O tempo é de luxo

A imortalidade é o nosso maior sonho e, por isso, nada como trabalhar para ela, dando-nos tempo a nós e aos outros.

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Jonathan Borba/Unsplash

No pulso não trazem um relógio, mas um contador do tempo que têm de vida. Ela parece ter 25 anos; aliás, todos parecem ter 25 anos, mas, naquele dia, ela celebra os 50 e tem um autocarro para apanhar após o trabalho. Naquela sociedade tudo se paga com o contador de tempo impresso no pulso e ela não tem tempo suficiente para comprar a viagem. Não por egoísmo, mas por razões de sobrevivência, ninguém está disponível para lhe dar o tempo necessário para aquela deslocação. Ela acaba por ficar na paragem e decide correr ao encontro do filho, só ele poderá salvá-la, dar-lhe tempo. Corre, corre o mais depressa que pode, na ânsia de conquistar mais tempo.

Nesta sociedade distópica, o tempo é um luxo. Os ricos andam devagar, saboreiam tudo com calma, e os pobres correm, correm pela sua vida. É assim no mundo criado pelo neozelandês Andrew Niccol, que escreveu e realizou o filme In Time (2011), com Justin Timberlake e Amanda Seyfried. Andará a imaginação de Niccol tão longe da nossa realidade? “Tempo é dinheiro”, dizemos.

Com frequência queixamo-nos de falta de tempo — de tempo para estarmos connosco, com a família ou os amigos, para sairmos da rotina. No fundo, para pararmos ou simplesmente andarmos devagar e saborearmos aquilo a que se decidiu chamar “coisas boas da vida”. É disto que vos falamos nas próximas páginas desta Ímpar. A Sandra Nobre sentou-se com o piloto António Félix da Costa, a jornalista Clara de Sousa e o médico Vítor Almeida — gente para quem o tempo é cronometrado ao minuto.

Já a Susana Pinheiro conversou com alguns especialistas que dão conselhos precisos sobre como nos organizarmos de maneira a alcançarmos algum bem-estar. Dizer “não” é um conselho útil para os que têm medo da palavra e das suas consequências. E a prática do não pode começar desde já, quando planear os próximos dias de festa. A sugestão é para que entregue a organização e confecção a quem sabe, seja a um chef num restaurante ou num hotel, seja em sua casa, abrindo a cozinha a alguém que se preocupe com tudo, inclusive com a limpeza. Quem sabe assim ganha tempo para pôr na mesa algumas das dez sugestões reunidas por Ricardo Dias Felner de produtos que precisam de tempo para conquistar sabores complexos, como o queijo de São Jorge, as sardinhas e as anchovas ou as compotas e o pão de fermentação lenta. Para acompanhar, um vinho, escolhido com tempo e para guardar: as propostas são de Pedro Garcias.

Fernando Melo e João Mestre dedicam-se ao tempo que é preciso para apreciar produtos considerados de luxo como os charutos e os whiskies, mas também a música e a leitura. Fernando Correia de Oliveira viaja no tempo e regressa, meio século depois, para nos contar que os relógios mecânicos, aqueles que parecia que iam morrer, estão mais vivos do que nunca. E Carla B. Ribeiro também escreve sobre o tempo que marcou algumas marcas automóveis, eternizando-as nas nossas estradas e não só.

A imortalidade é o nosso maior desejo e, por isso, nada como trabalhar para ela, dando-nos tempo, a nós e aos outros. Boas festas!

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