Selecção com base na nota de curso e anos de serviço é “injusta e insuficiente”

A presidente do Conselho Nacional de Educação lembrou que o sistema de recrutamento português “é transparente, mas não tem em conta a formação contínua, a qualidade e diversidade da experiência dos candidatos nem responde às necessidades das escolas com projectos singulares”.

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Em Portugal, os professores são recrutados com base numa lista graduada, que é processada a nível central para todo o país PAULO PIMENTA/arquivo

A presidente do Conselho Nacional de Educação considerou esta terça-feira injusto e insuficiente fazer a selecção de professores com base apenas na nota final de curso e anos de serviço, defendendo que algumas escolas deveriam ter mais liberdade de escolha.

Maria Emília Brederode dos Santos esteve esta terça-feira na Comissão de Ciência, Educação, Juventude e Desporto, onde apresentou o estudo realizado pelo CNE sobre o Regime de selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e ensinos básico e secundário. A presidente do CNE começou por salientar que o documento “não é um parecer, mas sim um estudo” e que “não existe uma posição do CNE sobre esta matéria”, uma vez que tal não foi pedido nem levado a plenário. 

O estudo comparou três regimes de selecção de professores existentes na Europa: as listas de candidatos, o recrutamento aberto e o procedimento concursal. O “cenário A” corresponde, genericamente, ao modelo português em que os professores são recrutados com base numa lista graduada, que é processada a nível central para todo o país e não permite conhecer o perfil dos candidatos.

O “cenário B” permite seleccionar com base num melhor conhecimento dos candidatos e recrutar os que melhor se adequam aos projectos educativos municipais e dos agrupamentos de escolas. O “cenário C” aponta para uma selecção ao nível do agrupamento/escola, com recurso a instrumentos e critérios diversificados, de modo a contratar os que melhor se adequam ao contexto e ao projecto educativo que se pretende desenvolver.

“Qual dos três sistemas de selecção de professores considera mais acertado?”, questionou o deputado social-democrata António Cunha. Maria Emília Brederode dos Santos lembrou que o sistema de recrutamento português “é transparente, mas não tem em conta a formação contínua, a qualidade e diversidade da experiência dos candidatos nem responde às necessidades das escolas com projectos singulares”.

Por isso, entende que algumas escolas deviam ter mais liberdade. Por exemplo, nas escolas com projectos de autonomia e flexibilidade curricular “deveria haver possibilidade de melhor adequação dos professores ao contexto e aos projectos pedagógicos”. Serão então os professores escolhidos os mais adequados? “Parece-me que a simples nota final do curso e tempo de serviço não será suficiente. Obviamente que há outros critérios que deverão ser tidos em conta”, defendeu. A presidente do CNE considera que também “é injusto para os professores” considerar apenas aqueles dois critérios, apesar de reconhecer que são “dados muito objectivos”.

O CDS também considera o modelo existente incompatível com a flexibilidade curricular, defendendo que a solução “mais razoável” seria haver um concurso de recrutamento e depois uma selecção por parte das escolas, “não pelas autarquias”. A deputada centrista, Ana Rita Bessa, criticou o estudo do CNE por olhar para a carreira dos professores, mas se esquecer de analisar “as melhores condições para os alunos aprenderem” e pelo facto de a palavra “mérito” estar “omissa no documento”. Para o CDS, a selecção dos docentes tem de ser feita tendo em conta a qualidade dos professores.

Também o deputado do Iniciativa Liberal, João Cotrim de Figueiredo, apontou o “cenário C” como a melhor opção, defendendo mais autonomia para as escolas. O presidente do partido considerou que o modelo de recrutamento em vigor é “obsoleto e não responde às necessidades das escolas”: “Não é a escola que selecciona o professor, mas o professor que selecciona a escola”, criticou.

Já os deputados dos partidos de esquerda — PCP e Bloco de Esquerda — alertaram para o perigo de as duas últimas opções de selecção (os cenários B e C) poderem agravar as desigualdades regionais. A deputada do Bloco de Esquerda, Alexandra Vieira, questionou se não haveria o risco de os territórios com mais recursos económicos poderem contratar os melhores docentes: “O recrutamento local, tendo em conta a municipalização, não irá agravar as desigualdades?”.

Para o PCP, o modelo vigente acaba por ser o “menos imperfeito": “Não há modelos perfeitos para a colocação de professores, mas quanto a nós o existente é o menos imperfeito deles todos”, afirmou a deputada comunista Ana Mesquita. A deputada criticou o estudo do CNE por não ter “avaliado devidamente o risco dos cenários B e C”, que defendem o recrutamento feito pelas autarquias ou pelas escolas.

“O que irá acontecer se se mandar para as autarquias ou escolas a contratação de professores?”, questionou o PCP, lembrando que o estudo “compara realidades europeias mas esquece as especificidades nacionais”, nomeadamente no que toca à carência de meios técnicos e humanos para fazer concursos locais.

A presidente do CNE reconheceu que os cenários que dão mais liberdade aumentam as possibilidades de desigualdades territoriais e até o risco de menor transparência. No entanto, lembrou que estando identificados eventuais perigos também caberá ao Estado intervir para minimizar esses riscos. Durante a audição, Maria Brederode dos Santos apresentou também o Estado da Educação 2018, realizado pelo CNE e divulgado no final de Novembro.

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