Ministério Público descarta responsabilidade do Estado em queda de arriba que matou cinco pessoas

As placas a indicar o perigo de derrocada, em Albufeira, só foram afixadas no local, depois do acidente que aconteceu há dez anos. “Negligência grosseira”, dizem os advogados.

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FFA Filipe Farinha/ STILLS - colaborador

O Ministério Público considera que a queda da arriba que há dez anos matou cinco pessoas na praia Maria Luísa, em Albufeira, resultou de um “fenómeno natural e imprevisível”, não havendo, por isso, culpados nem responsabilidade do Estado. “A situação foi dramática, mas não se pode confundir com as responsabilidades do Estado”, disse esta segunda-feira a procuradora na fase de alegações finais do processo, que decorreram nove meses depois de o julgamento começar. Os familiares das vítimas pedem ao Estado uma indemnização de 911 mil euros, pela “omissão de deveres” de zelar pela segurança e vigilância dos banhistas, que se encontravam à sombra do rochedo que ruiu. Os advogados dos assistentes consideram estar em causa “negligência grosseira”.

O antigo director regional da Administração Hidrográfica do Algarve (ARH), Sebastião Teixeira, ouvido, na qualidade de testemunha, admitiu que as placas de sinalização alertando para o perigo de derrocada da arriba só foram colocadas no local em 2013/2014, quatro anos depois do acidente. O advogado João Carlos Silva, foi mais longe, remeteu para um relatório oficial, datado de 12 de Maio de 2004, assinado por Sebastião Teixeira, no qual este responsável já defendia a necessidade de sinalização, com indicação de “faixas de risco” nesta praia.

Questionado pela juíza sobre o motivo pelo qual o trabalho não foi executado, respondeu: “Não me lembro”. A magistrada judicial observou: “Estamos a falar aqui de uma coisa que é a responsabilidade do Estado”. Do que não há dúvida, afirmou Sebastião Teixeira, “foi que o acidente obrigou a repensar as coisas [reforçar a sinalização]”.

O advogado Pedro Proença, que representa uma família à qual pertencem quatro vítimas mortais, alegou que as entidades oficiais procuraram “formatar a opinião pública” dizendo que a sinalização que existia do lado poente da praia (Club Med) seria “adequada e suficiente” para previr os riscos. O que sucedeu foi que a derrocada deu-se na parte nascente que não estava identificada com a placa de “queda de arribas”. “O MP tentou negar aquilo que são as evidencias dos factos – não havia sinalização, nem existiu fiscalização”, insistiu Pedro Proença à saída do tribunal.

Já procuradora do Ministério Público salientou que o concessionário da praia, detido por Celestino Monteiro, por sua iniciativa, colocou no leixão uma placa de “zona perigosa”, e que isso seria suficiente para que os banhistas não se colocassem à sombra da arriba. “Pretender responsabilizar as vítimas é de uma crueldade extrema”, disse Pedro Proença, sublinhando que o sinal seria, afinal, um aviso para as pessoas não tomarem banho em certas zonas.

As quedas das arribas são um fenómeno que ocorre com frequência no Inverno, e raramente durante os meses de Verão: “Não me recordo, antes deste acidente, de ter havido derrocadas na época balnear”, disse Sebastião Teixeira, que tem acompanhado a evolução da costa algarvia ao longo dos últimos 20 anos. O advogado João Carlos Silva, lembrando as várias responsabilidades e relatórios que o geólogo produziu enquanto responsável pela ARH e Agência Portuguesa do Ambiente, no Algarve, chamou-lhe “one man show”. Noutro plano, destacou as responsabilidades do Estado em matéria de segurança. “O Estado não pode exigir aos cidadãos, aquilo que não exige de si próprio”, disse, citando a Provedora de Justiça.  

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