Opositora de Evo Morales declara-se Presidente interina da Bolívia

Jeanine Áñez, do Movimento Social Democrático, prometeu marcar eleições o mais rapidamente possível. Antigo Presidente acusa-a de ser uma “golpista de direita”. Macri não reconhece a nova chefe de Estado.

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Áñez era a segunda vice-presidente do Senado LUSA/STRINGER

A senadora Jeanine Áñez, de 52 anos, uma forte opositora do antigo Presidente Evo Morales, assumiu a presidência interina da Bolívia na noite de terça-feira, apesar da falta de quórum no Congresso. Os deputados do Movimento para o Socialismo, de Morales, boicotaram o acto e o ex-presidente acusou a sua rival de ser “uma senadora golpista de direita”.

Eleita pelo partido conservador Movimento Social Democrático, Jeanine Áñez era a segunda vice-presidente do Senado. Apresentou-se como a próxima na linha de sucessão do Presidente após a demissão de Morales, no domingo, do vice-presidente do país e dos restantes líderes do Senado e da Câmara dos Deputados.

A declaração de Áñez como Presidente interina da Bolívia foi feita sem a presença dos deputados do partido de Evo Morales e foi apoiada pelo Tribunal Constitucional do país.

No discurso de tomada de posse, Jeanine Áñez disse que a Bolívia não podia ficar sem liderança e prometeu marcar eleições o mais rapidamente possível. “Perante a ausência definitiva do Presidente e do vice-presidente, e na qualidade de presidente da Câmara de Senadores, assumi imediatamente a Presidência tal como está previsto na Constituição”, disse Áñez, muito aplaudida pelos deputados da oposição.

Esta quarta-feira, nas suas primeiras horas no cargo, reuniu com as chefias das Forças Armadas e da polícia, que apoiam esta solução de sucessão temporária, assim como o Tribunal Constitucional e a Igreja Católica. 

Diputados e senadores do Movimento para o Socialismo anunciaram que vão abrir uma batalha no parlamento e nos tribunais para provar a “ilegalidade” de Áñez. Na capital, La Paz, e noutras cidades do país, os apoiantes de Morales organizavam manifestações contra a Presidente interina, cuja fragilidade política levou o Presidente argentino Mauricio Macri, cujo mandato está a terminar, a optar por não a reconhecer como chefe de Estado da Bolívia. “Por enquanto, vamos avaliar o estatuto da senadora”, disse uma fonte da presidência ao diário Clarín.

"Golpe manhoso"

A partir do México, Evo Morales condenou os acontecimentos que levaram à sua demissão e à proclamação de Jeanine Áñez e descreveu-os como “o golpe mais manhoso e nefasto da História”.

“Esta proclamação atenta contra os artigos 161, 169 e 410 da Constituição, que determinam a aprovação ou reprovação de uma renúncia presidencial, a sucessão constitucional nas presidências do Senado e da Câmara dos Deputados e a supremacia da Constituição”, disse Morales no Twitter. “A Bolívia está a ser alvo de um assalto ao poder do povo”, declarou.

Morales aceitou a oferta de asilo político no México, onde chegou na terça-feira. “Enquanto for vivo, farei política. A luta continua. Todas as pessoas do mundo têm direito a libertar-se da discriminação e da humilhação”, disse Morales.

Primeiro Presidente boliviano da comunidade indígena, Evo Morales foi eleito em 2006 e recebeu elogios pelas suas políticas de combate à pobreza no país. Mas foi criticado pelas suas tentativas de abolir o limite de mandatos presidenciais.

Com a Constituição de 2009, o número de mandatos consecutivos na Presidência da Bolívia foi limitado a dois. Em 2016, Morales e o seu partido levaram a referendo uma proposta para abolir esse limite, que foi chumbada com 51,3% dos votos contra 48,7%. Mas, em 2017, o Supremo Tribunal de Justiça boliviano decidiu a favor do fim da limitação de mandatos, o que permitiu a Evo Morales candidatar-se pela quarta vez nas eleições de Outubro deste ano.

A crise política no país agravou-se durante a contagem dos votos, quando os resultados iniciais pareciam indicar que Evo Morales teria de ir a uma segunda volta com o seu principal adversário, Carlos Mesa. Depois de uma interrupção na contagem, Morales foi declarado vencedor à primeira volta.

Com a contestação a subir nas ruas do país, e a Organização dos Estados Americanos a declarar que houve “manipulação clara” nas eleições de Outubro, Evo Morales (cujo mandato terminaria em Janeiro) concordou em repetir o acto eleitoral. Mas o seu principal rival disse que Morales não deveria voltar a candidatar-se.

Os protestos culminaram com uma declaração do chefe das Forças Armadas, o general Williams Kaliman, que exigiu o afastamento de Morales da presidência, o que aconteceu no domingo.

Na sua declaração de renúncia, Evo Morales disse que saía para “evitar o derramamento de sangue” e denunciou a perseguição contra os líderes do seu partido. Chegou ao México na terça-feira, um dia depois de o Governo mexicano lhe ter aberto as portas para o asilo político.

Sete mortos e 384 feridos 

A violência pós-eleitoral na Bolívia fez pelo menos sete mortos, disse esta quarta-feira o procurador-geral do país, num novo balanço.

Duas pessoas morreram em La Paz, duas em Santa Cruz e três em confrontos em Cochabamba, disse Juan Lanchipa. Quatro das vítimas foram baleadas.

O anterior balanço apontava para três mortes em resultado da onda de violência que surgiu após a reeleição de Morales, a 20 de Outubro.

Os confrontos entre apoiantes e opositores do antigo Presidente da Bolívia causaram ainda pelo menos 384 feridos.

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