A geração “Evo” pode obrigar o Presidente a uma segunda volta

A Bolívia decide neste domingo se reelege Evo Morales. Tudo depende dos 2,5 milhões de bolivianos que viveram a adolescência e a vida adulta com um único Presidente.

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Evo Morales Reuters
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Reynaldo Kantuta não vai votar em Evo Morales este Domingo Reuters/DAVID MERCADO

Reynaldo Kantuta, um programador de 27 anos, representa de muitas formas as mudanças sociais na Bolívia desde que Evo Morales, o primeiro Presidente indígena do país, chegou ao poder em 2006. Há uma década, não havia tanta facilidade em subir na hierarquia social.

O pai de Kantuta, um índio Aimará, tinha apenas 15 anos quando se mudou de uma vila nos Andes, atingida por um período de seca extrema, para a capital. A viagem obrigou-o a comer cascas de banana para sobreviver, mas quando chegou à cidade de La Paz foi sempre alvo de discriminação.

Hoje, graças a novas bolsas de estudo concedidas pelo Estado para estudantes universitários e a melhores condições para a população que não é branca, a vida de Kantuta melhorou em relação à do pai. Está empregado, fala inglês, toca guitarra e espera um dia começar o seu próprio negócio.

Mas Kantuta não tem planos de votar para reeleger Evo Morales, há 14 anos no poder, nas eleições presidenciais marcadas para domingo.

Morales não provocou mudanças suficientes, defende Kantuta. A mãe do programador morreu de um cancro cujo tratamento a família não conseguia pagar. E quando se tentou candidatar a um emprego no sector público, era-lhe sempre pedido dinheiro, subornos, para chegar aos cargos. Agora, ao ler sobre a economia do país, este homem de 27 anos preocupa-se que o futuro da Bolívia inclua crises semelhantes às que atingiram a Venezuela e a Argentina.

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Reynaldo Kantuta diz que Morales não fez o suficiente Reuters

“O que ele quer é poder, não é o bem-estar do país”, diz Kantuta sobre o Presidente. “Evo Morales só tende a ajudar aqueles que o apoiam”.

As hipóteses de Evo Morales assegurar um quarto mandato consecutivo dependem em grande parte de eleitores como Kantuta, um dos 2,5 milhões de bolivianos com 30 anos ou menos que viveram a adolescência e a vida adulta com um único líder – é o equivalente a mais de um terço do eleitorado.

Esta “geração Evo” é prova do longo mandato de Morales. Em 2019, é o Presidente que soma mais anos consecutivos no poder na América Latina. Se ganhar, a controlo do país pode-se estender até duas décadas. Mas o facto de estar sequer na corrida é controverso: em Fevereiro, o Presidente perdeu o referendo sobre a possibilidade de se recandidatar a um quarto mandato, mas recorreu ao Tribunal Constitucional que lhe deu luz verde para se candidatar.

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Morales é o presidente da América Latina com um mandato mais longo Reuters

Uma sondagem feita em Agosto, mostra que o apoio de Morales é mais fraco junto dos eleitores mais jovens, uma prova da pressão crescente contra o Presidente. Vários estudos de opinião sugerem, no entanto, que continua à frente do principal candidato rival Carlos Mesa – mas pode ser obrigado, pela primeira vez, a ser submetido a uma segunda ronda de votos se não conseguir a maioria.

Evo “em todo o lado”

Para outros jovens bolivianos, porém, é difícil imaginar uma vida sem Evo Morales. Muitos cresceram durante um período raro de estabilidade económica e política no país, e vêem o Presidente como a força que garante que os benefícios são distribuídos por todos.

O Presidente, que é frequentemente referido apenas por Evo, espoletou parte da expansão económica da região (a economia do país cresceu cerca de 4,5% anualmente), retirou milhares da pobreza e deu voz a grupos indígenas anteriormente marginalizados.

“Hoje, a Bolívia é um estado completamente soberano e há uma estabilidade económica que se pode mesmo ver”, disse Yubinca Villena, uma estudante de linguística com 24 anos que também dá aulas de ballet. Para Villena, se Morales for derrotado pode-se perder grande parte do progresso.

Milenka Siles, estudante de enfermagem com 19 anos, acredita que é preciso dar crédito a Morales. Diz que a primeira memória que tem de Evo é a de um Presidente em que ninguém acreditava, porque como muitos em Bolívia, era um indígena com um passado de pobreza.

“Ele mostrou que estavam errados”, disse Siles, que planeia usar o seu primeiro voto como adulta para o manter no poder.

Na capital La Paz e em todo o mundo, Morales detém um estatuto de culto para muitos jovens. Para melhor ou para pior. Sempre que sai de casa, Kantuta diz que vê a cara ou o nome do Presidente estampado entre 20 a 30 vezes por dia em espaços públicos como praças e transportes: “Está em todo o lado.”

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