Arshak Makichyan, o activista russo que já foi preso por se manifestar pelo clima

Descobriu tarde que o planeta estava a aquecer — o que não foi impedimento para, sozinho, se manifestar pelo clima. Arshak Makichyan desafia, todas as sextas-feiras, as leis russas que o impedem de protestar. Foi detido durante seis dias, mas já está em liberdade. E vai continuar.

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Arshak Makichyan sempre se interessou pelo ambiente, mas só em 2018 tomou consciência que existia um problema chamado “aquecimento global”. Descobriu o tema e, entre pesquisas, descobriu que uma jovem sueca faltava às aulas todas as sextas-feiras para protestar contra a inacção do Governo em relação às alterações climáticas — era Greta Thunberg.

A ideia de fazer greve não lhe passava ainda pela cabeça — “na Rússia não temos uma cultura de protesto”. Só mais tarde, em Fevereiro de 2019, tomou o gosto pela manifestação: “Participei num protesto pela primeira vez, uma marcha em homenagem a Boris Nemtsov, antigo ministro e deputado russo, que foi assassinado em 2015”, contou o activista de 25 anos à Unesco. Percebeu então que era “um adulto capaz de fazer algo semelhante sozinho” — e quando, a 15 de Março, foi feita a convocatória para a Greve Mundial pelo Clima, não hesitou em participar. O que não sabia, na altura, era que a participação neste movimento viria a significar uma detenção de seis dias e o desencadear de um movimento de solidariedade à escala global.

A experiência não foi a melhor: “A manifestação aconteceu no Parque de Sokolniki designado pelas autoridades como uma zona de liberdade de expressão e manifestação”, conta, citado no mesmo texto. O espaço, além de ser vedado, não é muito frequentado — e os cerca de 70 grevistas acabaram por passar despercebidos.

A manifestação falhada acabou por dar motivação reforçada a Arshak, que suspendeu os estudos de música na Alemanha para continuar a lutar pelo clima. “Uma vez que os protestos individuais são permitidos na Rússia, decidi começar a protestar sozinho todas as sextas-feiras, à semelhança de Greta e cumprindo o movimento Fridays For Future”, aponta. Desta vez, o activista não fez por menos: escolheu a Praça de Pushkin, “por estar sempre cheia de gente”.

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 “As pessoas na Rússia não entendem o que é o aquecimento global. Muitas pensam que a temperatura vai ficar mais amena, que os invernos vão ser menos severos. E não têm onde procurar informação”, lamenta. O jovem critica a falta de “políticos que falem sobre catástrofes ambientais e crise climática” e a “comunicação social que não aborda esses assuntos” — ou “porque acreditam que o público não está interessado no tema” ou porque “têm medo de ofender as empresas de gás e petróleo”. O resultado é “a falta de acção para implementar o Acordo de Paris” e “um silêncio que não é assim tão diferente do silêncio em relação ao desastre de Tchernobil”.

Em Maio último, começou um movimento na Internet, com o intuito de conseguir que crianças e jovens menores de 18 anos pudessem manifestar-se livremente — algo que não é permitido na Rússia. Fotografias de cartazes onde se lia “Let Russia Strike for Climate” (em português, “deixem a Rússia fazer greve pelo clima”) começaram correr a Internet. E chegaram até Greta Thunberg, a primeira inspiração de Arshak, que também manifestou o descontentamento em relação à situação vivida na Rússia. 

O movimento não teve repercussões práticas. Quando Arshak tentou, juntamente com um colectivo de estudantes, organizar um protesto de 500 pessoas no centro da cidade, foi-lhes dito que o local não tinha capacidade para tantas pessoas — “mas, pelo que sabíamos, o parque tinha capacidade para 850 pessoas.” Depois de mais algumas tentativas, a autorização acabou por não ser concedida e um grupo de dez manifestantes fez greve “à vez” em frente à estátua de Pushkin — primeiro Arshak sozinho, depois alguns membros do colectivo de estudantes.

O activista já tinha explicado ao The Guardian, pouco antes da greve de Setembro último, que os protestos em Moscovo eram muitas vezes feitos assim: “Protestamos à vez. Uma pessoa segura um cartaz durante cinco minutos e passa a outro que está à espera nas redondezas, Assim, trata-se de uma série de protestos individuais e não de uma manifestação em grupo.”

E foi assim mesmo que protestou — sozinho — durante mais de 40 semanas, até ser detido durante seis dias por manifestar-se pelo clima sem autorização. A sentença chegou no dia 20 de Dezembro — poucos dias depois de ter voltado da COP 25, que aconteceu em Madrid e juntou activistas e líderes políticos de todo o mundo — e rapidamente desencadeou uma onda de solidariedade por todo o mundo, com apoiantes de Arshak a partilharem mensagens de apoio nas redes sociais — “aguenta, estás no bom caminho”, lê-se no Twitter do Fridays4Future. Acabou por ser libertado a 26 de Dezembro. Mesmo a tempo de mais uma greve à sexta-feira.

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