Mais de 253 médicos pediram certificados para exercer no estrangeiro

Os clínicos — de várias faixas etárias (e em diversas fases da carreira) — elogiam os salários no estrangeiro, assim como os horários e ritmo de trabalho e, por exemplo, o papel mais interventivo dos enfermeiros e a qualidade da formação.

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Rui Gaudêncio

Entre Janeiro e Agosto deste ano chegaram à Ordem dos Médicos 253 pedidos de certificados para exercer no estrangeiro, avança este sábado o jornal Expresso. E este número que não inclui ainda os dados da região Norte.

O que significa que, caso a média mensal (de 32 pedidos) se mantenha, 2019 irá terminar com 381 pedidos de certificados, aos quais se irão ainda juntar os pedidos registados no Norte. No total, no final do ano, poder-se-ão registar 400 solicitações de certificados para exercer medicina fora do país.

O ano em que mais médicos pediram à Ordem os certificados de que precisam para exercerem fora do país foi 2015, quando se registaram 475 solicitações. Segundo as contas do Expresso, não será difícil voltar a atingir — ou mesmo a ultrapassar — este número. Em 2018, a Ordem dos Médicos recebeu 287 pedidos de certificados para emigração (número que também não inclui os dados da região Norte).

A degradação das condições de trabalho no Serviço Nacional de Saúde (SNS) é a principal razão apontada pelos médicos que pretendem rumar ao estrangeiro. Por outro lado, os incentivos à emigração são também apelativos.

A Comissão Europeia estima que, em 2020, a Europa terá uma falta de 230 mil médicos, pelo que 13,5% das necessidades de assistência dos europeus ficarão por assegurar.

Já o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, prometeu contratar seis mil médicos no próximo ano se for reeleito — muitos dos quais poderão ser portugueses, uma vez que o Reino Unido é um dos principais destinos escolhidos pelos médicos portugueses. Além do Reino Unido, alguns dos principais países para onde os médicos portugueses emigram são a Alemanha, Irlanda, França, Bélgica, assim como a Suíça, Brasil, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Suazilândia, segundo o sem

Ouvidos pelo Expresso, os clínicos — de várias faixas etárias (e em diversas fases da carreira) — elogiam os salários no estrangeiro, assim como os horários e ritmo de trabalho e, por exemplo, o papel mais interventivo dos enfermeiros e a qualidade da formação.

Por exemplo, enquanto em Portugal um especialista recebe 1300 euros líquidos no primeiro ano de serviço no SNS, em França o valor varia entre 2000 e 5000 euros, e na Suíça entre 5500 a 6000 euros.

A Secção Regional Centro da Ordem dos Médicos criou um gabinete de apoio aos médicos no estrangeiro que funciona há três anos, que tem também como objectivo promover o regresso a Portugal e a criação de condições de trabalho competitivas no Serviço Nacional de Saúde.

Já o Ministério da Saúde afirma, citado pelo Expresso, ter “consciência do reconhecimento dos profissionais de saúde portugueses” e garante que tem vindo a procurar “criar e reforçar as condições de atractividade” do SNS “que passam por uma gestão mais flexível, global e integrada” e que “estão a ser estudadas medidas concretas com vista a novos modelos de organização”.

“Precisamos dos nossos médicos em Portugal”

A ministra da Saúde, Marta Temido,​ já reagiu aos números agora divulgados e reconheceu que Portugal não foge ao chamado fluxo de médicos, destacando a procura de médicos de outros países, nomeadamente do Brasil e de países de língua portuguesa. No entanto, lembra que muitos destes profissionais fazem apenas deslocações pontuais para formações no estrangeiro.

“Estando integrado num mercado global, é natural que [Portugal] também sinta esse fluxo nas saídas de profissionais de saúde. Importante é não fazer uma ligação directa, porque ela não existe, entre quem pede o certificado de boas práticas para exercício num outro país e a emigração. Há emigração e há pessoas que pedem o certificado de boas práticas para a realização de cursos e de formação pontual”, afirmou Marta Temido.

Já o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, destacou a importância de criar condições de trabalho adequadas para incentivar os profissionais a exercerem a profissão em Portugal. “A Europa continua a ser o principal destino de uma grande parte destes médicos. Isto preocupa-nos, como é evidente, porque nós precisamos dos nossos médicos em Portugal”, sublinhou.

O bastonário nota que existem, em Portugal, “médicos de excelência”, com “uma boa qualidade de formação”, razão pela qual “são desejados pelo resto do mundo”. “Todas as semanas existem pedidos de outros países para contratar médicos portugueses de várias especialidades, desde a anestesiologia, medicina geral e familiar, cardiologia, pediatria, etc. E, portanto, se nós não fizermos nada, se não valorizarmos aquilo que é o trabalho das pessoas, se não as respeitarmos, se não cuidarmos delas é óbvio que isto vai continuar a acontecer infelizmente”, concluiu Miguel Guimarães.

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