Investigação liderada por português conclui que o combate “não resolve problema” dos incêndios

Trabalho defende que os investimentos sejam equilibrados entre o combate e a prevenção.

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Mação, Portugal, Julho de 2019 Daniel Rocha

Investigadores de regiões com clima mediterrânico, incluindo de Portugal, concluíram que os investimentos feitos no combate aos incêndios florestais “não resolvem o problema” e vão originar, a curto prazo, fogos “tão intensos” e impossíveis de enfrentar.

Estas conclusões constam de uma análise às actuais políticas de gestão de incêndios nas regiões com clima mediterrânico feita por 22 cientistas, quatro dos quais portugueses, e liderada pelo investigador do Instituto Superior de Agronomia (ISA) de Lisboa Francisco Moreira.

No trabalhado, publicado esta terça-feira na revista Environmental Research Letters, os investigadores consideram que o destaque dado ao combate dos incêndios florestais nestas regiões está destinado “a falhar os seus objectivos” e recomendam que os investimentos em recursos humanos e financeiros sejam equilibrados entre o combate e prevenção.

Os investigadores defendem que o combate “não resolve o problema”, uma vez que, “apesar dos esforços crescentes de combate aos incêndios, a extensão da área ardida em cada ano continua a depender, em grande parte, das condições meteorológicas”.

“Devido ao aquecimento global, bem como às alterações nas paisagens causadas por diferentes factores que levam ao aumento da quantidade de vegetação inflamável nestas regiões, é de esperar que incêndios de grande extensão e severidade se tornem mais comuns”, refere a análise para justificar tal recomendação.

O trabalho liderado pelo investigador português concluiu também que há o surgimento de “um efeito perverso causado pelo investimento desproporcionadamente grande na supressão do fogo”.

Segundo o mesmo trabalho, as políticas existentes nas regiões mediterrânicas levaram à designada “armadilha do combate”, que resulta de o investimento estar muito focado na extinção do fogo e negligenciar a gestão da vegetação combustível, “o que só adia a ocorrência de grandes incêndios”.

“Com estas políticas, a vegetação vai-se acumulando no território e tornará ineficaz o combate quando ocorrerem incêndios em dias de grande calor, secura e ventos fortes”, sublinham os autores do artigo, frisando que “o aparente sucesso do combate no curto prazo vai originar, a médio prazo, incêndios tão intensos que são impossíveis de combater por mais bombeiros, autotanques e aviões que se mobilizem”.

Os investigadores consideram também que o sucesso de uma política de incêndios não deve ser medido principalmente pela extensão da área ardida num fogo ou ano, mas sim pela magnitude dos impactos socioeconómicos causados pelo fogo.

“Tal mudança de paradigma não obriga a uma diminuição dos esforços de combate, mas coloca ênfase crescente na gestão da vegetação e na preparação das populações. Isto virá a permitir a redução do esforço de combate à medida que o território, as pessoas e os bens forem ficando menos vulneráveis ao fogo”, salienta a análise.

O estudo conclui ainda que “é essencial resistir à tentação política de responder a cada novo episódio de incêndios catastróficos com investimentos cada vez maiores no combate”.

Além de Francisco Moreira, que liderou o projecto sobre a análise das actuais políticas de gestão de incêndios nas regiões com clima dito “mediterrâneo” (bacia Mediterrânica, Chile, África do Sul, Califórnia e Austrália Ocidental) foram ainda co-autores da investigação os portugueses Filipe Catry (ISA), José Miguel Cardoso Pereira (ISA) e Paulo Fernandes (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro).

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