Um fotógrafo à procura de outros natais, no Bairro de Santiago

Mais de duas dezenas de moradores deste bairro de Aveiro abriram as portas das suas casas ao fotojornalista Adriano Miranda, no âmbito de um projecto que resulta das sementes deixadas pelo laboratório cívico.

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Maria Carminda Ferreira trouxe os netos para a fotografia

Com agregados familiares maiores ou menores, mais ou menos recursos financeiros, há algo que as famílias Ferreira, Franco, Agra e Aguiar, partilham entre si. Habitam no bairro de Santiago, em Aveiro, e abriram as portas das suas casas para se deixarem fotografar tal como são, dentro dos seus lares. Tendo como mote o Natal, o fotojornalista do PÚBLICO Adriano Miranda, em parceria com a instituição Florinhas do Vouga, decidiu retratar a comunidade que habita no maior bairro social de Aveiro. O resultado desse projecto está exposto nas montras de diversos espaços e serviços da zona (Florinhas do Vouga, Associação Mon na Mon, Talho Biobom e Café Cantinho de Santiago), até ao dia 6 de Janeiro. O objectivo passa por levar, no próximo ano, essas imagens – mas em maiores dimensões - para uma galeria da cidade.

“Estamos a projectar levar esta exposição para além das fronteiras do bairro, aproveitando a comemoração dos 80 anos das Florinhas do Vouga”, anuncia Carolina Santos, técnica da instituição particular de solidariedade social que tem várias valências em Santiago. A ideia merece todo o apoio da parte das famílias fotografadas, que já deram nota positiva às imagens expostas nos estabelecimentos do bairro. “A fotografia ficou muito bonita”, avalia Idalina Franco, moradora no bairro há 19 anos, retratada na companhia da sua “velhinha de 98 anos” [a mãe] e de um dos seus dois filhos. Também Maria Carminda gostou de ver a sua fotografia com quatro dos seus cinco netos, em exposição no bairro. “Como a sala está cheia de coisas da minha filha, que está sem casa, tivemos de tirar a fotografia no quarto. Mas ficou bem”, testemunha esta moradora, a viver no bairro há cerca de 30 anos. No fundo, foi das primeiras a chegar – a edificação daquele que é o maior bairro social da cidade teve início em 1983. Hoje, vive na companhia de três dos cinco netos e dos “cães e gatos” da casa. “Qualquer dia tenho de os juntar todos para tirar uma foto”, brinca.

Famíla Agra,Famíla Agra Adriano Miranda/Público
Famíla Osório Adriano Miranda/Público
Famíla Pereira Adriano Miranda/Público
Famíla Dias Adriano Miranda/Público
Famíla Sereno Adriano Miranda/Público
Famíla Ventura Adriano Miranda/Público
Famíla Gomes Adriano Miranda/Público
Família Pinto Adriano Miranda/Público
Famíla Melo Adriano Miranda/Público
Famíla Silva Adriano Miranda/Público
Famíla Gonçalves Adriano Miranda/Público
Famíla Franco Adriano Miranda/Público
Famíla Jesus Adriano Miranda/Público
Família Naia Adriano Miranda/Público
Famíla Rodrigues Adriano Miranda/Público
Famíla Peixinho Adriano Miranda/Público
Famíla Silva Adriano Miranda/Público
Famíla Ventura Adriano Miranda/Público
Família Aguiar Adriano Miranda/Público
Famíla Silva Adriano Miranda/Público
Famíla Oliveira Adriano Miranda/Público
Família Oliveira Adriano Miranda/Público
Famíla Bento Adriano Miranda/Público
Famíla Ferreira Adriano Miranda/Público
Fotogaleria
Famíla Agra,Famíla Agra Adriano Miranda/Público

Às famílias de Idalina Franco e de Maria Carminda juntam-se outras 22 famílias do bairro. “O nosso objectivo era ter 25 famílias, assinalando o dia de Natal, mas acabámos por só conseguir ter 24”, número que não deixa de coincidir com a festa, enquadra Adriano Miranda. A ligação do fotojornalista aveirense ao bairro de Santiago teve início no primeiro semestre do ano, a propósito do laboratório cívico que ali foi desenvolvido – um projecto experimental que colocou a própria comunidade a pensar e a implementar iniciativas para melhorar o bem-estar dos moradores (ver caixa).

Adriano Miranda foi responsável por um dos dez projectos dinamizados, o “Fotojornalismo na redacção Santiago”, experiência que o levou a constatar que o bairro “quase que caracteriza o país”. “Tem gente pobre, tem pessoas da classe média, do desempregado ao estudante de doutoramento. Há famílias com muitos filhos; outras com poucos”, assinala. Com este novo projecto entrou-lhes pela casa adentro, apercebendo-se que “quase todas as famílias têm cães e gatos e fizeram questão de tirar as fotografias com eles”. Também reparou em pormenores de decoração, nomeadamente no que toca à forte presença de “fotografias de família” ou de emblemas de clubes de futebol – “o Benfica impera” -, mas foi a simpatia que mais o marcou. “Foram todos muito simpáticos e deixaram-se fotografar sem problemas”, afiança.

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A Família Franco Adriano Miranda

Um cenário real, sem produções

Nem toda a gente estará disposta a abrir assim as portas da sua casa, a deixar-se fotografar na realidade em que vive e sem produções – o objectivo passou sempre por aí: fotografar as famílias tal como elas vivem. “É pena que não se abram mais portas, mas isto não pode ser forçado ou imposto”, refere Vasco Aguiar, outro dos moradores abrangidos pelo projecto. Foi fotografado na companhia da mulher, dos dois filhos e de um dos gatos da casa. “Temos dois, mas um é mais instável e não tem paciência para a fotografia”, explica. Mora em Santiago há 19 anos e não poupa esforços na hora de defender o bairro. Agrada-lhe viver em Santiago, mas sente que ainda há algum trabalho a fazer ao nível da reputação do bairro. “E tem de começar por quem aqui vive”, sugere, sem deixar de notar que projectos como o “Famílias de Santiago” estão a dar uma valiosa ajuda.

Fica também a esperança que as entidades competentes, nomeadamente a autarquia, não se lembrem de Santiago “apenas na altura da campanha eleitoral”, vinca Vasco Aguiar. A pretexto desta época festiva, pega no exemplo da iluminação de Natal. “Tanta lâmpada e tanta luz a poucos metros daqui e no bairro nem uma luzinha”, repara. Na cidade que alberga aquela que é anunciada como a maior árvore de Natal do país, “não custava nada retirar umas luzes aqui e outras acolá, para colocar ” aqui, diz.

Maria João Agra corrobora o reparo de Vasco. É uma das mais recentes moradoras do bairro – só ali vive há sete meses -, mas isso não a impede de ser uma das mais acérrimas defensoras do lugar. Natural de Ílhavo, teve residência em Nariz e também em Aradas, no município de Aveiro, e em Abril mudou-se de armas e bagagens para Santiago. Deixou-se fotografar na companhia do marido e da cadela da família, a Lola, porque não gosta de fechar a porta a ninguém, em especial quando sente que “é uma coisa que pode ajudar” o bairro. “São as nossas casas, as nossas famílias, não temos que ter vergonha”, sublinha.                                                                         

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