Colectivo Berru vence Prémio Sonae Media Art com instalação biológica

Júri do prémio de 40 mil euros escolheu entre cinco finalistas que mostram trabalhos inéditos numa exposição no Museu do Chiado.

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O colectivo Berru, constituído por Bernardo Bordalo, Mariana Vilanova, Rui Nó e Sérgio Coutinho, com a instalação rui gaudêncio,rui gaudêncio
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rui gaudêncio

Os ventos entraram no Museu Nacional de Arte Contemporânea (MNAC), em Lisboa. Não através da pintura oitocentista, como Zéfiro, o vento suave e agradável que vem do oeste, ou como Euro, o vento criador de tempestades que chega do leste. Estes ventos que fazem parte da obra System Synthesis são anónimos, materializando-se através de coisas mais prosaicas como três ventoinhas de chão.

São eles que, como uma brisa, agitam as folhas das plantas que compõem a instalação biológica vencedora do Prémio Sonae Media Art, escolhida entre cinco finalistas e anunciada esta quarta-feira numa cerimónia no MNAC em que esteve presente a ministra da Cultura. Canas, trepadeiras e capim, transplantadas de um terreno baldio e monitorizadas por 40 sensores, mostram que natureza e tecnologia podem viver em simbiose.

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A instalação Síntese de Sistemas no Museu do Chiado

“A instalação tenta criar um sistema de computação apropriando-se de um sistema biológico existente. Os sensores que são necessários para manter o sistema biológico vivo, como os que medem a temperatura, a humidade, o oxigénio, o dióxido de carbono ou o movimento das folhas das plantas, são utilizados também para gerar uma paisagem sonora. Essa composição é a forma de visualizarmos a simbiose entre tecnologia e natureza”, explica Sérgio Godinho, que juntamente com Bernardo Bordalo, Mariana Vilanova e Rui Nó recebeu este prémio no valor de 40 mil euros, considerado um dos mais significativos no campo das artes visuais em Portugal e destinado a artistas com menos de 40 anos.

Com idades entre os 23 e os 28 anos, os quatro artistas formam o Colectivo Berru, criado no Porto em 2015, com um trabalho que tem reflectido sobre a relação íntima do ser humano com a máquina, ultimamente envolvendo também sistemas biológicos vivos. “Aproveitámos um sistema que já existe na natureza para o ser humano perceber que existem sistemas biológicos à nossa volta muito mais complexos do que nós próprios. A ideia é desacelerar a velocidade em que vivemos na era digital”, dizem os membros do Colectivo Berru.

É por isso que o centro da sala da exposição dedicada ao Prémio Sonae (proprietária do PÚBLICO), inaugurada na semana passada, foi ocupado pela natureza e não pelo espectador, porque esta é uma obra que também serve para reflectir sobre o Antropoceno, a nova época geológica em que vivemos moldada pela crise ambiental provocada pela actividade humana.

Uma ilha no museu

No espaço do museu, o colectivo portuense criou uma ilha de terreno verde com dois metros de diâmetro. Em System Synthesis, que reproduz o ecossistema das plantas transplantadas, o Sol é substituído por três lâmpadas que emprestam ao espaço um brilho intenso. A água chega através de um sistema de rega.

Para o júri da terceira edição do Prémio Sonae Media Art, a obra propõe uma reflexão sobre como a tecnologia pode ser usada na preservação do ecossistema natural. Constituído por Miguel Soares (artista), Patrícia Gouveia (Faculdade de Belas-Artes de Lisboa) e Yves Bernard (director do iMAL, em Bruxelas), o júri salientou na acta disponibilizada aos jornalistas a eficácia cenográfica da instalação e a sua capacidade de enunciar conceitos “de forma clara e atractiva para o público”. A obra, lembram, enquadra-se "numa das principais correntes de interligação entre arte e tecnologia presentes na investigação da arte contemporânea”. 

O júri apontou ainda que a obra “tira partido de simples meios tecnológicos para invocar aspectos críticos do nosso mundo”. Por último, lembrou “as questões pertinentes que coloca em termos de desafios de conservação num contexto museológico”.

Além do vencedor, a exposição dedicada ao Prémio Sonae, que pode ser vista até 2 de Fevereiro, mostra as obras dos outros quatro finalistas - Diogo Tudela, Francisca Aires Mateus, Rudolfo Quintas e ainda do colectivo composto por Tiago Martins, João Correia e Sérgio Rebelo –, que tal como o colectivo do Porto receberam uma bolsa de cinco mil euros para produzir os trabalhos.

“Cada vez mais vemos novas gerações de artistas a incorporar no seu processo criativo as alterações climáticas, a água, o vento, os plásticos, os oceanos”, afirmou a ministra da Cultura, citada pela Lusa, acrescentando que é importante apoiar este tipo de projectos, aqui numa parceria com uma empresa privada, devido ao impacto que podem ter no futuro.

Quanto ao destino dos 40 mil euros, os membros do Colectivo Berru dizem ao PÚBLICO que o pretendem gastar rapidamente. “Porque o principal é conseguirmos tempo [para criar]”, termina Sérgio Coutinho.

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