Lisboa e Porto recebem manifestações contra chumbo de salvamentos no Mediterrâneo

As manifestações pacíficas estão marcadas para a mesma hora, nas duas cidades. O protesto é organizado pela plataforma Human Before Borders que afasta partidarismos.

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Segundo dados da Organização Internacional das Migrações, mais de 15 mil perderam a vida a tentar chegar à Europa através do Mediterrâneo LUSA/JOSE SENA GOULAO

Salvar vidas no Mediterrâneo “não é uma questão partidária, é humanitária”. Essa é a principal mensagem que a associação portuguesa Human Before Borders quer deixar clara nas duas manifestações pacíficas que está a organizar “em resposta à incapacidade do Parlamento Europeu em aprovar uma resolução que permita respostas de busca e salvamento alargadas no Mediterrâneo”.

Em causa está o chumbo das quatro propostas de resolução sobre operações de busca e salvamento no Mediterrâneo de refugiados e migrantes que tentam chegar à Europa. Os encontros estão marcados para esta sexta-feira, 8 de Novembro, ambos às 18h. No Porto, o ponto de encontro é na Avenida dos Aliados. Já em Lisboa, a demonstração acontece na Praça do Rossio.

Depois de o chumbo das propostas ter gerado uma onda de críticas nas redes sociais, a Human Before Borders (uma plataforma de sensibilização e acção contra o tratamento desumano e ilegal de migrantes e refugiados) quer levar a mensagem para as ruas. Mas mais do que trocar acusações partidárias, a associação quer garantir que a mensagem que chega aos eurodeputados é de apelo à união do Parlamento Europeu para a aprovação de uma resposta que reduza o número de mortes no Mediterrâneo, explica ao PÚBLICO Raul Manarte, um dos membros da associação. Tal como Miguel Duarte — o português acusado pelo pelo Ministério Público italiano de auxílio à imigração ilegal —, também Manarte já esteve no terreno em missões de salvamento de refugiados.

Há algumas pessoas que levam a discussão mais para o espectro partidário. O nosso foco não é de todo esse”, ressalva o membro da plataforma, que se prefere afastar da polarização política. “Não é o nosso objectivo criticar um determinado espectro partidário”, conclui.

Para o representante da Human Before Borders, “toda a sociedade civil, de todas as cores partidárias, sentiu uma frustração e revolta por o Parlamento Europeu não ter chegado a acordo em nenhuma proposta”. Apesar da troca de acusações entre os partidos, “há um terreno comum”, acredita. “A gigantesca maioria das pessoas quer salvar a vida das pessoas no Mediterrâneo​.”

“O nosso objectivo é muito simples: queremos sensibilizar o Parlamento Europeu para que haja uma proposta de resolução” que seja aprovada pelos eurodeputados, explica. À associação portuguesa juntam-se ainda outros parceiros nos quais se incluem a AMI, Abraço, SOS Racismo, APi, Youth for Human Rights International e a SPEAK.

O que diziam as propostas

A resolução original levada à votação foi proposta pela Libe [acrónimo da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos] e chumbada por uma diferença de dois votos. Esta proposta deu origem a outras três propostas de resolução de três bancadas do Parlamento Europeu. Partido Popular Europeu (PPE), Reformistas e Conservadores Europeus (ECR) e grupo da Identidade e Democracia (ID) apresentaram propostas próprias, nas quais retiraram muitos dos pontos do texto original da Libe ou “enfraqueceram” o que nesta era defendido. As propostas incluíam ainda a distribuição dos pedidos de asilo dos migrantes socorridos. Todas elas foram chumbadas.

A proposta da Libe chumbou com 290 votos contra, 288 a favor e 36 abstenções - precisaria de mais três votos para passar. Entre os 20 eurodeputados portugueses presentes houve apenas três votos contra e uma abstenção. E um dos votos contra, o da social-democrata Graça Carvalho, chegou a ser corrigido para “a favor”, mas já sem efeitos práticos na contagem final. O eurodeputado do PAN e todos os eleitos de esquerda portugueses — salvo o bloquista José Gusmão, ausente por doença de familiar — votaram a favor da proposta da Libe. José Manuel Fernandes, do PSD, absteve-se. Contra — além de Graça Carvalho — votaram então Álvaro Amaro (PSD) e Nuno Melo (CDS-PP). 

 as votações das restantes resoluções (dos grupos ECR, PPE e ID) não constam na acta do plenário porque não tiveram votação nominal (electrónica) e por isso não é possível consultá-las, uma vez que a votação nominal não foi requerida. 

A proposta da Libe insistia na “obrigação decorrente do Direito Internacional do Mar de prestar assistência a pessoas em perigo” e pedia aos Estados-membros que reforçassem “as operações de busca e salvamento proactivas”. A resolução defendida pelo PPE, a mais semelhante à proposta da Libe, não incluia o reforço das operações de busca proactiva, apesar de pedir a intensificação do “esforços de apoio às operações de busca e salvamento no Mediterrâneo”. 

a proposta do ECR ressalvava que, “ao abrigo da legislação da UE relativa ao auxílio à migração clandestina”, os Estados-membros teriam o direito de “avaliar, caso a caso, se a operação de busca e salvamento realizada por navios privados” se limitava a prestar “ajuda humanitária” e sublinhava que “a única forma de reduzir as mortes no mar consiste em impedir novas viagens perigosas”. Ao mesmo tempo, a assumia que os países teriam “todo o direito de aplicar a legislação nacional” no momento de “autorizar ou não a entrada de navios de ONG”.

A proposta da ID tinha dez pontos entre os quais se destacava a autorização aos Estados-membros para a “reintrodução de fronteiras internas se necessário”. “Os capitães e as tripulações de navios das ONG devem abster-se de facilitar a introdução clandestina de migrantes sob a fachada de actividades de busca e salvamento, uma vez que se trata de uma infracção penal”, lia-se na proposta que exortava a Comissão a “acompanhar e investigar as actividades de busca e salvamento das ONG operacionais no Mediterrâneo”.

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