Mobilidade – o nosso modo de vida

Há uma reflexão que se impõe: o que é e o que será no futuro o nosso modo de vida e de que precisa ser protegido?

A construção de um bom título requer jeito e alguma inspiração. Ursula Von der Leyen pode vir a revelar-se inspiradora no exercício do seu cargo de presidente da Comissão Europeia, mas a ideia de atribuir títulos elaborados aos portfólios dos diferentes comissários revelou-se particularmente infeliz.

O caso mais flagrante reside na pasta da Administração Interna e Migrações, agora acrescentada com a designação “proteção do nosso modo de vida”.

Em política, as palavras ganham significado dentro do contexto e, neste caso, há uma lamentável mistura com a terminologia da extrema direita em matéria de migrações, consubstanciando uma negação dos próprios valores da UE.

Lamentavelmente, o Parlamento Europeu, dominado por uma maioria de direita, apesar de toda a crítica, não conseguiu mudar esta designação, diante de uma presidente da Comissão renitente e bastante dependente dos apoios que a alcandoraram a este posto.

Há uma reflexão que se impõe. O que é e o que será no futuro o nosso modo de vida e de que precisa ser protegido?

A European Broadcasting Union, em parceria com diversos canais televisivos de seis países árabes e 12 países europeus, apresentou, recentemente, um inquérito aos jovens entre os 18 e os 35 anos – Generation What 2019 – o qual nos dá algumas respostas interessantes sobre o nosso futuro coletivo, sobre o modo como as novas gerações olham as suas sociedades e sobre aquilo que parece definir o modo de vida dessas gerações.

Das muitas matérias abordadas, ressalta a falta de confiança dos jovens europeus e árabes nas instituições: 87% não confiam nas instituições políticas, 73% não confiam nos sindicatos, 90% não confiam na comunicação social, 76% não confiam no sistema judicial, 67% não confiam no sistema educativo.

A baixa expectativa nas instituições contrasta largamente com a confiança destes jovens neles próprios – 65% dos jovens europeus e 57% dos jovens dos países árabes sentem-se donos do seu destino e do controle das suas vidas.

Num momento em que surgem protestos de rua um pouco por todo o lado, estes dados devem fazer-nos pensar sobre o crescente afastamento dos jovens em relação à política e às instituições. E na importância de passar das palavras de circunstância que acompanham as sucessivas catarses pós-eleitorais a uma efetiva mudança na forma de funcionamento das organizações, procurando entender e ir ao encontro daquilo que são os medos, preocupações, dificuldades, expectativas e necessidades dos jovens.

Na verdade, de um e de outro lado do Mediterrâneo – das preocupações com a igualdade de género, ao respeito pelos valores da democracia, como a liberdade de expressão, a denúncia das violações de Direitos Humanos, a rejeição e o combate ao terrorismo (90% dos jovens árabes consideram-no contrário à justiça humana) –, é, afinal, muito mais o que nos une que o que nos separa.

Contudo, o que para mim ressalta como muito significativo neste estudo é o número significativo dos jovens que afirma poderem viver felizes no estrangeiro (79% dos jovens europeus e 84% dos árabes). Um em cada dois jovens árabes afirmam sentir-se mais cidadãos do mundo do que de um país ou região. Entre os jovens europeus são 73% os que dizem sentir-se assim e 72% não consegue imaginar o seu país a sair da União Europeia, sendo que 53% associam a Europa à ideia de mobilidade em matéria de trabalho, viagens e estudo.

De um e de outro lado do Mediterrâneo a mobilidade tornou-se um fator comum e definidor do nosso modo de vida. Formando verdadeiros cidadãos do mundo.

A verdade é que, e em conclusão, num mundo globalizado, as fronteiras e as divisões são aquilo que menos importa defender.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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