Então, caramujos? Sines lança glossário com “dizeres” antigos

Glossário digital inclui 329 expressões utilizadas pela população de Sines. “Se não registarmos esse vocabulário, daqui a uns anos ninguém se vai lembrar que nós dizíamos que íamos ‘ouvir o chui’ porque as pessoas que usam estas expressões estão a desaparecer”, diz responsável pelo projecto Dizeres.

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Arquivo

A Câmara Municipal de Sines, no distrito de Setúbal, vai lançar esta semana um glossário digital com um total de 329 “dizeres” antigos da comunidade com o objectivo de valorizar as culturas e as tradições locais.

O projecto Dizeres, promovido pelo Arquivo e Biblioteca Municipal de Sines, decorreu ao longo deste ano e permitiu recolher 625 unidades vocabulares, tendo sido seleccionadas 329 expressões “consideradas significativas para as comunidades de Sines”, no litoral alentejano. São palavras utilizadas pela população que “nasceram de vivências muito específicas”, trazidas para o concelho de Sines pelas comunidades algarvia, setubalense e cabo-verdiana ou pelos descendentes dos ílhavos, que estão a cair em desuso, mas que o município quer preservar.

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“Se não registarmos esse vocabulário, daqui a uns anos ninguém se vai lembrar que nós dizíamos que “íamos à praça” (mercado municipal) e que íamos “ouvir o chui” (sinal que andavam no leilão do peixe, durante a lota), porque as pessoas que usam estas expressões estão a desaparecer”, sublinhou à agência Lusa Sandra Patrício, técnica do arquivo municipal. No final da recolha, a equipa contabilizou mais de mil expressões, muitas delas comuns à região do Alentejo, outras “usadas como arcaísmo” ou “resultantes da vinda de outras populações do resto do país” para Sines.

No glossário constam palavras como “carrega”, usada para definir o marítimo que descarrega o peixe, “caramujo” (molusco marítimo, conhecido noutras regiões por burrié, e nome atribuído aos habitantes de Sines), “larido” (zona rochosa onde há muito marisco), “barroca” (pequena porção de terra) ou “entrouxado” (mal vestido ou máscara de Carnaval). “No final, ficámos com 329 expressões que esperemos que aumentem com a publicação do glossário e outros membros da comunidade nos tragam outras palavras e expressões para podermos registar, contextualizando cada um dos vocábulos para que as pessoas compreendam, no futuro, o que cada um dos termos significava”, acrescentou.

O glossário digital, que a partir desta semana vai poder ser consultado na página online do município, está dividido em três capítulos, Mar, Um Pé na Terra e um Pé no Mar e Terra, representando as actividades desenvolvidas pela população local. “O glossário vai aliar a imagem dos documentos de arquivo, que podem ilustrar esses dizeres, desde o início do século XX, obtidos não só pela actividade da câmara municipal, mas também pelo trabalho de recolha que o município tem desenvolvido junto dos membros da comunidade”, explicou Sandra Patrício.

O glossário, que será no futuro publicado em papel, segundo a mesma técnica, é “um testemunho” daquilo que foi “a vida do concelho de Sines nos últimos 100 anos”. Além do glossário digital, o município está a promover também uma exposição sobre estes dizeres, que está patente, até 8 de Dezembro, no Centro de Artes de Sines, seguindo depois em itinerância pelo concelho.

O projecto, que recebeu um apoio financeiro de 17 mil euros, foi co-financiado pela 3.ª edição do programa Tradições, da EDP, e contou com a parceria da Biblioteca Municipal de Sines e o apoio científico da Universidade de Évora.

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