Falta de mão de obra e preços considerados baixos afastaram empresas de construção

Reconstrução das habitações permanentes das vítimas dos incêndios decorreu com ritmos muito diferentes, caso as empreitadas estivessem a ser coordenadas pela região Norte ou pela região Centro.

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As obras de reabilitação foram mais rápidas no Centro do que no Norte Paulo Pimenta

Há um abismo de diferença entre as regiões Norte e Centro na forma como correu o apoio às vítimas dos incêndios e à recuperação de casas e empresas. E foi na região onde houve menos casos, e um menor número de processos para avaliar e gerir, que houve mais dificuldades. Os critérios eram os mesmo para ambos, tanto para casas como para empresas: primeiro, fazer levantamento das casas ardidas; depois, provar a titularidade da habitação, comprovar que os danos resultaram dos incêndios, demonstrar que se tratava de uma habitação permanente. No caso das maiores empreitadas, com custos acima dos 25 mil euros, teriam de ser as Comissões de Coordenação a avançar com as empreitadas, cumprindo os requisitos do Código dos Contratos Públicos, com as excepções permitidas aos casos em que é reconhecido carácter de urgência.

Na jurisdição da CCDR do Centro, com 38 municípios envolvidos, foram apresentados 1335 pedidos de apoio, dos quais 848 foram enquadrados no Programa de Apoio à Reconstrução de Habitação Permanente (PARHP), com 36% a serem rejeitados por não cumprirem os critérios, por exemplo, de ser a morada principal. Os 848 pedidos de apoio aprovados referem‐se a 26 apetrechamentos de habitações, 469 reconstruções parciais e 353 reconstruções totais, envolvendo cerca de 58 milhões de euros do Orçamento do Estado. Das reconstruções totais, falta terminar as obras em 30 casas – estão todas em diferentes fases de execução. 

No caso da CCDR do Norte, nos sete municípios envolvidos, foram analisados 92 casos e aprovadas 78 candidaturas, para um orçamento total de 2,2 milhões de euros. A grande maioria dos casos está em Castelo de Paiva: 63 casas, das quais 48 reconstruções parciais, três apoios para o apetrechamento e dez reconstruções totais.

Das 48 casas com reconstrução parcial estão concluídas 35 intervenções, num montante global de 220 mil euros. “O apoio ainda não chegou às restantes 13 habitações porque os proprietários ainda não apresentaram as respectivas facturas para o reembolso”, explica fonte oficial da CCDR-N. Já sobre os pedidos de apoio à reconstrução total, está quase tudo por fazer.

O despacho assinado pelo então ministro do Planeamento, Pedro Marques, a delegar a competência para “autorizar a realização de empreitadas de obras públicas no município de Castelo de Paiva no âmbito do PARHP”, só foi remetido ao presidente da CCDR-N, Freire de Sousa, a 18 de Janeiro de 2019, um ano e três meses depois da tragédia. Ana Abrunhosa, da CCDR-C, começou a lançar concursos e a fazer ajustes directos um ano antes disso.

Para além do atraso com que foram lançadas, houve mais entraves à execução dos projectos. Depois de terem sido adjudicados e elaborados os projectos de arquitectura e especialidade para as dez obras (foram entregues por ajuste directo após consulta a cinco gabinetes), foram também lançados os procedimentos concursais para ajuste directo com consulta prévia a cinco empreiteiros. Mas, das dez empreitadas, só oito foram adjudicadas, e ainda não há contrato assinado com nenhum.

Relativamente aos dois pedidos não adjudicados, “por irregularidades formais nas propostas apresentadas”, explica a CCDR-N, foi lançado um novo procedimento concursal com convite a cinco empreiteiros. Mas não surgiu nenhuma proposta, estando ainda a comissão “a avaliar a forma de ultrapassar este constrangimento”.

Não haver concorrentes para empreitadas de obras públicas tem sido um resultado recorrente nos concursos públicos, mas Reis Campos, presidente da Federação da Construção, recusa que o sector seja acusado de ter obras a mais e não tenha capacidade de dar resposta às necessidades do país. “Não há obras em excesso, mas há constrangimentos na actividade. E o acesso à mão-de-obra qualificada é uma dificuldade séria. Três em cada quatro empresas indicaram esse problema no último inquérito trimestral que fizemos ao sector”, diz Reis Campos. O presidente da federação justifica com “preços-base irrealistas, assentes em critérios totalmente discricionários”, a falta de comparência dos empresários aos concursos. 

Na CCDR-C também houve problemas deste género. Em Oliveira do Hospital, tentou-se entregar as obras a empresas da região e, depois de três tentativas falhadas, a empreitada acabou por ficar, por ajuste directo, com a empresa Gabriel Couto, por ter sido a única que aceitou fazer a empreitada pelo preço base de 650 euros o metro quadrado.

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