PCP em Évora de olho no OE2020, no investimento e nas creches públicas

João Oliveira diz que todos os sentidos de voto estão em cima da mesa – até a abstenção, que o PCP nunca usou num OE, e que permite, mesmo que o BE vote assim, a aprovação do orçamento.

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João Oliveira Nuno Ferreira Santos

Em Évora, com os olhos no Orçamento do Estado. De 2020 e dos próximos anos, porque os problemas do distrito alentejano assim como os do país são “estruturais” e precisam de dinheiro, trabalho, empenho e vontade política. É esta a postura dos deputados do PCP, que nesta quinta e sexta-feiras fazem as primeiras jornadas parlamentares da legislatura em Évora, distrito que há 12 anos não recebia este evento dos comunistas.

Para o PCP, está tudo ali: a falta de investimento público nos transportes (ferrovia e rodovia), nos hospitais, nas escolas, nas forças de segurança e protecção civil; a desertificação das aldeias, os idosos que ficam sozinhos, a falta de apoios para as jovens famílias; a agricultura cada vez mais virada para o olival e amendoal intensivos, que sugam a água do Alqueva que ainda não chega em condições ao abastecimento público, e a indústria da pedra abandonada.

A pouco mais de uma semana da proposta do Governo para o OE2020 entrar na Assembleia da República, o líder parlamentar do PCP recusa fazer “prognósticos antes do fim do jogo”. Segue o discurso de Jerónimo de Sousa: “Agiremos com total independência e liberdade, como nos últimos anos”, responde, quando se lhe pergunta se o partido está agora mais à vontade.

Se com a “geringonça” o PS precisava dos votos favoráveis de BE e PCP, agora só precisa de um deles – ou da abstenção dos dois. Abstenção foi um sentido de voto que o PCP nunca usou em orçamentos, lembra João Oliveira, que garante que o sentido de voto dos bloquistas não irá “nunca” condicionar o seu.

Da direita, mais concretamente o PSD, parece haver já apoio ao Bloco, PCP e PEV para fazer baixar o IVA da electricidade de 23% para 6%, mas João Oliveira desconfia. Lembra que a 5 de Julho, quando a Assembleia da República votou uma proposta de lei do parlamento madeirense (que este tinha aprovado por unanimidade), o PSD e o CDS abstiveram-se, permitindo que o voto contra do PS chumbasse a inclusão da electricidade nos serviços com taxa reduzida do IVA. Nessa mesma tarde, Rui Rio apresentava, no Porto, um pacote de propostas para as finanças públicas que previam uma redução da carga fiscal de 3,7 mil milhões de euros incluindo a redução do IVA da electricidade para 6%.

“Com este grau de oportunismo, quem é que confia no PSD”, questiona João Oliveira, para quem as conversas daquele partido não passam de “banha da cobra”. Outro exemplo é o PSD “estar preocupado com quem vive do rendimento do capital, que é uma ínfima parte dos portugueses, a fatia dos privilegiados”, e depois diz que não sabe como se vive com os 600 euros do salário mínimo – “Uma verdadeira farsa política”, critica.

O PCP, diz, continua a discutir o assunto com o Governo. Mas os custos que é preciso reduzir na energia vão mais longe e derivam da liberalização quase total do mercado. Por isso os comunistas vão, por exemplo, insistir na fixação de um regime de preços máximos para os combustíveis, em vez da estratégia de hoje de ter o IVA e o ISP sobre o preço livre.

Sobre as negociações para o orçamento, que na legislatura passada obedeciam a um ritual e envolviam diversas equipas consoante as áreas, João Oliveira continua a ser parco em palavras. Tem havido “alguma troca de informação” e “identificação de um conjunto de matérias relevantes”, mas admite que “não há um trabalho nos mesmos moldes daqueles quatro anos” nem há um “processo tão concentrado e intenso de discussão das matérias”.

Neste momento, o PCP está “à espera de resposta a um conjunto de propostas”, que vão da valorização dos trabalhadores em termos de carreiras, salários e pensões à rede de creches públicas, que foi uma das bandeiras eleitorais do partido, passando por uma série de investimentos públicos. E também, do lado da receita, há propostas como a taxa de 35% para lucros superiores a três milhões de euros, a de 50% ou 90% sobre as transferências financeiras e rendimentos enviados para paraísos fiscais, fim da zona franca da Madeira, ou o englobamento obrigatório de todos os rendimentos em IRS acima dos 10 mil euros, entre outras. “Não há nada que seja penduricalho ou pouco relevante. Se o Governo quiser manter o conquistado nestes anos, tem aqui propostas. Se não quiser...”

Sobre o aumento das pensões, os comunistas querem um mínimo de 40 euros do poder de compra durante a legislatura, o que poderá significar o crescimento fatiado como nos últimos anos, embora o líder parlamentar lembre que não são atingíveis apenas pela via automática. E no caso do salário mínimo nacional, que o PCP quer que chegue, a prazo, aos 850 euros, o partido atira a bola quando se pergunta prazos: “O Governo que nos diga quando é possível ter 850 euros. Os 750 euros são manifestamente insuficientes. Digam-nos quando se pode ter 850.”

E o que se pode fazer com o excedente orçamental que Portugal deverá ter este ano? O dirigente comunista prefere olhar para outro valor. “Todos os anos temos 6000 milhões de euros que pagamos de juros e que deviam ser usados para investimento público. Esses sim, são o excedente orçamental que não estamos a aproveitar. E que deviam servir para equipar hospitais, centros de saúde, recuperar esquadras, quartéis, escolas, serviços da Segurança Social, investir em infra-estruturas”, vai enumerando. “Dizem-nos que não há dinheiro. Há, há.”

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