“Há mesmo quem queira um Tiananmen 2.0” em Hong Kong

A China está a ver desafiada a sua legitimidade e o princípio “um país, dois sistemas”. É muito difícil prever a sua resposta, diz o investigador Ferran Pérez-Mena, da Universidade de Sussex.

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Manifestante atira de volta granada de gás lacrimogéneo para a polícia MIGEUL CANDELA/EPA
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Ferran Pérez-Mena Facebook

Ferran Pérez-Mena, especialista em Extremo Oriente da Universidade de Sussex, diz que a postura de alguns manifestantes em Hong Kong visa deteriorar a imagem internacional de Pequim. E o facto de a China ver a sua legitimidade desfiada, torna o desfecho do conflito extremamente imprevisível, disse, por email, ao PÚBLICO.

Como descreve a situação em Hong Kong? 
Disse recentemente num artigo que a situação em Hong Kong é uma espécie de “Afeganistão mediático” porque a situação em Hong Kong é muito semelhante à que existiu no Afeganistão em relação à União Soviética [um conflito que fez tremer o regime soviético e acabou por ser um dos factores para a sua dissolução].

Penso que os manifestantes estão a tentar manter este atoleiro para internacionalizar o conflito político com a China e fazer deteriorar a imagem internacional de Pequim. Note-se que a China investiu muito em campanhas de soft power para promover a narrativa da “ascensão pacífica”.

Este cerco à Universidade Politécnica é um ponto de viragem? 
Este pode ser um ponto de viragem dependendo da actuação do governo de Hong Kong. Os manifestantes estão a tentar levar a polícia e as autoridades a ultrapassar uma linha de não retorno que pode pôr em risco a imagem e a legitimidade internacional da China. Infelizmente, há mesmo um grupo de manifestantes – embora não todos – que quer um Tiananmen 2.0 [quando protestos estudantis foram reprimidos com um massacre levado a cabo pelo Exército, em 1989]. A polícia sabe disto. Mesmo que estejamos a ver muita violência num edifício simbólico, diria que isto não é muito diferente do que temos visto no passado. 

Como pode resolver-se o conflito? O que pode acontecer a seguir? 
Infelizmente, acredito que os envolvidos nos protestos estão mais interessados em internacionalizar o conflito com a China nesta altura – e não em tentar encontrar uma solução colectiva. Penso que já foram ultrapassadas algumas linhas vermelhas e que vai ser extremamente difícil voltar a ter normalidade em Hong Kong.

O actual ambiente de guerra comercial entre os EUA e a China também aumenta esta internacionalização do conflito. É extremamente difícil saber o que vai acontecer no futuro. Penso que a China quer evitar um novo desastre como Tiananmen, ainda que a sua posição seja muito difícil porque o que está a acontecer em Hong Kong é um questionar da legitimidade da China e da forma de governo “um país, dois sistemas”. Ainda que seja muito difícil manter este tipo de protestos, penso que os manifestantes estão a tentar prolongá-los o mais possível. Esperam que a China ultrapasse a linha vermelha. Será que a China o vai fazer? Não sabemos. 

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