Espanha: a hora dos pactos

Sánchez e Casado precisarão de alguns dias para digerir um resultado eleitoral que os coloca como responsáveis exclusivos pelo amanhã da Espanha.

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Crises em cadeia: no momento em que a Espanha se confronta com uma crise sem precedentes do seu modelo territorial – o Estado autonómico –, explode uma crise de representação. O sistema partidário está bloqueado. Deixou de funcionar e é impossível investir um governo “como dantes”. Convocar “terceiras eleições” – num país que acusa os políticos de serem responsáveis pela ingovernabilidade – ­seria uma alternativa suicidária.

O PSOE e o PP estão desde hoje colocados perante o cenário que mais detestam: a grande coligação. Foi formalmente recusada por Pedro Sánchez e Pablo Casado. Este invocou um poderoso argumento: deixaria a oposição nas mãos do Vox de Santiago Abascal, e do Unidas Podemos, de Pablo Iglesias. O resultado eleitoral inviabiliza também o esquema das “maiorias de geometria variável”, em que um governo minoritário faz alianças flutuantes.

A Espanha é a única democracia europeia que nunca experimentou governos de coligação ao nível nacional. Há uma longa cultura de coligações mas apenas a nível regional. Sánchez e Casado ficam com o menino nos braços. A partir de hoje, ou dentro de uma semana, gostem ou não, vão ter de se sentar a uma mesa e repetir a pergunta de Lenine: “Que fazer?”

A “grande coligação” é sem dúvida mais adaptada à cultura política alemã e pode a prazo ter efeitos perversos, como explicou Casado. Em Portugal, o “bloco central” deixou má fama embora tenha sido inevitável. Que mais beneficiará o Vox? Um governo do “sistema” ou a ingovernabilidade da Espanha?

A “grande coligação” pode ser a mais esdrúxula solução para a cultura partidária espanhola, com os partidos bem arrumados em blocos ideológicos. Que alternativa têm Sánchez e Casado para garantir um governo com um mínimo de estabilidade? Lembre-se que a ideia de “grande coligação” foi avançada por Mariano Rajoy em 2016.

Não interessa se a solução vai desembocar numa coligação formal ou se optarão por um acordo “à sueca” entre sociais-democratas e conservadores, em que um governa em minoria e outro faz oposição, mas na base de um acordo que garante a aprovação dos orçamentos e algumas metas básicas. Na Espanha, não há solução para a Catalunha sem entendimento entre PSOE e PP.

A revolta catalã

 “A revolta catalã e o ‘Brexit’ são duas situações que geram entre os cidadãos uma sensação de temor e até de medo”, explicou há dias o politólogo Fernando Vallespín. A resistência aos pactos é um problema espanhol ou um problema dos partidos espanhóis? É um problema dos partidos.

Prosseguia Vallespín: “Estamos a ver que o ‘Brexit’ pode ser uma história interminável. E não se tinha pensado na dimensão violenta da revolta catalã. A revolta catalã está a converter-se, pouco a pouco, numa revolta que, longe de encontrar uma resposta pensada e racional, bem meditada pelos eleitores, encontra uma resposta profundamente emocional.” A quem beneficia a resposta emocional e o confronto entre o nacionalismo independentista e o despertar do nacionalismo espanhol? Fundamentalmente, beneficia o Vox.

Sánchez e Casado precisarão de alguns dias para digerir um resultado eleitoral que os coloca como responsáveis exclusivos pelo amanhã da Espanha. Chegou a hora dos pactos.

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