Goldman Sachs vai deixar de financiar exploração de petróleo e gás no Árctico

A decisão foi bem recebida por activistas e organizações ambientais, mas é ainda (e apenas) o primeiro passo. Goldman Sachs vai ser o primeiro banco norte-americano a estabelecer uma zona “proibida” para a exploração energética dos seus clientes.

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O Árctico vai ser uma “zona proibida” os projectos financiados pelo Goldman Sachs Reuters

O Goldman Sachs, um dos maiores bancos de investimento do mundo, anunciou que vai deixar de financiar a prospecção e extracção de petróleo e gás natural no Árctico. A razão é ambiental, tal como sublinha o documento onde o gigante norte-americano apresenta a sua nova política ambiental, publicado neste domingo. 

O Goldman Sachs vai estabelecer uma “zona proibida” para o sector do petróleo e do gás “que inclui, mas não está limitada, ao Refúgio de Vida Selvagem do Árctico”, lê-se no documento que detalha as medidas adoptadas pelo banco. A decisão, inédita na banca norte-americana, foi motivada, entre outras coisas, pelos “impactes potenciais em habitats naturais em situações críticas de espécies que já estão em perigo”.

“Os ecossistemas únicos e frágeis da região do Árctico também são fontes de subsistência de grupos de populações indígenas, que têm ocupado algumas áreas há séculos”, diz o texto.

A nova política ambiental foi traçada com base no consenso científico em relação à crise climática, que o banco classificou como um dos “desafios ambientais mais significativos do século XXI”. “Actualmente, a finança sustentável não está no plano secundário: é cada vez mais o núcleo do negócio de uma empresa”, lê-se no site do banco.

Por isso, anunciou que vai dedicar 750 mil milhões de dólares (cerca de 674 mil milhões de euros) para a “transição climática e crescimento financeiro inclusivo” até 2030. “Estamos comprometidos em ajudar os nossos clientes a posicionar-se num futuro no qual a sustentabilidade é nuclear em todas as indústrias e integrada em todos os mercados, com soluções comerciais de sucesso.”

Para ir mais longe é preciso que os governos também dêem o seu contributo, diz David Solomon, presidente executivo da Goldman Sachs, que pede, por exemplo, que os executivos criem um mecanismo que coloque um preço no custo do carbono — algo que não foi alcançado em Madrid, na 25.ª Conferência das Partes (COP25) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas​.

Carvão mineral e óleo de palma

Entre as novas medidas ambientais do banco está o fim do investimento em minas de carvão mineral, “que têm impactos significativos em ecossistemas, na qualidade da água e nas comunidades locais”.

O banco com sede em Nova Iorque também anunciou que vai recusar financiar projectos de centrais eléctricas que usem carvão em países em desenvolvimento, “uma das maiores fontes de poluidores do ar e de gases de efeito estufa”.

Já havia um compromisso prévio nessa linha, mas aplicava-se apenas aos EUA e a outros países desenvolvidos. Agora, aplica-se a todos os países, mas com excepções: a possibilidade de investimento mantém-se, por exemplo, se a central tiver uma forma de capturar e armazenar o carbono produzido (um conjunto de técnicas para retirar o dióxido de carbono da atmosfera ou impedir que chegue até ela) ou investir em tecnologias de reduções de emissões.

Ainda no capítulo do carvão, o banco compromete-se a rever, com as empresas de extracção de carvão mineral, os seus planos de diversificação do projecto e redução de emissões de carbono das operações e do projecto – e irá deixar de financiar as que não tiverem estratégias alternativas “dentro de um espaço temporal razoável”.

O Goldman Sachs também apontou baterias contra o óleo de palma, “que se tornou numa das maiores fontes de óleos comestíveis em todo o mundo”, mas que “coloca pressão em ecossistemas cruciais”. Por isso não vão, entre outras coisas, “financiar, com conhecimento, empresas ou projectos” que desflorestem de forma ilegal ou usem queimadas ilegais para esse propósito. Também vão pedir aos clientes que tenham uma certificação da Mesa Redonda do Óleo de Palma (RSPO) ou outra certificação semelhante.

Plano bem recebido por ambientalistas, mas ainda é pouco

Em comunicado, a organização Rainforest Action Network (RAN) congratula-se pelo facto de o Goldman Sachs se tornar no “primeiro grande banco norte-americano a estabelecer restrições explícitas ao financiamento de qualquer parte do sector do petróleo e gás” assim como das minas de carvão mineral. “É um grande passo em frente”, afirma a RAN, mas as medidas apresentadas ainda “estão longe do alinhamento necessário para limitar as alterações climáticas a 1,5ºC”.

Um dos activistas pelo clima da RAN, Jason Opeña Disterhoft, acredita que as políticas apresentadas pelo Goldman Sachs “mostram que os bancos norte-americanos conseguem traçar linhas vermelhas no que diz respeito à exploração do petróleo e do gás, e agora outros grandes bancos norte-americanos, especialmente a JPMorgan Chase – o maior financiador de combustíveis fósseis por larga margem – devem melhorar ainda mais o que o Goldman Sachs já fez”.

Uma investigação do The Guardian mostrou que os maiores bancos de investimento deram cerca de 700 mil milhões de dólares em financiamento para empresas de combustíveis fosseis, desde a assinatura do tratado de Paris. O grupo era liderado pela JP Morgan Chase, que, desde 2016, deu 75 mil milhões a empresas para expandirem a rede de extracção de petróleo e gás — até ao Árctico.

Da parte da Sierra Club, outra organização ambiental norte-americana, assinala-se a “resistência levada a cabo pelos indígenas”, que pressionaram o Goldman Sachs a tomar uma posição. Ben Cushing, representante da Sierra Club, afirmou que “a administração Trump pode não querer saber da vontade dos norte-americanos ou dos direitos dos indígenas, mas um número crescente de instituições bancárias está a deixar claro que querem saber”. “Gostávamos que outros bancos norte-americanos seguissem o exemplo”.

Ambas as organizações dizem que a posição face ao financiamento de energias fósseis do Goldman “é agora a mais forte entre os seis maiores bancos norte-americanos”. É um “primeiro passo crucial”, disseram os dois grupos num comunicado colectivo.

Ambiente ou custos?

O banco sugeriu que eram os interesses ambientais a motivar esta nova política, mas não é a primeira vez que se mostra avesso à exploração no Árctico.

Em 2017, uma das peritas em recursos naturais do Goldman Sachs disse que a exploração no Árctico não era tão apelativa quanto outras “muito mais baratas, fáceis de produzir e rápidas a chegar ao mercado”. Referia-se, por exemplo, às alternativas energéticas no continente norte-americano, nomeadamente no Texas e no Novo México.

“Achamos que não há motivo nenhum para a exploração [de combustíveis fósseis] no Árctico… Os projectos imensamente complexos e caros como o Árctico têm uma curva de custos demasiado elevada para serem economicamente concretizáveis”, disse Michele della Vigna, então directora de investigação para a indústria energética do banco, citada pelo The Guardian.

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