Investir na ferrovia, garantir o crescimento do turismo

Na impossibilidade de o investimento ser público, porque não considerar a possibilidade, com toda a clareza e transparência, das concessões?

As últimas décadas foram marcadas pelo desinvestimento na ferrovia, o que nos conduziu invariavelmente a uma infraestrutura ferroviária e material circulante obsoletos, recursos humanos insuficientes e uma fraca capacidade de resposta às necessidades da população, com particular incidência nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, bem como na região do Algarve. Infelizmente, os problemas da rede ferroviária nacional não se circunscrevem aos residentes. O turismo também é vítima desta oferta deficiente e desajustada de ligações, que limita e muito a mobilidade entre destinos.

Tomando como exemplo a ligação Lisboa/Porto, que também serve Coimbra e Aveiro, dois importantes polos turísticos do país. A realidade desta ligação é conhecida: uma infraestrutura a necessitar de modernização, material circulante insuficiente, com décadas de idade, e a necessitar de manutenção, o que nos conduz a uma operação com grande potencial de rentabilidade mas impossível de escalar. Basta lembrar os constrangimentos do verão passado, quando se verificaram várias supressões de comboios por avaria no ar condicionado.

O investimento na sua modernização e no aumento da capacidade de oferta teriam certamente um impacto significativo na mobilidade interna, permitindo que os turistas que chegam a Lisboa ou ao Porto possam visitar Coimbra ou Aveiro no espaço de um dia, desconcentrando os fluxos nas principais cidades e motivando um prolongamento da estada.

Outro exemplo importante é o da Área Metropolitana de Lisboa, cujas linhas de Cascais, Sintra e Oeste há muito que deixaram de responder às necessidades da procura. Apostar nestas ligações permitiria aos visitantes da capital aceder a toda a oferta turística do norte e oeste da região de Lisboa e às cidades da região centro servidas pela linha do Oeste.

Um investimento sério nesta área resultaria num aumento significativo da qualidade de vida das populações, num modelo de mobilidade que ajudaria a combater a crise de habitação na capital e na redistribuição de fluxos turísticos por novas regiões, agora só acessíveis através de excursões organizadas ou de transporte rodoviário público pesado e privado ligeiro com custos económicos e ambientais acrescidos.

Impõe-se, neste caso, mais ambição e menos constrangimentos mentais ou ideológicos. Na impossibilidade de o investimento ser público, porque não considerar a possibilidade, com toda a clareza e transparência, das concessões? Os problemas estão identificados, estudados, revistos. Se o Estado não tem capacidade para resolvê-los, há que abrir esta discussão para encontrar soluções que sirvam a população e os turistas.

O último exemplo que aqui deixo é o do Algarve, uma das mais importantes regiões turísticas do país, cuja deficiente rede ferroviária (e rodoviária) resulta numa excessiva utilização de ligeiros e pesados privados para conduzir os visitantes aos seus alojamentos, com evidentes prejuízos para o ambiente. Acresce o facto de o turista ficar ‘preso’ ao seu local de destino por falta de oferta de transporte público.

Considerando apenas os exemplos dados, falamos em milhões de cidadãos nacionais e de milhões de turistas, cuja qualidade de vida e experiência do território seriam significativamente melhoradas com uma mobilidade mais eficiente. Sem falar da questão ambiental, sobretudo num momento crítico em que importa encontrar soluções urgentes para a redução do aquecimento global reduzindo ao mínimo as emissões de CO2. A falta de resposta aos problemas da ferrovia em Portugal fragiliza os portugueses e fragiliza o crescimento, a sustentabilidade e a competitividade do turismo nacional. Razões mais do que suficientes para agir. Sem mais demoras.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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