Primeiro-ministro australiano obrigado a pedir desculpas por ir de férias com o país a arder

Scott Morrison foi para o Havai quando grandes incêndios lavram na costa oriental da Austrália. Os fogos já mataram pelo menos oito pessoas, consumiram três milhões de hectares e destruíram 700 casas.

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Scott Morrison pediu desculpa, mas depois acabou por dizer que não segura numa mangueira Reuters/DAVID GRAY

No decorrer de um mega-incêndio florestal e de uma onda de calor que os serviços meteorológicos australianos dizem que pode ter resultados catastróficos, o primeiro-ministro Scott Morrison foi de férias com a família para o Hawai, desencadeando uma vaga espectacular de críticas populares e da oposição. A avalanche de críticas foi tal que o conservador Morrison, céptico das alterações climáticas e defensor da exploração do carvão, se tenha visto obrigado a pedir desculpas e a interromper as férias.

Após a morte de mais dois voluntários que combatem as chamas que parecem intermináveis, Morrison anunciou o seu regresso ao país no sábado. Mas não sem cometer mais um passo falso político, ao sublinhar que não anda pessoalmente a apagar fogos. “Lamento profundamente qualquer ofensa causada a algum dos muitos australianos atingidos pelos terríveis incêndios florestais ao ir de férias com a minha família nesta altura”, disse o primeiro-ministro. E acrescentou: “Sei que os australianos vão percebê-lo e que vão ficar felizes por me ver regressar, mas também sabem que não seguro uma mangueira”. 

Morrison fez a viagem de férias em total secretismo e só depois de ter pedido desculpa revelou o local de férias. Argumentou que o secretismo se deveu a querer fazer “uma surpresa” às suas filhas, apesar de várias notícias terem relatado que o seu gabinete negou estar no Havai. As férias do primeiro-ministro estavam agendadas até segunda-feira.

Para tentar tranquilizar os seus compatriotas, Morrison disse que tem recebido “actualizações regulares sobre os incêndios florestas” e a situação das operações de busca e salvamento das vítimas. Mas a garantia soube a pouco. 

“Onde está o primeiro-ministro? Será que repararam que o país está a arder? Ouvimos rumores de que Scott Morrison está no Havai”, escreveu no Twitter David Shoebridge, deputado dos Verdes no parlamento de Nova Gales do Sul, estado onde os incêndios lavram. “Quando o país que se lidera está a arder, tem-se a obrigação de ficar por perto e resolver [a situação]. Ou pelo menos avançar com as políticas certas antes de se ir embora. Mas esta pessoa está simplesmente em negação... de férias”. 

O líder do principal partido da oposição, Anthony Albanese, do Partido Trabalhista, tem-se recusado a criticar a ida de férias de Morrison. No entanto, a sua bancada parlamentar não tem tido meias palavras contra o líder do executivo: acusam-no de negar o problema e de não tomar as necessárias acções para combater os incêndios. Os bombeiros, por sua vez, estão revoltados com Morrison num momento em que perderam dois camaradas. 

“Nenhum primeiro-ministro desde Harold Holt [1966-1967] julgou prudente deixar o país ou afastar-se quando acontece uma emergência”, escreveu o director adjunto do jornal Sydney Morning Herald, Tony Wright.

Os incêndios na Austrália são comuns, mas a onda de calor de força inédita, que se manterá até ao fim-de-semana criou as condições perfeitas para que os fogos se propagassem e tivessem uma força pouco habitual na costa oriental do país. Os incêndios já causaram a pelo menos oito pessoas, consumiram pelo menos três milhões de hectares já arderam e reduziram a cinzas 700 casas. E quem vive em Sydney, capital do estado de Nova Gales do Sul, viu-se a sufocar sob uma intensa nuvem de fumo, com as máscaras serem uma visão comum nas ruas. 

Scott Morrison tem sido criticado por falta de iniciativa para controlar os incêndios florestais - que são já classificados como mega-incêndios, devido às proporções que atingiram. Recusou no entanto críticas nacionais e internacionais à recusa australiana em reconhecer os efeitos das emissões de CO2 e das alterações climáticas nesta crise.

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