A desigualdade de género não é uma fatalidade

Nem a pobreza nem os crimes de género são uma fatalidade, mas viver em Portugal em 2019 ainda não garante o direito mais básico a não se ser discriminado, prejudicado ou assassinado em função do género a que se pertence.

Há notícias que devem orgulhar-nos e outras que devem continuar a envergonhar-nos. Apesar de ainda se situar abaixo da média comunitária, Portugal é dos países da União Europeia que mais rapidamente convergem em matéria de igualdade entre homens e mulheres, como atestava esta semana o Instituto Europeu para a Igualdade de Género. O país cumpre as metas europeias quando se fala de participação no mercado de trabalho (72% de mulheres e 79% de homens), mas há sempre um senão nestes temas de distribuição por género: ter filhos é sempre mais penalizador para elas do que para eles. Apenas 19% dos homens dedicam uma hora por dia a tratar da vida doméstica.

A última eleição legislativa deixou-nos outro dado importante sobre a evolução da igualdade de género no Parlamento, se bem que à custa da adopção da nova lei da paridade: a Assembleia da República terá mais dez mulheres sentadas nas suas bancadas comparativamente há quatro anos, mais de um terço do hemiciclo. Num Governo de continuidade, António Costa formou um Governo com a percentagem de mulheres mais elevada de sempre. E só não tem mais uma porque, aparentemente, Ana Paula Vitorino já não pode sentar-se com o marido à mesa do Conselho de Ministros.

Há notícias que devem orgulhar-nos e outras que devem continuar a envergonhar-nos. Os dados do Instituto Nacional de Estatística colocam os níveis de pobreza do país entre a média europeia. A taxa de pobreza relativa recuou para níveis anteriores à última crise, e a taxa de pobreza e exclusão diminuiu. Mas há um senão: os 1,8 milhões de pessoas em estado de pobreza, com rendimentos anuais abaixo dos 5600 euros e que representam 17,3% da população, só não é maior por causa das transferências sociais. E os riscos de pobreza continuam a ser mais elevados entre as mulheres do que entre os homens.

As secções especializadas que o Ministério Público vai criar nas comarcas de Lisboa e Porto para casos de violência doméstica, juntando procuradores da área criminal e da de família e menores, porque o que nestes casos está muitas vezes em causa é uma separação e a guarda de filhos, são um compromisso para acabar com a tolerância com que social e judicialmente estas situações são tratadas. Não se confunda femicídio com crime passional. Nem a pobreza nem os crimes de género são uma fatalidade, mas viver em Portugal em 2019 ainda não garante o direito mais básico a não se ser discriminado, prejudicado ou assassinado em função do género a que se pertence.

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