Portugal entrou sem identidade e saiu sem margem de erro

No jogo em que Cristiano Ronaldo fez o 700.º golo da carreira, Fernando Santos sofreu na Ucrânia a terceira derrota em encontros oficiais como seleccionador português e terá que vencer os últimos duelos.

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O desespero português e a festa ucraniana LUSA/PAULO NOVAIS

O que têm em comum Basileia, Sochi e Kiev no currículo de Fernando Santos? A mesma aposta táctica inicial (4x3x3) e o mesmo resultado final (derrota). Após perder com a Suíça (apuramento para o Mundial 2018) e o Uruguai (Mundial 2018), o seleccionador português sofreu a terceira derrota em jogos oficiais (2-1) e ficou sem margem de erro na qualificação para o Euro 2020: com a vitória da Sérvia na Lituânia, Portugal continua a depender apenas de si, mas terá que vencer as duas últimas partidas no Grupo B se os sérvios fizerem o mesmo. O golo 700.º de Cristiano Ronaldo ficará, assim, associado a uma noite de más recordações.

Três dias depois de conquistar a quinta vitória consecutiva, Santos deixou de lado a tradicional rigidez nas opções iniciais, exibindo em Kiev o seu pragmatismo. O seleccionador sabia que se a Sérvia cumprisse a sua obrigação e ganhasse na Lituânia, para Portugal um empate na Ucrânia seria um mal menor, deixando a equipa nacional a precisar de quatro pontos na recepção aos lituanos e na deslocação ao Luxemburgo. Já uma derrota não seria uma tragédia, mas obrigaria Portugal a vencer as últimas partidas para não depender de terceiros.

Assim, se contra o Luxemburgo, o técnico apostou de início num “onze” ofensivo (Bruno Fernandes, Bernardo Silva, João Félix e Ronaldo), em Kiev, frente a um rival invicto há oito jogos, Santos foi cauteloso. Mostrando respeito, o seleccionador abdicou de dois criativos (Félix e Bruno Fernandes), lançou dois jogadores mais objectivos (João Mário e Gonçalo Guedes) e trocou o 4x4x2 pelo 4x3x3. Resultado? Tal como em Basileia, contra a Suíça, e em Sochi, frente ao Uruguai, com a mudança táctica Portugal perdeu identidade.

Com o conforto de ter amealhado 16 dos 18 pontos possíveis nas primeiras jornadas, Shevchenko precisava de um ponto para garantir a qualificação, mas o antigo avançado do Dinamo Kiev, AC Milan e Chelsea revelou mais audácia do que o técnico rival. Em relação à vitória na sexta-feira contra a Lituânia, Shevchenko mudou os laterais e no ataque trocou o móvel Júnior Moraes por um jogador de área: o longilíneo Yaremchuk.

A aposta no ponta-de-lança do Gent fazia antever um futebol directo por parte dos ucranianos, mas Yaremchuk nem precisou de fazer uso dos seus 191 centímetros para marcar o quarto golo com a camisola do seu país: aos 6’, após um canto, Kryvtsov desviou ao primeiro poste, Rui Patrício ainda defendeu, mas na recarga o “9” empurrou para o fundo da baliza. Na primeira oportunidade, os ucranianos ficaram ainda mais confortáveis e a estratégia de Santos ruía como um baralho de cartas.

Com um meio-campo pouco propenso a correr riscos (Danilo, Moutinho e João Mário), Guedes e Bernardo Silva sem profundidade nos flancos e Ronaldo sozinho no duelo com os competentes centrais ucranianos, Portugal ficava preso na teia montada por Shevchenko.

Com posse de bola a mais e objectividade a menos, as investidas portuguesas eram anuladas pela Ucrânia e sem que Portugal conseguisse criar uma grande oportunidade, Patrício sofreu o segundo golo: Mykolenko colocou na área e perante a passividade de Rúben Dias e Raphael Guerreiro, Yarmolenko fez o 2-0.

Bola na barra

Com uma enorme montanha para subir, Santos deu um passo atrás. Mesmo sem mexer no “onze”, o técnico deu ordens para Guedes jogar mais próximo de Ronaldo e Portugal recuperava o habitualmente bem-sucedido 4x4x2. Com mais presença portuguesa na sua área, Pyatov começou finalmente a ter trabalho e a assumir-se como uma das figuras do duelo: com um par de boas defesas, o guarda-redes do Shakhtar segurou a vantagem de dois golos.

Obrigado a reagir, Santos trocou ao intervalo Guedes por Félix. Portugal melhorou, mas a falta de capacidade a meio campo mantinha-se e a procura do golo fazia-se mais com o coração do que com a cabeça. Permeável aos contra-ataques, a selecção portuguesa até parecia sob a ameaça de sofrer o terceiro (Pepe evitou na “hora h” o remate de Konoplyanka), mas uma bola no braço na área de Stepanenko revolucionou o jogo: o central foi expulso e Ronaldo fez de penálti o seu golo 700.º.

Ainda com vinte minutos, Portugal tinha uma oportunidade de ouro para evitar a derrota, mas apesar dos insistentes pedidos de Fernando Santos, os portugueses não tiveram cabeça fria. Sempre com iniciativas individuais, os portugueses esbarraram em Pyatov e no último minuto, quando o guarda-redes já nada podia fazer, Danilo ainda acertou com estrondo na barra. Catorze jogos depois, Portugal voltava a perder.

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