Demolida uma das três últimas moradias emblemáticas da praia da Rocha

Câmara de Portimão vai suspender o PDM para evitar a machadada final na imagem clássica da praia da Rocha. As moradias deram lugar a blocos de dez pisos.

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Filipe da Palma
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Filipa da Palma

Os blocos de apartamentos tomaram conta da frente de mar da praia da Rocha e a força das urbanizações soma e segue formando uma barreira de betão na frente de mar. No início da semana começou a ser demolida uma das três últimas moradias que fizeram história nesta zona turística. A casa, com 14 quartos, sobre uma arriba, pertenceu ao Conde da Covilhã. O novo edifício, com quase 1200 metros quadrados de área, está ser alvo de grande contestação. Nas redes sociais, a população manifestou a sua indignação mas a obra, ao que tudo indica, é para continuar.

A vivenda “Compostela”, localizada ao lado do hotel Algarve, não está abrangida por qualquer tipo de protecção. O mesmo sucede com as outras duas vivendas, exemplares da época de 60. Uma, que fica junto à Fortaleza, pertence à família Lopo Tavares e é usada como casa de férias. A outra, chamada “Casa da Rocha” e que está situada junto do Buraco da Avó, pertence à família Leal de Oliveira e funciona como restaurante. A pintora Margarida Tengarrinha, que viveu os primeiros anos da juventude nesta estância turística, recorda: “Depois do 25 de Abril, quando aqui regressei, tive um choque - a praia da Rocha estava irreconhecível”. As moradias tombaram para dar lugar a blocos de apartamentos. A vivenda da família Feu, por exemplo, deu lugar a um edifício de dez pisos, onde mora a artista plástica.

Quando o turismo se virou para o Algarve, a praia da Rocha foi um dos destinos das elites. “Tínhamos aqui a nossa Biarritz”, invoca Margarida Tengarrinha, ex-dirigente do PCP. “Fui eu que ensinei o Lopinho [Lopo Tavares] a dançar nas matinées do casino”, que já desapareceu.

As moradias, construídas nessa época, pertenciam aos industriais das conservas ou grandes proprietários rurais. A vivenda “Compostela” foi vendida, nos anos 70, por 30 mil contos. “Um apartamento nessa altura custava 320 a 400 contos”, recorda Maria do Carmo, que se estabeleceu na praia da Rocha há 50 anos, vinda de Monchique.

Durante a tarde desta quarta-feira, a vivenda tornou-se a atracção dos populares pelo facto de as obras de demolição terem parado. Porém, o interregno, explica Maria do Carmo, que tem um estabelecimento ali perto, deve-se ao facto da câmara ir suspender o Plano Director Municipal (PDM). “O que eles [empreiteiros] me disseram é que os trabalhos vão ser retomadas amanhã [quinta-feira] ou depois.”

A presidente da Câmara, Isilda Gomes, adiantou ao PÚBLICO que vai mandar suspender o PDM “para evitar que situações semelhantes a esta se repitam”. A proposta vai a reunião do executivo na próxima semana. “Temos várias razões para tomar esta decisão”, sublinhou.

À entrada do portão que dá acesso ao jardim, coberto de palmeiras, uma placa da câmara de Portimão dá conta que o alvará para a construção dos novos edifícios com uma área de 1196,94 m2, foi emitido a 19 de Dezembro de 2016.

O processo deste complexo teve início em 2011 e foi aprovado antes das autárquicas de 2013. A propriedade pertence a Armando Faria (empresário ligado à industria da perfumaria). O arquitecto que assina o projecto é Luís Brito, que é o presidente do PS da junta de freguesia de Ferragudo, concelho de Lagoa.

O complexo habitacional, formado por duas unidades, já tem uma parte construída. A segunda abrange a moradia que está ser demolida.

“Não podemos voltar para trás, mandar parar o progresso”, diz Maria do Carmo, destacando a importância deste “grande centro turístico”. Por seu lado, Margarida Tengarrinha observa: “A qualidade da praia, de água quentinha, mantém-se, o resto foi a transformação total”. Na opinião da artística plástica, “a praia da Rocha teve dois períodos de declínio urbanístico: o primeiro aconteceu nos anos 60, o outro foi com o arquitecto Martim Garcias [socialista] na presidência da câmara”.

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