de uma instabilidade financeira já crónica no Bonfim.

Sobrevivência desportiva e financeira

Desportivamente, o Vitória só falhou, neste milénio, duas edições da I Liga. E segue, até, numa sequência de 16 temporadas consecutivas no primeiro escalão. Esta é a forma de ver o copo meio-cheio.

O copo meio-vazio diz-nos, porém, que a permanência do Vitória na Liga portuguesa raramente tem sido feita com conforto, mas sim com alguma fortuna. Demasiada para uns exigentes adeptos vitorianos, que já se habituaram, mais do que gostariam, a sofrer época após época.

Nas últimas 15 temporadas, apenas em três a equipa de Setúbal terminou no top-10 da I Liga e longe de problemas – somou um sexto, um sétimo e um oitavo lugares. As restantes épocas, com salvação conseguida mais perto ou mais longe da última jornada, têm sido à tangente. E é esse um dos traços gerais de todas as listas que se candidatam: dar estabilidade desportiva.

Financeiramente, o Vitória enfrenta, há vários anos, problemas graves. São conhecidos os casos de incumprimento salarial com atletas e funcionários, ao longo das últimas duas décadas, bem como o amadorismo organizacional, evidenciado na recente investigação da PJ em torno da contagem de 300 mil euros em dinheiro vivo por parte de elementos da direcção do clube, alegadamente provenientes de empréstimos privados.

O clube tem vivido, também, sob o manto dos três Planos Especiais de Revitalização (PER) já colocados em marcha, o último dos quais em 2019. Com o PER – um mecanismo de protecção contra credores e de renegociação de dívidas, para entidades perto da insolvência –, o Vitória tem conseguido manter-se à tona. Mais do que viver, tem conseguido sobreviver.

Os candidatos

Estas eleições têm, como ponto central das listas, a tremenda diversidade: há um candidato actualmente em funções, dois que saíram do clube recentemente, um outro que traz “sangue novo” e um último que traz “sangue do passado”. Valências diferentes, com planos de acção distintos.

Da lista A chegam os ventos do passado. Chumbita Nunes foi presidente do clube entre 2003 e 2006 e, apesar de ter terminado o mandato, não liderou o clube num período de grande pujança, mas sim de muitos problemas. Para 2020, o ex-líder vitoriano, de 65 anos, fala de um conceito muito em voga na política portuguesa: as contas certas. “Os vitorianos merecem transparência, honestidade, contas certas e grandes vitórias”, apontou.

Na lista B há Pedro Gaiveo Luzio, de 54 anos, que chegou a fazer parte da actual direcção – foi um dos membros que se demitiu em 2019. Prometendo investidores locais para solidificarem a situação financeira do Vitória, a lista B considera que “a situação financeira é prioritária, porque sem dinheiro nada se faz”.

A lista C, com José Dias Mendes, pretende trazer “sangue novo”. Aos 50 anos, o pós-graduado em Organização e Gestão de Futebol Profissional pretende mudar as pessoas. “Se o clube quer mudar, tem de começar por mudar as pessoas. Se estiverem sempre os mesmos, que seguem uma determinada linha de gestão, não vai haver mudança”, apresentou-se.

A lista D traz outro nome já conhecido no clube. Paulo Gomes, de 50 anos, é ex-membro da anterior direcção e candidata-se porque não foi capaz de abandonar de vez o clube para o qual quis trabalhar. “[Depois da demissão] tínhamos duas alternativas: ou íamos para casa descansar ou estaríamos aqui hoje. Achámos que o Vitória estava em primeiro e, por isso, estamos aqui para entrar numa nova luta”, justificou.

Por fim, a lista E é liderada por Vítor Hugo Valente, o actual presidente do clube, que só apresentou a lista a poucos minutos da hora-limite. Mas houve um motivo. “Não é inocente o facto de querermos ser a quinta lista. Deste modo, somos lista ‘E’, de estabilidade, que é o traço e a marca daquilo que o Vitória tem e foi prometido aos sócios quando fomos eleitos há dois anos”, justificou.

É sob estas premissas que, nesta sexta-feira, cinco nomes e cinco listas estarão à mercê da cruz dos eleitores vitorianos. Eles que não têm tido vida fácil como sócios do histórico setubalense - um clube que tem trazido mais sofrimento do que alegria.

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