John Bolton disponível para testemunhar no julgamento de Trump no Senado

Antigo conselheiro de Segurança Nacional opôs-se à campanha de pressão sobre a Ucrânia mas foi impedido pelo Presidente norte-americano de testemunhar na primeira fase do impeachment. Agora, admite falar sob juramento se for intimado pelo Senado.

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John Bolton, à esquerda na imagem, quando ainda era o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca Reuters/LEAH MILLIS

John Bolton, o antigo conselheiro de Segurança Nacional norte-americano que saiu da Casa Branca em Setembro, anunciou que está disponível para testemunhar no julgamento do Presidente Donald Trump no Senado. A decisão, conhecida no dia em que Trump exigiu o fim do processo de impeachment, é surpreendente e pode levar alguns senadores do Partido Republicano a aceitarem chamar testemunhas próximas do Presidente dos Estados Unidos.

“Concluí que estou preparado para testemunhar se o Senado apresentar uma intimação para o meu testemunho”, disse Bolton num comunicado publicado no seu site.

Bolton é um dos antigos e actuais responsáveis da Casa Branca que foram proibidos pelo Presidente Trump de prestar depoimento, sob juramento, na fase de investigação do processo de impugnação, que decorreu entre Setembro e Dezembro na Câmara dos Representantes.

Por causa dessa proibição, nenhuma das testemunhas chamadas pelo Partido Democrata até agora teve conhecimento directo dos pormenores da pressão da Casa Branca sobre o Presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, para que a Justiça ucraniana investigasse o Partido Democrata e Joe Biden, um dos possíveis adversários de Trump nas eleições presidenciais de Novembro nos Estados Unidos.

Alguns dos responsáveis que tiveram conhecimento directo, como Bolton e o seu adjunto no Conselho de Segurança Nacional, Charles Kupperman, recorreram aos tribunais para saberem o que fazer: ou cumprir a ordem da Casa Branca para não testemunhar, ou cumprir a ordem do Congresso para testemunhar.

No comunicado publicado esta segunda-feira, Bolton disse que esperou pela decisão judicial no processo do seu antigo adjunto, que chegou no dia 30 de Dezembro.

Nesse caso, o juiz Richard Leon decidiu que a questão tinha perdido validade porque a Câmara dos Representantes retirara, entretanto, a intimação a Kupperman. Na sua decisão, o juiz escreveu que, “felizmente”, não teve de tomar uma posição sobre o equilíbrio de poderes entre a Casa Branca e o Congresso.

Depois de uma primeira fase em que intimou várias figuras próximas do Presidente, o Partido Democrata retirou essas intimações e decidiu avançar com o processo sem esperar por decisões dos tribunais. E, à falta dessas decisões, John Bolton disponibilizou-se agora para ser ouvido, se for intimado pelo Senado.

Furar a união republicana

Esta decisão é importante porque foi através dos depoimentos sob juramento de adjuntos e conselheiros do Conselho de Segurança Nacional norte-americano que se soube, por exemplo, da oposição de John Bolton à pressão sobre a Ucrânia. A sua ida ao julgamento no Senado, como testemunha, poderia confirmar essas e outras informações, com novos pormenores, e prejudicar a defesa do Presidente Trump.

Em Dezembro, a Câmara dos Representantes aprovou, com os votos da maioria do Partido Democrata, dois artigos de impeachment contra Trump – um de abuso de poder e outro de obstrução do Congresso.

Nenhum congressista do Partido Republicano votou ao lado dos democratas, e até agora não há indicações de que essa união pode vir a ser posta em causa no que falta para a conclusão do processo – o julgamento, no Senado, onde o Partido Republicano está em maioria com 53 senadores, e onde são necessários 67 votos para condenar o Presidente.

A única hipótese que o Partido Democrata tem para furar a união republicana, e ter alguns senadores do outro lado dispostos a votarem a favor da destituição, é lutar para que testemunhas como John Bolton sejam intimadas a depor no julgamento. Para isso, a líder da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, reteve os artigos de impeachment, o que não permite que o Senado marque o julgamento. Com esta medida, Pelosi e o Partido Democrata querem forçar o Partido Republicano a aceitar convocar testemunhas; enquanto isso não acontecer, o processo fica parado e vai continuar a afectar o Presidente Trump num ano de eleições importantes.

Se os republicanos cederem, os responsáveis mais próximos de Trump, como Bolton ou o chefe de gabinete da Casa Branca, Mick Mulvaney, e o secretário de Estado, Mike Pompeo, podem ser intimados e virem a fazer revelações prejudiciais para o Presidente norte-americano – um risco que Trump não correu durante as audições na Câmara dos Representantes porque todos eles foram proibidos de testemunhar.

Algumas regras para a condução do julgamento, como a decisão sobre se é preciso chamar testemunhas, podem ser aprovadas por uma maioria simples de 51 senadores.

E se é verdade que a esmagadora maioria dos republicanos está de pedra e cal ao lado de Trump, também é verdade que alguns dos senadores, como Lisa Murkowski e Mitt Romney, podem ver na disponibilidade de John Bolton para testemunhar o incentivo de que precisam para justificar um voto a favor da convocação de testemunhas – e, assim, provar aos seus eleitores que estão a levar o processo a sério, dando todas as oportunidades à acusação para apresentar os seus argumentos.

É pouco provável que a disponibilidade de Bolton para testemunhar leve o líder do Partido Republicano no Senado, Mitch McConnell, a mudar a sua posição e a aceitar chamar testemunhas. Mas é uma decisão surpreendente, e pode pôr em movimento a sucessão de acontecimentos desejada pelo Partido Democrata: primeiro, convencer alguns senadores republicanos a aprovarem a convocação de testemunhas; depois, que algumas dessas testemunhas prejudiquem, sob juramento, o Presidente Trump; e, finalmente, que mais republicanos se vejam forçados pela opinião pública a votarem a favor da destituição de Trump com base em novas revelações.

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