Centristas do Partido Democrata atacam Elizabeth Warren à espera da queda de Joe Biden

Na quarta ronda de debates no Partido Democrata, o mayor Pete Buttigieg e a senadora Amy Klobuchar tentaram aproveitar o espaço aberto pela polémica que envolve o antigo vice-presidente dos EUA. Mais à esquerda, Bernie Sanders surgiu revigorado e animado com o apoio de Alexandria Ocasio-Cortez.

Foto
A senadora Warren tem subido nas sondagens e já ultrapassou Biden Reuters/AARON JOSEFCZYK

A senadora Elizabeth Warren foi o principal alvo dos ataques na quarta ronda de debates entre os candidatos do Partido Democrata à Casa Branca, num sinal claro de que a sua subida nas sondagens está a afastar o foco do ex-vice-presidente Joe Biden.

Num debate a 12, que decorreu na noite de terça-feira no estado do Ohio (madrugada de quarta-feira em Portugal), a senadora do Massachusetts sentiu pela primeira vez o que é ser o centro das atenções nas longas e duras campanhas para a Presidência dos EUA.

O debate começou com uma condenação unânime a Donald Trump, com todos os candidatos a acusarem o Presidente norte-americano de ser corrupto e a defenderem o seu afastamento da Casa Branca.

A oposição a Trump também serviu para marcar diferenças entre a ala centrista do Partido Democrata – onde candidatos como o mayor Pete Buttigieg tentam aproveitar um certo enfraquecimento de Joe Biden – e a ala mais à esquerda – onde a senadora Elizabeth Warren e o senador Bernie Sanders têm como principal proposta uma espécie de serviço nacional de saúde para todos.

“Estamos a competir para sermos presidentes depois de Trump. O nosso país estará terrivelmente polarizado, ainda mais do que agora”, disse Pete Buttigieg a Elizabeth Warren. “Para quê dividir ainda mais este país com a questão dos serviços de saúde, se temos uma melhor forma de garantir cobertura para todos?”

Elizabeth Warren, que disputa com o senador Bernie Sanders o título de candidato mais à esquerda e progressista de entre os nomes mais sonantes, sofreu ataques à direita por candidatos mais centristas, como Buttigieg e a senadora Amy Klobuchar.

Dos dois, Buttigieg é o que está em melhor posição para ganhar apoios ao centro se a candidatura de Joe Biden se afundar com o escândalo das pressões sobre a Ucrânia por parte da Administração Trump. O Presidente norte-americano está a braços com um processo de impugnação na Câmara dos Representantes, mas as acusações de Trump e dos seus aliados de que Biden e o seu filho Hunter são corruptos – uma acusação nunca provada até agora – tem afectado o antigo vice-presidente de Barack Obama.

Durante o debate, Biden foi confrontado com as acusações (que os moderadores fizeram questão de salientar que não têm consistência) e não foi além da afirmação de que nem ele nem o seu filho fizeram alguma coisa de errado. E não conseguiu dar uma explicação segura e convincente para outra dúvida dos moderadores: se considera que não houve nenhum problema enquanto era vice-presidente, porque promete agora que, se for Presidente, nenhum familiar seu trabalhará em empresas no estrangeiro?

Ataque ao centro

Pete Buttigieg, o mayor de South Bend, no estado do Indiana, tem mantido uma posição forte nas sondagens, logo atrás dos favoritos Biden, Warren e Sanders; e Amy Klobuchar não consegue alcançar sequer 2% das preferências, o que a deixa em risco de não participar no próximo debate, a 20 de Novembro.

É por isso que ambos tinham de aproveitar um pouco do espaço deixado vago por Joe Biden no papel de candidato responsável e moderado – o contraponto a Warren e Sanders, com os seus planos para uma espécie de serviço nacional de saúde, que é inaceitável para o Partido Republicano, mas que também é visto com muita desconfiança por grande parte do eleitorado do Partido Democrata.

“A sua imagem de marca, senadora, é ter um plano para tudo menos para isto”, disse Pete Buttigieg a Elizabeth Warren, acusando-a de não explicar como irá pagar a sua proposta para a saúde.

Warren tem repetido que a factura será paga por um aumento de impostos para as grandes empresas e fortunas, mas os seus adversários no Partido Democrata dizem que a classe média também vai participar na conta. A senadora do Massachusetts diz apenas que a classe média vai pagar menos a longo prazo em relação aos custos que tem de suportar actualmente, mas até Bernie Sanders reconhece que os impostos vão subir no imediato.

“Não aceitarei uma lei que não baixe os custos para as famílias da classe média”, disse Elizabeth Warren debaixo de pressão.

Tudo em aberto

Desde a terceira ronda de debates, há apenas um mês, o panorama da campanha no Partido Democrata alterou-se radicalmente. E a aproximação da primeira etapa eleitoral – o caucus no Iowa, a 3 de Fevereiro de 2020 – começa também a apertar o leque de favoritos.

Nas últimas semanas, as investigações com vista a um processo de impugnação contra o Presidente Trump têm ocupado as discussões sobre política nos EUA, e a ofensiva turca contra os curdos após a retirada das tropas norte-americanas do Norte da Síria deixaram a Casa Branca ainda mais exposta aos ataques de fora.

E se o processo contra Trump tem puxado Biden para baixo e aberto a porta a outros candidatos centristas, o ataque cardíaco sofrido por Bernie Sanders no início do mês também pode alterar os cálculos de alguns eleitores.

Há apenas um mês, tudo indicava que Joe Biden e Elizabeth Warren ou Bernie Sanders seriam os favoritos a sobreviverem à dura corrida, e a chegarem à fase decisiva da escolha. Mas se Biden for mesmo afectado pelas polémicas, e se Sanders se ressentir dos problemas de saúde, a corrida fica aberta para outros nomes em que poucos acreditariam, principalmente ao centro. Sendo praticamente impossível que Elizabeth Warren venha a atrair a esmagadora maioria dos eleitores do Partido Democrata, candidatos como Pete Buttigieg ou Beto O’Rourke podem vir a ocupar o papel do candidato centrista contra a senadora do Massachusetts, por exemplo.

No debate desta noite, Bernie Sanders mostrou que os problemas de saúde não afectaram a sua prestação como candidato, e até lhe deram um poder desconhecido do grande público até agora: o sentido de humor. Quando o senador Cory Booker referiu que Sanders também apoia o uso de marijuana para fins medicinais, a resposta de Sanders provocou gargalhadas: “Mas esta noite não fumei.”

O senador do Vermont poderá ainda recuperar em relação a Warren com o anúncio do apoio das congressistas Alexandria Ocasio-Cortez e Ilhan Omar, estrelas da ala mais progressista do Partido Democrata. 

Em relação aos restantes candidatos, alguns deles acabarão por desaparecer dos radares no próximo mês por não conseguirem qualificar-se para a próxima ronda, no dia 20 de Novembro. Estão nesta situação nomes como Amy Klobuchar, mas também o outrora favorito Beto O’Rourke, o ex-congressista do Texas que deu luta ao republicano Ted Cruz nas eleições para o Senado, em Novembro de 2018; e Julián Castro, o antigo secretário da Habitação na Administração Obama que também se candidata com propostas progressistas.

Até agora, há oito candidatos com lugar marcado no próximo debate. Para além dos favoritos Biden, Warren e Sanders, estão também apurados o mayor Pete Buttigieg, a senadora Kamala Harris, o senador Cory Booker, o empresário Valley Andrew Yang e o multimilionário Thomas Steyer.

Sugerir correcção
Ler 14 comentários