Partidos que apoiam Presidente guineense desafiam comunidade internacional

A ONU pediu a José Mário Vaz e a Aristides Gomes que resolvam as suas diferenças, mas o chefe de Estado continua a desafiar a comunidade internacional e os partidos que o apoiam acusam a CEDEAO de “comportamento autoritário e prepotente”.

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A ministra dos Negócios Estrangeiros guineense, Suzi Barbosa, com o seu homólogo português, Augusto Santos Silva, já depois de exonerado o Governo da Guiné-Bissau ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

O Conselho de Segurança das Nações Unidas pediu, esta segunda-feira, ao Presidente e ao primeiro-ministro da Guiné-Bissau que resolvam as suas diferenças e cheguem a um acordo para superar a nova crise política que deixou o país com dois governos a menos de um mês das eleições presidenciais, marcadas para o dia 24 de Novembro.

“O Conselho de Segurança expressa profunda preocupação pela situação social e política na Guiné-Bissau e apela ao Presidente José Mário Vaz e ao Governo liderado pelo primeiro-ministro Aristides Gomes, encarregado de conduzir o processo eleitoral, a resolver as suas diferenças num espírito de respeito e cooperação”, afirmou a presidente do conselho de segurança, a inglesa Karen Pierce.

O órgão da ONU adoptou uma declaração sobre a situação na Guiné-Bissau a condenar a violência recente que “resultou na morte de um civil e saúda a decisão do Governo de abrir uma investigação independente sobre o assunto”.

No entanto, a pressão da comunidade internacional, nomeadamente da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) – que tem tentado mediar o conflito político na Guiné-Bissau, ao mesmo tempo que procura garantir que a campanha eleitoral se desenrole da forma mais ordeira possível – não está a dar resultados, antes pelo contrário.

Tanto o chefe de Estado, como os partidos que o apoiam, adoptaram um tom desafiante em relação à pressão internacional. Depois de JOMAV, como é conhecido o Presidente, ter dito no domingo que a decisão de exonerar o Governo é irreversível”, Madem G-15, PRS e APU-PDGB – os partidos que apoiam o Executivo não reconhecido de Faustino Imbali – recorreram a uma linguagem dura em relação à CEDEAO, que enviou uma delegação à capital guineense este fim-de-semana.

Em comunicado, os três partidos acusam a delegação ministerial da CEDEAO de “comportamento autoritário e prepotente” pela sua “atitude de parcialidade e de desrespeito aos partidos com assento parlamentar, cujas legitimidades foram outorgadas pelo povo, através das eleições”. A nova maioria parlamentar responsabiliza a CEDEAO “pelas consequências da sua mediação, caracterizada pela ligeireza, falta de objectividade, parcialidade e desrespeito ao chefe de Estado e demais actores políticos”. A delegação ministerial cancelou os encontros que tinha agendado com os partidos.

Nabian no centro da crise

Mantido em funções por acordo com a CEDEAO, depois de o seu mandato ter expirado em Junho, o Presidente guineense e candidato à reeleição resolveu repetir a menos de um mês das eleições a rotina que marcou os seus cinco anos de permanente crise política à frente do país: mudar o Governo.

No centro da nova crise está Nuno Nabian, líder da Assembleia do Povo Unido-Partido Democrático da Guiné-Bissau e um dos 12 candidatos à presidência, que tinha estabelecido, depois das eleições de 10 de Abril, um acordo de incidência parlamentar com o PAIGC. Ao mudar de lado, levou consigo os cinco deputados que davam maioria ao Governo de Aristides Gomes. É com base nessa nova maioria parlamentar que José Mário Vaz agiu para se livrar de um Governo e de um primeiro-ministro que só aceitou por imposição internacional.

O chefe de Estado acordara no final de Junho dar posse ao executivo, ficar com poderes limitados e “sem interferência na governação”, como contrapartida para se manter no cargo para além do seu mandato, que findou a 23 de Junho.

Cinco meses depois, Vaz não resistiu a voltar atrás e exonerar mais um executivo, recorrendo outra vez ao Madem-G15, o partido que patrocinou a partir de uma dissidência do PAIGC que ele próprio instigou e deu origem a um mandato presidencial de estagnação económica, retrocesso social, em permanente crise política e institucional.

Com esta recente manobra, o chefe de Estado parece cumprir as palavras premonitórias do ex-presidente nigeriano e mediador da CEDEAO para a crise política guineense, Olusegun Obasanjo que, em Junho, afirmava que Vaz poderia se estar a preparar para ficar no poder mesmo perdendo as eleições de 24 de Novembro. Será a exoneração de Gomes e do seu Governo e a posse dada na quinta-feira a outro executivo liderado por Imbali a forma que JOMAV encontrou para conseguir um segundo mandato por portas travessas?

A comunidade internacional não parece disposta a aceitar e a CEDEAO já convocou uma cimeira extraordinária para o próximo sábado, em Niamey, no Níger, para analisar a situação em Bissau.

Além da CEDEAO e da ONU, também a União Africana, a União Europeia e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa condenaram a decisão de José Mário Vaz, reconhecendo o Governo de Aristides Gomes como o único legítimo representante político do país.

Na sexta-feira, quando o Executivo já tinha sido exonerado, o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, recebia em Lisboa, a sua homóloga guineense, Suzi Barbosa, enfatizando que “Portugal reconhece o Governo da Guiné-Bissau que se encontra em funções, aquele cujo primeiro-ministro é o dr. Aristides Gomes, que foi indigitado nos termos constitucionais pelo Presidente da República e que vê o seu programa aprovado na Assembleia da República”.

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