Razões para os novos partidos terem tanto tempo de antena

Noutro ano, na mesma fase do campeonato, a discussão sobre o Orçamento estava ao rubro e os partidos já estavam a traçar as suas linhas vermelhas.

Andamos a falar e a escrever muito sobre os três partidos que acabam de chegar à Assembleia da República. Pode ser desproporcional em relação à quantidade de votos que tiveram nas eleições legislativas — pouco mais de 192 mil —, mas não nos deixemos iludir: o assunto suscita a curiosidade e o interesse dos leitores. Além disso, tem valor-notícia: é actual, está a acontecer perto de nós, tem novidade e a frequência com que os episódios se sucedem é enorme.

Nas últimas semanas, a Iniciativa Liberal perdeu o líder e vai a eleições, o Chega viu dois dos seus ex-fundadores saírem com acusações de irregularidades e o Livre passou por uma miríade de pequenos acontecimentos em relação aos quais ainda não se sabe exactamente o que esperar. 

No Parlamento, foi um começo de sessão legislativa intenso em fait divers — do deputado que entrou no hemiciclo com uma t-shirt do Movimento Zero ao assessor que chamou um GNR para afastar jornalistas — e que perturbou a oportunidade de os pequenos partidos causarem uma primeira boa impressão.

Mas há que dizê-lo: os novos partidos dominaram a agenda mediática nestes tempos iniciais porque os outros, os que já estavam no espaço político, não se dedicaram a fazê-lo. E isso está intimamente ligado ao período que o CDS e o PSD atravessam.

O CDS, agora reduzido a cinco deputados, perdeu muita da sua chama. Entretido com a perspectiva de eleições, está adormecido pelo processo de surgimento de candidaturas, que tem acontecido a conta-gotas e sem grandes entusiasmos. À medida que surge um novo candidato, fortalece-se a ideia de que ainda há outro à espera atrás da porta. A ainda líder, por seu turno, afastou-se dos microfones como se tivesse deixado de ter voz.

Também o PSD, enredado num processo idêntico, parece mais absorvido pela disputa interna do que pela tarefa de fazer oposição ao Governo. A diferença, em relação ao CDS, é que os candidatos à liderança estão definidos e não se esperam surpresas. Dividido em três partes (não necessariamente iguais), o PSD não fala a uma só voz e isso causa ruído e prejudica a disseminação da mensagem. Mas ao contrário de Assunção Cristas, Rui Rio não age como se tivesse perdido a legitimidade.

Acresce que nesta altura, a qualquer coisa como duas semanas da entrega do Orçamento do Estado, os partidos já deviam estar estar a tentar influenciar as opções do Governo e a discutir ideias e propostas alternativas. Tudo o que vimos foi um ministério — o da Administração Interna — a pressionar outro na praça pública — o das Finanças — para responder às suas necessidades mais prementes. Também houve notícias sobre uma coligação negativa que estará na forja para baixar o IVA da electricidade. E pouco mais. Noutro ano, na mesma fase do campeonato, a discussão sobre o Orçamento estava ao rubro e os partidos já estavam a traçar as suas linhas vermelhas. Esquerda e direita. Às vezes até Madeira e Açores.

Há ainda duas semanas para fazer-se política. Estou em crer que nas semanas que se seguem o palco vai mudar de protagonistas. E ninguém vai zangar-se com isso.

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