População indígena marcha sobre a capital boliviana com os seus mortos

Governo transitório apresentou proposta que abre caminho a novas eleições, mas sem marcar nova data, e acusa Evo Morales de “terrorismo. Protestos não abrandam.

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Corpo de um dos manifestantes mortos nos protestos RODRIGO SURA/EPA

O governo de transição da Bolívia enviou para o Parlamento um projecto de lei que prevê a anulação das presidenciais de 20 de Outubro, tingidas pela suspeita de fraude, e a eleição de novos vogais do Tribunal Supremo Eleitoral, em substituição dos que foram presos após a saída de Evo Morales da presidência. São os primeiros passos para a convocação de novas eleições, conforme prometeu a Presidente interina Jeanine Áñez.

O Governo de Añez, no entanto, não apresentou data para novas eleições na sua proposta. E continuam os protestos contra a tomada do poder pela direita profundamente conservadora e com gestos que agudizaram as fracturas económicas e raciais bolivianas – cerca de 60% da população define-se como tendo origem indígena.

Esta quinta-feira, um grupo de populares de El Alto, a segunda maior cidade boliviana, nos arredores de La Paz, e a maior cidade da América Latina habitada na sua maioria por população de origem ameríndia, pretende descer até à capital, vestido de luto, numa manifestação com os caixões dos oito manifestantes da comunidade mortos pela polícia nos confrontos dos últimos dias, diz o jornal La Razon.

“Todos os bairros da cidade de El Alto se puseram de acordo, todos sem excepção”, relata o jornal boliviano. “Vamos descer vestidos de negro para que toda a imprensa internacional e nacional saiba que este Governo matou os nossos irmãos”, afirmou um membro da comunidade.

O Ministério Público acusou sete pessoas pelo crime de “terrorismo” devido ao assalto a uma fábrica de hidrocarbonetos na zona de Senkata, onde morreram estas oito pessoas.

O Governo procura acusar o Presidente cessante, Evo Morales, de estar a organizar protestos e bloqueios que deixaram várias cidades sem combustível nem alimentos, mesmo estando no México, que lhe deu asilo político.

O ministro Arturo Murillo divulgou na quarta-feira uma gravação de áudio que diz ter a voz de Evo Morales a coordenar com um dirigente local, na Bolívia, movimentações para cercos e bloqueios que deixaram privadas de alimentos várias capitais estaduais. Para o Governo de Añez, estas são provas de que Morales pratica “terrorismo”. “Esse é Evo Morales, esse é o humilde camponês em que o seu povo acreditou. Esse é Evo Morales a fazer terrorismo”, afirmou Murillo, que anunciou que está a ser preparada uma queixa internacional nas “instâncias correspondentes”.

O número total de mortos na violência pós-eleições está em 32, a maior parte nos últimos dez dias, e desencadeou apelos para investigações sobre violações de direitos humanos.

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