Bebé vegan morre nos EUA: negligência ou culpa da dieta?

Um casal vegan da Florida, EUA, é acusado de ter deixado o filho de 18 meses morrer à fome. O PÚBLICO perguntou a especialistas se é possível crescer saudável sem produtos de origem animal.

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"Uma alimentação sem carne, pescado, lacticínios e ovos (…) implica necessariamente alguns ajustes quer em alimentos quer em suplementos" Toa Heftiba/Unsplash

Uma dieta vegan, à base de frutas cruas, foi apontada como a causa de morte de um bebé de 18 meses, ainda que haja estudos que indicam que é possível crescer e ser saudável sem ingerir quaisquer produtos de origem animal.

No caso específico de bebés e crianças pequenas, o pediatra Mário Cordeiro sublinha que “nada disto [de se decidir ser vegan ou ovo-lacto-vegetariano] é errado se for feito com cabeça”. Para o especialista — que publicou recentemente mais um livro de poesia, com o título Fernando Pessoa não tinha cão — o ideal passa por “consultar o médico” e seguir, passo a passo, e mediante as necessidades de cada idade, a orientação nutricional.

“É perfeitamente possível crescer de forma saudável tendo uma dieta vegan ou vegetariana como base”, considera o profissional de saúde, acrescentando que, porém, é “importante complementar a mesma dieta com vitaminas e minerais” adequados a cada fase do crescimento.

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Nadine Primeau/Unsplash

Uma dieta vegan precisa de suplementos

Já os especialistas em nutrição deixam o alerta: para se seguir uma dieta vegan, independentemente da idade, “é preciso ter muita cautela, conjugar os alimentos com muito conhecimento, para ter a certeza de que não há défice nutricional”, dizia a bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento, ao PÚBLICO, no âmbito do 4.º Simpósio Nacional da Grávida, que decorreu, em Setembro, em Vilamoura.

A bastonária sugeria ainda que se fizesse um suplemento de B12, que os produtos de origem vegetal não têm, mas também a ter em atenção o consumo de nutrientes como “o cálcio, o ferro, o zinco e as proteínas que se encontram mais nos alimentos de origem animal”.

Também o nutricionista Pedro Carvalho, num artigo publicado em Maio de 2018, advertia que “uma alimentação sem carne, pescado, lacticínios e ovos (…) implica necessariamente alguns ajustes quer em alimentos quer em suplementos de modo a que o aporte de proteína de boa qualidade, ferro, vitamina B12, cálcio, vitamina D, ómega 3 e iodo não fique comprometido”.

Pais acusados de homicídio por negligência

Uma chamada para as emergências, no dia 27 de Setembro, deu conta de um bebé de 18 meses frio e sem respirar, na sua casa em Cape Coral, no estado norte-americano da Florida. A autora do telefonema era a mãe, de 35 anos, que, já depois de ter sido declarado o óbito da criança, contou às autoridades que o filho não ingeria sólidos há uma semana, estando a ser amamentado — facto que a progenitora terá associado ao mal-estar com a dentição.

Mas o que os socorristas encontraram foi um bebé que apresentava sinais severos de subnutrição: a criança pesava apenas sete quilos, o que corresponde ao peso médio de um bebé entre os cinco e os seis meses, no percentil 50. A mãe explicou que, sendo vegan, a dieta da família, marido e quatro filhos incluídos, era à base de alimentos crus, nomeadamente frutas como manga, rambutão, banana e abacate.

Além do bebé, já sem vida, as autoridades identificaram ainda que as outras crianças também tinham problemas de nutrição, sobretudo as mais novas, de 3 e 5 anos, que são filhas biológicas do casal: peso muito abaixo do normal para a idade, dentes escurecidos e tez amarelada. A terceira, mais velha e filha apenas da mãe, apresentava sinais menos preocupantes, facto que os médicos associaram às visitas da menor a casa do pai biológico, de dois em dois meses.

Ambos os progenitores entregaram-se à polícia pouco tempo depois de ser conhecido o relatório da autópsia que determinou que o menino morreu de subnutrição, informou o jornal local News-Press. Os dois ficaram detidos, com julgamento marcado para 9 de Dezembro.

O caso não é inédito: este ano, um casal foi julgado na Austrália por manter a sua bebé de 19 meses num estado de subnutrição severa (pesava cinco quilos), tendo sido absolvido. Em 2011, um casal vegan foi julgado, em França, pela morte da filha de 11 meses, alegadamente causada pelo regime alimentar que exclui todos os produtos de origem animal — os pais foram condenados a cinco anos, mas acabaram por escapar à prisão, com pena suspensa.

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