Vou ali e já venho

Só me resta desejar que surja depressa um qualquer outro assunto suculento, que nos distraia e nos amanse os ânimos.

Isto é o que me apetece, ao ver, ouvir e ler o que anda pelas “bocas do mundo” neste pós-legislativas.

Apetece-me ir ali fora, nem que seja a Badajoz, e voltar daqui a uns dias (poucos), quando a lusa exaltação se tiver amansado, como sempre se amansa, distraída com um qualquer outro assunto, que há-de servir para encher as primeiras páginas dos jornais e alimentar o analista que existe em todos e cada um de nós, agora que temos essa extraordinária plateia que são as redes sociais, para espraiar os nossos “sentires” e “opinares” vários.

É que eu sou portuguesa. E gosto de ser portuguesa, caramba! (embora esta seja o tipo de afirmação que sempre se me assemelha algo estranha, na medida em que, como nunca fui outra coisa que não portuguesa, não possuo, na verdade, qualquer termo de comparação…).

Mas sim, para simplificar e não naufragar em devaneios identitário-filosóficos digo que gosto de ser portuguesa!

Mas reconheço, também, que é cansativo, isto de ser portuguesa!

Tão cansativo que, por efeito do cansaço, me senti tentada a escrever sobre assuntos, relativamente aos quais tinha prometido, a mim mesma, nem sequer pensar, quanto mais escrever, seguindo a lógica de que certos factos ficam muito melhor quando ignorados, e que o tempo gasto a falar, pensar ou escrever sobre eles, é, de facto, tempo mal-gasto. E que os pensamentos e as palavras que lhes dedicamos, para mais não servem do que para lhes dar a importância de que estão sedentos e que, na realidade, não têm.

Mas a verdade é que a paciência tem limites e a consciência cívica tem-nos ainda mais e, por isso, cá estou eu a escrever sobre aquilo que tinha prometido a mim mesma não pensar, quanto mais escrever: a eleição de um deputado do partido Chega e a petição pública para que não seja empossada uma deputada democraticamente eleita, porque, de acordo com os signatários da petição (e ao que parece serão uns milhares) na celebração dos resultados eleitorais, foi agitada por alguém, que não a eleita, note-se, uma bandeira da Guiné-Bissau…

Relativamente à eleição de um deputado do partido Chega, e apesar de eu não ser politóloga, quer-me parecer que, mais do que um deputado da “extrema-direita” que, aliás, e à boa maneira portuguesa, rejeita tal filiação político-ideológica, foi eleito André Ventura, figura mediática e analista de assuntos vários, que vão desde os jogos de futebol da jornada - e há sempre jornadas de futebol a ser discutidas em Portugal – aos crimes de corrupção que provam a “roubalheira” e a “bandalheira” (sic) dos políticos, passando, naturalmente, pelas sempre suculentas e detalhadas notícias de homicídios passionais e violações incestuosas.

Se associarmos o mediatismo do prolífico comentador André Ventura, às mensagens veiculadas pelos cartazes do Chega espalhados pelo país, e que correspondem, ipsis verbis, aos impropérios proferidos pelo português-comum, nas filas dos Centros de Saúde, nas filas dos transportes ou ao olhar para o recibo de vencimento, compreende-se bem esta eleição.

Se a isto juntarmos uns pozinhos de discurso de aversão aos ciganos, quase que me atrevo a dizer que o mandato “estava no papo”.

E acredito que, para além de umas atoardas, proferidas, no Hemiciclo de São Bento, fieis ao registo de comentário futebolístico ou de crónica criminal, pouco mais terá a acrescentar o novel deputado da nação.

Relativamente à petição pública contra a tomada de posse da Doutora Joacine Moreira, confesso que as motivações alegadas para a dita petição me surpreenderam bastante mais, dado que eu desconhecia, em absoluto, e eu juro que converso com muita gente e escuto muita gente, tal fervor patriótico, entre os nativos lusos.

Por sinal, eu até tinha a convicção, que percebo agora estar totalmente errada, que a maioria dos portugueses não seria capaz de cantar todas as estrofes do hino nacional, particularmente no verso que refere os “nossos egrégios avós”.

Percebo agora quão enganada estava, e antevejo, em domingos próximos, os orgulhosos “chefes de família”, perfilados nos quintais, varandas, terraços e marquises deste país, congregando a prole, todos de mão no peito para o hastear da bandeira nacional.

Posto isto, só me resta desejar que surja depressa um qualquer outro assunto suculento, que nos distraia e nos amanse os ânimos. Pena é que, provavelmente, já não será comentado pelo polivalente Doutor André Ventura. Ficamos todos a perder…

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