Chico Buarque lança novo romance em Novembro no Brasil e também em Portugal

Com o título Essa Gente, o novo livro narra a vida, passada no Rio de Janeiro, de um escritor decadente, num vazio criativo e emocional. 14 de Novembro é a data anunciada para a publicação no Brasil. A Portugal chega uns dias depois.

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Chico Buarque DR

O escritor e compositor brasileiro Chico Buarque lança, no próximo mês, a sua nova obra, Essa Gente, um romance passado no Rio de Janeiro, que narra a vida de um escritor decadente, num vazio criativo e emocional. Naquele que é o seu sexto romance, Buarque “constrói uma engenhosa trama, cujas entrelinhas revelam as contradições do Brasil de agora”, segundo a editora Companhia das Letras, que anunciou esta sexta-feira o lançamento do livro no país sul-americano para o dia 14 de Novembro. Em Portugal o livro irá para as livrarias uns dias depois, a 19 de Novembro. “Podemos dizer que é uma publicação simultânea, no nosso caso é a 19 porque é o dia fixo de distribuição”, explica ao PÚBLICO a editora da Companhia das Letras portuguesa, Clara Capitão. 

Manuel Duarte, protagonista do romance, tem pontos em comum com o seu próprio criador, revelou o também autor brasileiro Sérgio Rodrigues, no texto de apresentação daquele que é o primeiro romance de Buarque depois de ganhar o Prémio Camões. “Há pontos de contacto entre Chico Buarque e o protagonista de Essa Gente. Além de ser escritor, Manuel Duarte tem esse sobrenome de perfil vocálico idêntico e gosta de bater perna atrás de inspiração nos arredores do Leblon, onde voltou a morar após o fim de seu último casamento”, escreveu Rodrigues. Contudo, e apesar das aparentes alusões autobiográficas, Sérgio Rodrigues garante que a obra está repleta de “pistas falsas” até ao final.

Essa Gente é, entre os romances de Chico, o mais áspero e possivelmente o mais enigmático. A história contada em forma de pequenos capítulos de diário, quase todos datados de um passado tão recente que se pode chamar de actualidade, é mais um dos seus quebra-cabeças narrativos com fumaças de literatura policial”, frisou ainda Sérgio Rodrigues.

Numa breve descrição do protagonista do romance, ficamos a saber que Manuel Duarte, autor de diversos livros, entre eles um best-seller, encontra-se em decadência, tanto financeira quanto afectiva. Tem um filho pré-adolescente com quem é incapaz de trocar uma única palavra, duas ex-mulheres, “além de um número não especificado” de prostitutas, estando sempre à procura de uma forma de ganhar dinheiro. “Enquanto isso, à sua volta, o Rio de Janeiro sangra e estrebucha sob o flagelo de feridas sociais finalmente supuradas, exibidas por muitos com uma espécie doentia de orgulho”, revelou Rodrigues.

Escritor, compositor e cantor, Francisco Buarque de Holanda, 74 anos, é o vencedor do Prémio Camões 2019, tendo a escolha sido anunciada em Maio, após reunião do júri, na Biblioteca Nacional do Brasil, no Rio de Janeiro. A entrega formal do prémio, que deverá ocorrer no próximo ano, voltou esta semana a ser falada por via da notícia avançada pelos jornais O Globo e Folha de São Paulo, dizendo que o Presidente Jair Bolsonaro equaciona não assinar o diploma relativo àquela que é a mais importante distinção para a literatura de língua portuguesa. Reagindo a esta ameaça com contornos claramente políticos, Chico Buarque disse que “a não-assinatura do Bolsonaro no diploma” significaria, para si, “um segundo Prémio Camões”.

Já esta quinta-feira, comentando também a eventual recusa do Presidente brasileiro em ratificar o Prémio Camões 2019, o director do Serviço Social do Comércio do Estado de São Paulo (SESC), Danilo Miranda, em declarações à agência Lusa, classificou-a como “um absurdo total”. O responsável por este organismo privado financiado pelo comércio e que tem como objectivo proporcionar a qualidade de vida aos trabalhadores deste sector criticou Jair Bolsonaro por não reconhecer “Chico Buarque como um dos maiores artistas brasileiros na música e na literatura”, e lamentou a falta de “visão de estadista” do Presidente.

Também na quinta-feira, o escritor moçambicano Mia Couto, Prémio Camões 2013, “saudou” a reacção de Chico Buarque à ameaça do Presidente brasileiro, considerando-a “genial”, afirmando de seguida a sua intenção de contactar “colegas que foram Prémio Camões” para fazerem uma “declaração conjunta contra a imbecilidade desse tipo de atitude” de Jair Bolsonaro. “Eu venho do Brasil e venho muito preocupado com essa subida de tom do lado autoritário da censura, a maneira como os livros estão a ser retirados das escolas, uma coisa completamente antiética. Não é só o Bolsonaro, estava ali um Brasil fabricado pelas igrejas evangélicas, de que não dávamos conta”, disse Mia Couto à Lusa.

O valor total do Prémio Camões é de 100 mil euros, divididos entre Brasil e Portugal. A parte que cabia ao Governo brasileiro foi paga em Junho, e a assinatura do diploma é apenas uma formalidade, mas o documento poderá chegar às mãos do músico sem a assinatura do Presidente do Brasil. “A cerimónia de entrega do Prémio Camões a Chico Buarque realizar-se-á em Portugal, conforme ditam as regras, na data que for conveniente a quem entrega e a quem recebe o Prémio. Está em curso o processo para marcação da data”, disse ao PÚBLICO fonte do Ministério da Cultura português.

Antes do Prémio Camões, Chico Buarque fora já distinguido duas vezes com o Jabuti, o mais importante prémio literário no Brasil, pelo romance Leite Derramado, em 2010, obra com que também venceu o antigo Prémio Portugal Telecom de Literatura, e por Budapeste, em 2006. 

Nascido em 19 de Junho de 1944, no Rio de Janeiro, Chico Buarque estreou-se nas Letras com o romance Estorvo, publicado em 1991, a que se seguiram obras como Benjamim, Budapeste, Leite Derramado e O Irmão Alemão, publicado em 2014, sem esquecer Tantas Palavras, que reúne todas as letras de Chico Buarque e uma “reportagem biográfica” sobre o autor. A sua obra literária está a ser reeditada em Portugal pela Companhia das Letras.

Chico Buarque é um apoiante do Partido dos Trabalhadores (PT), defensor do ex-Presidente brasileiro Lula da Silva e crítico do Governo de Jair Bolsonaro.

Notícia actualizada às 13h15 com a data de publicação do romance em Portugal

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