Almada cria observatório e centro de investigação para “passar à prática” nas alterações climáticas

Costa da Caparica, zona da Área Metropolitana de Lisboa mais afectada pela subida do mar, vai ter câmara de vigilância no topo de hotel de oito andares para vigiar em permanência os galgamentos.

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jfc joao cordeiro

Almada, o concelho apontado pelo Plano de Combate às Alterações Climáticas na Área Metropolitana de Lisboa como o mais afectado pela prevista subida do mar nos próximos anos, vai criar um observatório e um centro de estudos de avaliação de riscos costeiros, para “passar à prática” na adaptação que os cientistas apontam como cada vez mais urgente.

O Observatório de Avaliação de Riscos Costeiros e um Centro de Estudos de Avaliação e Gestão de Risco Ambiental e Protecção Civil, em comunidades costeiras foram formalmente criados nesta quarta-feira por acordo entre a Câmara Municipal de Almada, a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-UNL), o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e o TRYP Lisboa Caparica Mar Hotel.

Na prática vai ser instalada uma câmara de vigilância no topo do hotel de oito andares, na primeira linha de praia da Costa da Caparica para monitorizar em permanência os comportamentos do mar naquela zona de costa e permitir assim aos investigadores do centro de estudo, da FCT e do LNEC, avaliarem os galgamentos e respectivos impactes em terra.

Os responsáveis, tanto da autarquia como da universidade, dizem que a iniciativa é o início do trabalho prático de combate às alterações climáticas.

“A gestão do risco vai ter de passar dos 1001 estudos à acção e com isto estamos a passar à prática”, disse ao PÚBLICO o responsável técnico do projecto. José Carlos Ferreira, professor da FCT, acrescenta que o Plano de Combate às Alterações Climáticas na Área Metropolitana de Lisboa “confirma” que Almada é mesmo o concelho desta região mais afectado pelas alterações que se esperam no clima. As conclusões do estudo, que vão ser apresentadas no próximo dia 6, apontam, por exemplo, que a Cova do Vapor vai ficar submersa com a subida de dois metros no nível do mar nos próximos 70 anos.

“O ano de 2100 é já amanhã e é inevitável, do ponto de vista técnico, que a Cova do Vapor tem de recuar”, afirma o investigador. Recuar significa que a ocupação humana daquela zona de costa, em construções e infra-estruturas, tem de passar para uma área mais interior.

Estas medidas de ordenamento do território estão a ser estudadas pelo município de Almada, que pretende acolher “todas as orientações” do recente Plano de Ordenamento da Orla (POOC) Costeira, disse ao PÚBLICO a vereadora da Protecção Civil Municipal.

“O POOC, para a Costa da Caparica, dá orientações para o recuo de algumas estruturas existentes no território, como, por exemplo, as frentes de praia e esse processo está em preparação no município”, refere Francisca Parreira. A autarca acrescenta que já foi criada uma “equipa multidisciplinar” e que as soluções a adoptar serão encontradas em diálogo “com todos os interlocutores”, designadamente os concessionários de praias e estabelecimentos e comunidade envolvente. Outra aposta da autarquia é a sensibilização e esclarecimento da população para os riscos. “Na zona da fonte da Telha, onde é prevista a subida do mar, queremos informar a população, por exemplo os residentes que têm caves, para os riscos que correm”.

O novo observatório vai servir precisamente para ajudar os cientistas a perceberem melhor os galgamentos e os respectivos efeitos.

“Vamos usar a informação recolhida para avaliar os riscos, mas também as estratégias que podem ser adoptadas para prevenir e reduzir esses riscos”, diz o coordenador técnico. Os dados recolhidos pela monitorização permanente do mar da Costa serão trabalhados, no centro de estudos, por investigadores da FCT, do LNEC e pela Protecção Civil.   

A responsável técnica neste projecto por parte do LNEC, engenheira Conceição Fortes, precisa que a função do laboratório nestes estudos é avaliar os galgamentos e as inundações na zona, fazer a previsão da agitação marítima e avaliar os riscos associados.

Tanto a autarca como os técnicos envolvidos sublinham que já há medidas tomadas para prevenir ou minimizar os riscos decorrentes das alterações climáticas. A mais visível é o enchimento das praias da Costa da Caparica, que voltou a ser feito recentemente. “As pessoas não têm bem ideia, mas essas toneladas de terra servem para reduzir a força dos galgamentos, que são cada vez mais frequentes e mais altos e o mar está a ficar mais agressivo”, explica José Carlos Ferreira.

A Câmara de Almada diz ainda que a parceria de cooperação com o LNEC e a FCT “justifica-se” porque o concelho possui uma extensa zona costeira, com 16 quilómetros de litoral oceânico e 28 quilómetros de litoral no estuário do Tejo, e que do trabalho desenvolvido pelo novo observatório deve sair “um conjunto de projectos a serem desenvolvidos no âmbito de candidaturas a fundos de investigação nacionais e europeus”.

A assinatura do protocolo de cooperação juntou nesta quarta-feira na Costa da Caparica o director da FCT-UNL, Virgílio Machado, e do presidente do LNEC, Carlos Pita. Ambos os responsáveis apontaram a oportunidade do novo projecto em Almada, face à urgência de actuação contra as alterações climáticas.

“Todos sentimos que alguma coisa está a acontecer na área das alterações climáticas”, disse o director da faculdade, considerando que o novo observatório vai “recolher informação importante para os cientistas”.

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