Os escassos direitos dos advogados

Um grande número de profissionais vive no fio da navalha no que respeita a condições financeiras. O trabalho é pouco, a concorrência é muita, a procuradoria ilícita grassa e a própria Ordem dos Advogados sofre de um atroz amorfismo.

Os portugueses têm a ideia generalizada que os advogados são uma classe privilegiada, mas a verdade não é bem assim. As obrigações são muitas e os direitos escassos.

Todos os meses, um advogado tem contribuições obrigatórias para a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, com um valor mínimo geral de 230€, sendo que, basicamente, esta é apenas uma caixa de pensões, um fundo de reforma, não tendo cariz assistencialista.

Oferece alguns, poucos, benefícios, como um subsídio de nascimento, de morte, de maternidade e de internamento. Mas mesmo aqui com especificidades bacocas. Por exemplo, um subsídio de internamento só é dado a partir de dois dias… isto quando cada vez mais se impõem internamentos mais curtos. Situações evidentes de incapacidade, como a sujeição a tratamentos de quimioterapia ou reabilitação, em regime de ambulatório, que se traduzem numa incapacidade total para trabalhar, não merecem qualquer tipo de ajuda.

Urge, portanto, repensar a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores.

Um grande número de profissionais vive no fio da navalha no que respeita a condições financeiras. O trabalho é pouco, a concorrência é muita, a procuradoria ilícita grassa e a própria Ordem dos Advogados sofre de um atroz amorfismo.

Perante este estado de coisas, um advogado paga quota mensal à Ordem de 35€, 230€ à CPAS, e tem, ainda, despesas com renda, água, electricidade, serviço telefónico e net, assistência informática e por vezes funcionários, entre outros.

Mesmo aqueles que numa fase mais adiantada da vida e da carreira estão bem, podem, sem aviso prévio, deixar de estar, tal como aconteceu nos anos da crise que trouxeram tantas insolvências e o fim de avenças e clientes fixos, que deixaram advogados de meia-idade, há muito estabelecidos, numa situação de profunda fragilidade.

Ao contrário do que se possa pensar, os advogados não têm qualquer sistema ou entidade de apoio ou subsídio. Enfrentam estas realidades usando as poupanças, os fundos familiares, o apoio de amigos, em situações que muitas vezes raiam a indigência.

É evidente que há que repensar, quer a Caixa, quer a evidente necessidade de criar um sistema de apoios, seja pela contratação de seguros, que os há, seja pela entrada na Segurança Social. Há, porém, que ter em consideração que “entregar” a Caixa à Segurança Social pode não ser o melhor do mundo… mais, a tese de só pagar em função do que se ganha implica, também, receber nessa mesmíssima proporção.

Certo é que, se um advogado ganhar 1500,00€ mês, do que ganha 25% (375€) ficam na fonte para IRS, 265€ vão para a CPAS e quotas, restando pouco mais de 800€ para pagar e sustentar as despesas de escritório, as deslocações e as despesas normais da vida comum. Ou seja, surpreendentemente é claro que não chega.

Se alguns têm de repensar a manutenção na profissão? Talvez.

Mas também há que lembrar que se tem vindo a esvaziar a profissão sem cuidar dos direitos. Nomeadamente com a passagem das cobranças para empresas que usam de agressividade extrema, que assediam o devedor e que o expõem publicamente.

Esvaziamento este que de outra forma, mais insidiosa até, se encontra com a constante diminuição pública da profissão, nomeadamente com os constantes e persistentes ataques aos advogados ditos oficiosos. Ataques que denigrem a profissão, sem que vozes iradas se levantem.

Apesar de diversas propostas, nomeadamente as aprovadas no Congresso dos Advogados, desconhecendo-se se o bastonário já lhes deu seguimento, no sentido de ser obrigatória a assistência por advogado em processos administrativos, bem como às vítimas de determinados crimes (violência doméstica, abusos sexuais), o que não só permitiria a defesa dos direitos de forma mais segura e informada como traria espaço e trabalho aos advogados.

Dúvidas não há, que se impõe não só repensar a Caixa dos Advogados, e Solicitadores, mas também a profissão e os actos próprios dos advogados.

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