Quem ficar com a exploração do lítio terá de contribuir para a sua reciclagem

Durante uma audição na AR, o ministro do Ambiente foi particularmente duro com a oposição, acusando de estultice e má-fé quem continua a questionar a legalidade da assinatura do contrato de Montalegre. E manifestou a aposta séria que o Governo pretende fazer na cadeia do lítio

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João Pedro Matos Fernandes falou na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, na Assembleia da República, numa audição a pedido de vários grupos parlamentares Nuno Ferreira Monteiro

Estultice. Má-fé. Afectações pituitárias. Incompetência. Defender ilegalidades. O ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, não poupou nos termos nem foi brando nas palavras que escolheu para responder aos deputados durante a audição conjunta em que, com o secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, João Galamba, foi questionado acerca da assinatura do contrato de concessão para a exploração de lítio em Montalegre assinado com a empresa Lusorecursos. Para além de defenderem a legalidade deste contrato, assumiram a aposta “séria” que estão a fazer na cadeia do lítio e mostraram que estão preocupados não só com a sua extracção, mas também com a sua reciclagem.

“Só por estultice ou por má-fé se pode usar o argumento da juventude da empresa que assinou o contrato. É cristalino o cumprimento da lei”, asseverou o ministro do Ambiente, acusando o PSD se estar a fazer uma campanha “absolutamente insidiosa” em torno deste processo. “A concessão foi outorgada não a uma empresa criada há três dias, mas sim à empresa que a Lusorecursos indicou, nos termos previstos nas leis vigentes e nos exactos termos do contrato que foi homologado, com uma caneta azul, pelo próprio ministro Álvaro Santos Pereira “, esclareceu o governante.

Sobre o facto de o presidente do PSD ter dito que o processo lhe cheirava a esturro, Matos Fernandes disse querer deixar uma sugestão a Rui Rio: “Que desligue o forno, pois o empadão de mentiras que inventou, feito de sobras dos jantares de sexta-feira à noite, esturricou”. “Enfim, temos um líder de oposição que é engenheiro nasal, especialidade que a ordem não reconhece. Não falarei nesta intervenção mais sobre este processo, estando disponível para responder a todas as perguntas que entenderem por bem. O lítio e a sua importância merecem mais do que as afectações pituitárias do dr. Rui Rio”, ironizou o ministro.

E Matos Fernandes teve, de facto, de responder a muitas perguntas. Mas nem ele nem João Galamba saíram do guião de que se limitaram a cumprir a lei, que não foram eles que entregaram concessão nenhuma, e que agora a empresa tem de apresentar um estudo de impacte ambiental para o projecto avançar. “Perguntam se os alertas que recebemos não deveriam obrigar o Governo a pensar. O Governo tem de cumprir a lei. O que nos pediram, naquela audiência que ocorreu três semanas depois de o despacho estar assinado, era que o Governo revogasse uma decisão que tomou com base em pareceres técnicos. E que revogasse com base em quê? Nuns senhores que apareceram lá a dizer: ‘Eu acho que fui burlado pelo meu sócio?’”, questionou João Galamba, dando de seguida aquilo que considera ser a resposta: “Isso seria uma ilegalidade”.

“Então, por que é que o ex-director-geral de Energia e Geologia (DGEG) disse que não assinava o contrato?”, perguntou João Almeida, do CDS-PP. “Essa é uma pergunta que lhe pode colocar a ele. Mas foi tanta a incompetência durante o seu mandato... E, depois de o ouvir dizer tamanha ilegalidade, eu não daria grande crédito ao que diz o ex-director-geral”, respondeu Matos Fernandes.

Apesar de, durante a audição, ter havido muita troca de acusações e de responsabilidades entre o PS e o PSD, o que sobrou das palavras do Governo foi que a aposta no lítio é para ser levada a sério (“Portugal quer ter uma refinaria de lítio, como quer apostar no hidrogénio”, disse João Galamba), e que as preocupações ambientais vão ser tidas em conta. “É por termos essas preocupações que ainda não lançámos nenhum concurso para entregar a prospecção e pesquisa. Vamos regulamentar a lei e garantir que tudo estará definido nos concursos e nas minutas dos contratos”, asseverou o ministro.

Já na recta final da audição, foi o secretário de Estado, João Galamba, quem acrescentou uma novidade face a tudo o que já tem vindo a ser anunciado e escrito: depois de referir que os royalties mineiros (4% das receitas anuais da concessionária) serão partilhados com os municípios, acrescentou que as concessionárias terão de assegurar um contributo para a reciclagem do minério que vai explorar. “Quem extrair lítio terá de ser responsável também pela sua reciclagem e terá de contribuir para a constituição de um fundo que vai financiar os projectos nesta área”.

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