Uma década “mortífera” para as crianças: 45 violações graves por dia

A Unicef faz balanço negro da década. Os ataques contra crianças aumentaram quase três vezes desde 2010.

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2015: uma criança refugiada aguarda para ser registada no campo de Presevo REUTERS/Matic Zorman

A década que agora termina foi “mortífera” para as crianças que vivem nas várias zonas de conflito no mundo, denunciou esta segunda-feira a Unicef, revelando que, desde 2010, foram registadas mais de 170.000 violações graves dos direitos das crianças.

Em plena contagem decrescente para o fim de 2019, o Fundo das Nações Unidas para a Infância alerta que as crianças continuam a pagar um “preço mortal” pelos conflitos armados e que o ano que está prestes a acabar conclui uma “década mortífera” que testemunhou “uma média de 45 violações graves por dia contra crianças”.

Segundo os dados da Unicef, os ataques contra crianças aumentaram quase três vezes desde 2010.

A agência da ONU identifica como violações graves seis situações específicas:

  • assassínio e mutilação de crianças;
  • recrutamento e utilização de crianças por forças e grupos armados;
  • violência sexual contra crianças;
  • ataques contra escolas ou hospitais;
  • rapto de crianças;
  • e negação do acesso humanitário às crianças.

Conflitos mais longos e sangrentos

Num comunicado divulgado esta segunda-feira a partir de Nova Iorque, a organização frisa que, desde a adopção da Convenção sobre os Direitos da Criança (em 1989), nunca houve tantos países em conflito, com dezenas de focos armados violentos que matam, mutilam e forçam as crianças a abandonarem as respectivas casas.

“Em todo o mundo, os conflitos estão a durar mais tempo, causando mais derramamento de sangue e ceifando mais vidas de crianças”, afirma a directora-executiva da Unicef, Henrietta Forre.

“Os ataques contra crianças continuam sem abrandar, enquanto as partes em conflito desrespeitam uma das mais básicas regras em cenário de guerra: a protecção das crianças. Por cada acto de violência contra crianças que chegam aos jornais e geram ondas de indignação, há muitos mais que não são reportados”, frisa a representante.

Já em 2018, a Unicef tinha denunciado a situação de fragilidade em que viviam milhões de menores afectados por conflitos em todo o mundo. Na altura, a organização criticou os líderes mundiais por não serem capazes de evitar os actos de violência cometidos contra essas crianças e de falharem na responsabilização dos autores de tais agressões.

De acordo com a Unicef, em 2018, foram registadas mais de 24 mil violações graves contra crianças, o que já representava então “um número duas vezes e meio superior ao registado em 2010”.

Ainda em relação a 2018, os dados recolhidos apontam para mais de 12 mil crianças mortas ou mutiladas.

“O uso continuado e generalizado de ataques aéreos e de armas explosivas (como minas terrestres, morteiros, dispositivos explosivos improvisados, ataques com mísseis, armas de fragmentação e artilharia) é a principal causa de vítimas infantis em conflitos armados”, indica a organização.

Segundo afirmou esta segunda-feira a Unicef, este cenário não se alterou em 2019. Só durante os primeiros seis meses do ano, foram contabilizadas mais de 10 mil violações contra crianças.

A agência da ONU admite, no entanto, que os números reais devem ser “provavelmente muito maiores”.

Múltiplos casos

Da Síria ao Iémen, passando também pelo Iraque, Afeganistão, Burkina Faso ou pelo leste da Ucrânia, a Unicef relata várias situações que ao longo dos 12 meses de 2019 afectaram violentamente as crianças e que fizeram vítimas entre os mais jovens.

“Num único fim-de-semana em Agosto, 44 civis foram mortos devido a ataques aéreos no noroeste da Síria, incluindo 16 crianças e 12 mulheres”, recorda a agência da ONU, lembrando ainda que, no início do mês de Dezembro, “cinco crianças foram mortas quando homens armados abriram fogo no interior de um local de culto no Burkina Faso”.

Perante tal panorama, a agência da ONU pede a todas as facções envolvidas nos conflitos para que “cumpram as respectivas obrigações ao abrigo do Direito Internacional” e “coloquem um fim imediato às violações contra crianças e aos ataques contra infra-estruturas civis, incluindo escolas, hospitais ou infra-estruturas hídricas”.

“A Unicef apela também aos Estados com influência sobre as partes em conflito que utilizem essa ascendência para protegerem as crianças”, conclui o comunicado da organização internacional.

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