Portugal faz melhor com menos dinheiro: mortes evitáveis abaixo da média europeia

Nalgumas áreas da saúde conseguimos ter melhores resultados gastando menos 855 euros por pessoa, destaca relatório da Comissão Europeia. Mas continuamos a investir pouco dinheiro na prevenção, apenas 36 euros per capita por ano.

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Paulo Pimenta

Com muito menos dinheiro, menos 855 euros per capita por ano do que a média dos países da União Europeia (UE), Portugal consegue ter uma taxa inferior de mortes por causas evitáveis e tratáveis, como cancro do pulmão, doenças relacionadas com o álcool e acidentes vasculares cerebrais, revela um relatório da Comissão Europeia. E isto verifica-se mesmo em comparação com vários países mais ricos.

Os bons resultados de Portugal nas mortes por causas evitáveis (através de medidas de saúde e prevenção primária) e por causas tratáveis (mortes evitáveis com tratamentos apropriados e atempados) destacam-se no documento que inclui o perfil de saúde de 30 países (28 da UE, mais a Islândia e a Noruega) e que faz parte do relatório sobre a Situação da Saúde na União Europeia 2019, elaborado pela Comissão Europeia com a colaboração da OCDE. O relatório será apresentado na quinta-feira em Lisboa.

Portugal consegue, neste domínio, ficar à frente de países como a Áustria, a Dinamarca, a Alemanha e o Reino Unido, numa lista em que a Lituânia, a Letónia e a Hungria ocupam os últimos lugares, com mais do dobro de mortes evitáveis do que a média dos países analisados. A nossa taxa de mortalidade por causas evitáveis era de 140 óbitos por mil habitantes em 2016.

Mas Portugal poderia exibir melhores resultados, se eventualmente aumentasse o dinheiro que investe na prevenção. Neste indicador não ficamos bem no retrato europeu. Gastamos menos quase metade do valor que a média dos países analisados investem em prevenção, apenas 1,8% do total das despesas em saúde, cerca de 36 euros per capita, face aos 3,2% da UE. A prevenção da doença inclui três dimensões, incluindo a primária (promoção da saúde e intervenção antes que a patologia surja), a secundária (exames para detectar doenças em fases precoces, por exemplo mamografias) e a terciária (tratando as doenças após o diagnóstico, parando a progressão da patologia, por exemplo com reabilitação ou quimioterapia). 

A aposta em prevenção é determinante: mais de um terço de todas as mortes em Portugal “podem ser atribuídas a factores comportamentais, sobretudo maus hábitos alimentares, tabagismo e consumo excessivo de álcool”, lê-se no documento.

Despesa dos cidadãos muito acima da média

O perfil de Portugal traçado neste relatório indica, por outro lado, que os portugueses continuam a gastar muito mais dinheiro do seu bolso (out of pocket) com a saúde, no ambulatório (por exemplo em consultas e exames no privado e com medicamentos). E enfatiza que “o elevado nível de despesas não reembolsadas”, que constituem agora 27,5% do total das despesas de saúde, fica “bastante acima da média da UE (15,8%)”. Esta “dependência excessiva” dos pagamentos directos para financiar o sistema de saúde “pode minar a acessibilidade e contribuir para empobrecer os agregados familiares”, avisa.

Em 2017, “a comparticipação pública nas despesas com a saúde era de 66,3 % do financiamento total da saúde, consideravelmente abaixo da média da UE de 79,3 %”. Um valor que a Comissão Europeia imputa em parte à redução do financiamento público da saúde durante o programa de ajustamento económico (de 2011 a 2014). Entre 2010 e 2017, as despesas de saúde diminuíram, em percentagem do PIB (Produto Interno Bruto), praticamente um ponto percentual, enquanto a despesa pública em saúde baixou perto de três pontos percentuais (de 69,8 % para 66,4%)”.

No que toca à despesa com a saúde, apesar de Portugal ter recuperado da quebra verificada desde a crise económica, os hospitais públicos têm acumulado avultados pagamentos em atraso, “cuja persistência mina a sustentabilidade financeira do SNS [Serviço Nacional de Saúde]”. 

Outra boa notícia é a de que as barreiras no acesso à saúde estão a diminuir em Portugal, mas ainda há entraves, particularmente para os habitantes de áreas rurais e continuam a existir grandes disparidades entre as pessoas com diferentes escalões de rendimentos.

Com os últimos Governos, as necessidades não satisfeitas em saúde diminuíram desde 2014, apesar de continuarem acima da média europeia. A maior parte destas necessidades que ficaram sem resposta “foram precipitadas por dificuldades financeiras”. Estima-se, aliás, que em Portugal 8,1% das famílias tiveram despesas de saúde catastróficas, refere o documento. Também o número de camas hospitalares tem vindo a reduzir-se e é actualmente “relativamente baixo” em comparação com a média da UE. 

Já a esperança de vida está a crescer continuamente desde o ano 2000, chegando aos 81,6 anos em 2017, ligeiramente acima da média europeia. Mas as disparidades por sexo e por estatuto socioeconómico prevalecem, com uma diferença de cerca de seis anos entre os homens e as mulheres e entre os indivíduos com um nível de escolaridade mais alto e mais baixo. 

Na vacinação, estamos no grupo dos três melhores, com taxas de imunização em crianças contra a difteria, o tétano, a tosse convulsa e o sarampo bastante acima da média europeia. com Lusa

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