Quer pagar menos IRC?

A descida do IRC é fundamental, não só para evitar esta fuga à tributação nacional, mas também para promover o investimento, que potencia a arrecadação de receitas fiscais de diversas formas, além de promover o emprego qualificado.

Apesar das receitas arrecadadas por Portugal com o IRC estarem a subir desde 2014, tendo atingido em 2018 um novo máximo histórico de 6492,4 milhões de euros, o país continua a perder uma parcela importante desse imposto para regimes fiscais mais favoráveis, nomeadamente Irlanda, Luxemburgo e Holanda. Estima-se que só em 2016 tenhamos perdido cerca de 630 milhões de euros de impostos em virtude da transferência de lucros para esses regimes fiscais.

Um regime fiscal mais favorável (tendenciosamente classificado por alguns como um paraíso fiscal), não é nenhum demónio que encarnou e veio desassossegar o comum dos mortais, nem tão pouco é o Adamastor dos tempos contemporâneos. As empresas ao transferirem legalmente lucros para esses países, estão a procurar maximizar o seu valor. Trata-se de uma decisão de gestão como o são muitas outras. Só mentes perversas e superficiais podem procurar nestes procedimentos qualquer tipo de fraude.

Dado que não é fraude, pode-se colocar aqui a questão da moralidade. Gerar lucros num país e pagar os impostos corporativos noutros é imoral? Penso que também não o é. Vejamos a questão por outro prisma. Defendo por diversas razões que se deve comprar produtos portugueses, mas qual o consumidor que perante igualdade nas características de dois produtos vai pagar um preço mais elevado por um produto português em detrimento de comprar um produto importado? Por mais nacionalista que seja, racionalmente vai acabar por comprar o produto importado. Neste caso o consumidor que agiu racionalmente está a promover os lucros da empresa estrangeira e a transferir indiretamente verbas para o estrangeiro, sendo que não se pode dizer que a sua decisão é imoral, pois comprou de acordo com as regras do mercado. Os consumidores tomam diariamente milhares de decisões deste género e ninguém as apelida de imorais. À empresa portuguesa só restará criar condições para no mínimo igualar o preço e assim tornar-se competitiva tornando-se uma opção válida para o consumidor. Neste caso claramente defendo que se deve comprar português.

O que se passa com os impostos corporativos é praticamente a mesma coisa. Racionalmente as empresas procuraram jurisdições fiscais mais favoráveis, porque elas existem. Em diversos casos as taxas de tributação são quase metade das nossas. Por que motivo uma empresa pagará o dobro se criou condições para pagar metade? Se se apelidar de imoral esta decisão também será imoral a escolha do consumidor.

Será imoral os países competirem por um bem escasso como é o caso do capital e para isso usarem instrumentos fiscais? Claro que não é imoral. Imoral e até a roçar o obsceno são algumas taxas de impostos.

Uma grande parte dos países ou instituições anda a fingir lutar contra estes regimes fiscais mais favoráveis, e com isso consumindo recursos. Assim, com taxas iguais ou similares, as empresas já não sentem o incentivo de transferir lucros e tenderão a pagar nos seus países, tanto mais porque para pagar nessas jurisdições é necessário criar estruturas e condições que são onerosas.

A descida do IRC é fundamental, não só para evitar esta fuga à tributação nacional, mas também para promover o investimento, que potencia a arrecadação de receitas fiscais de diversas formas, além de promover o emprego qualificado.

Obviamente que não estou a defender transferências ilegais de lucros, para jurisdições sem regras, com taxas zero e com falta de cooperação internacional, como o fizeram (ou fazem), algumas empresas tecnológicas. Estou a referir que é perfeitamente compreensível a transferência de lucros onde o regime fiscal seja mais favorável, onde existem regras e cooperação internacional. Se o consumidor faz as suas escolhas, as empresas também o podem fazer.

Um paraíso fiscal é uma coisa, um regime fiscal mais favorável é outra e uma Zona Franca ainda é outra, sendo que muitas vezes para satisfazer necessidades de aumentar a visibilidade, criar alarmismo social, por desconhecimento de causa ou até servir determinados interesses, procura-se lançar a confusão e medir tudo pela mesma bitola. Desde quando se pode classificar a Irlanda, a Holanda ou o Luxemburgo como paraísos fiscais? Haja paciência.

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