Vitória e outras derrotas

Caberá a António Costa, uma vez mais, fazer uso da sua habilidade política e conseguir encontrar acordos de equilíbrio que lhe dêem a estabilidade necessária para prosseguir o caminho do progresso.

Terminou o processo eleitoral que legitimou a opção estratégica que permitiu a Portugal recuperar a esperança às garras da troika. O Partido Socialista venceu as eleições e viu assim o país reconhecer o enorme capital de competência política de António Costa.

A vitória era esperada e os portugueses entenderam que querem voltar a ter um governo que gere equilíbrios políticos em benefício de todos. Um desafio com esta complexidade só poderia ser liderado por aquele que demonstrou que era possível trilhar um caminho diferente do que nos vaticinava a direita, e devolveu ao país a coesão social, o desenvolvimento económico e a soberania financeira.

Não foi por acaso que, mesmo recuperando os truques mais soezes e baixos da baixa política dos tempos da outra senhora (literalmente), a direita obteve o seu pior resultado de sempre. E se bem que, de um lado, Assunção Cristas reconheceu a sua responsabilidade política, do outro vimos um PSD de Rui Rio cantar vitória por não ter, imagine-se, uma derrota maior. Foi inédito e ridículo, até para a direita, que alguém que obteve resultados só comparáveis a 1983 tivesse passado largos minutos em directo a culpar tudo e todos pelos resultados, como se não tivesse sido ele o cabeça de lista.

Em boa verdade não foi. Talvez quisesse garantir para si próprio a manutenção do mantra que não se cansou de repetir à exaustão de que nunca perdeu nenhuma eleição. Perdeu agora, dr. Rui Rio, e de que maneira! Até doeu! 

Santana Lopes só não pode cantar vitória por ter sido superado o seu resultado de 2005 pela negativa (retirando-lhe o pódio), porque a sua desgraça, desta vez, foi ainda maior. Estamos habituados a vê-lo contrariar sucessivamente a sua morte política, mas tenho sérias dúvidas que seja possível ultrapassar o linchamento político que sofreu agora. Mas nunca fiando, o homem é um resistente.

Pior do que este cenário à direita foi ver alguém com o perfil e a falta de verticalidade de André Ventura granjear um número de votos que lhe permitiu ser eleito. Mais ainda, pelo discurso odiento, bafiento e fascizóide que foi recuperar ao baú das más memórias, gritando grande vitória, como se de um espírito maligno que esteve encerrado durante décadas e se viu libertado por um qualquer ritual se tratasse. Foi abominável ver a sua vanglória e presunção a anunciar para daqui a uns anos a chegada ao poder do país. 

Já o Bloco, que conseguiu manter o mesmo número de deputados que em 2015, recebeu o que semeou. Quanto a mim cometeu um erro em abrir hostilidades contra o PS ao longo da campanha eleitoral, como se o BE fosse o responsável único pelo bom trabalho que o PS realizou, quanto mais não fosse pela capacidade de construir pontes onde mais ninguém as via. Talvez por isto mesmo. Não se pode confiar muito quando aqueles que criam pontes para fazer caminho, a meio do trajecto as ameaçam destruir. Os portugueses provavelmente também não gostaram muito disso, a ver pelos menos 50 mil votos obtidos.

Honra seja feita ao PCP que, apesar de anunciar que não aceitaria renovar os votos de casamento, também não ameaçou com divórcio nem exigiu separação de bens. 

Caberá a António Costa, uma vez mais, fazer uso da sua habilidade política e conseguir encontrar acordos de equilíbrio que lhe dêem a estabilidade necessária para prosseguir o caminho do progresso. Estou certa de que será capaz de os concretizar.

Porém, aqueles que durante toda a campanha gritavam de forma desabrida “não a maiorias, não a maiorias”, deverão agora provar aos portugueses e portuguesas, de forma responsável, que estão neste processo governativo para somar e não subtrair. Veremos.

Uma nota para os quase cinco milhões de portugueses que optaram por não exercer o seu direito, ou melhor, por não cumprir o seu dever, deixando que outros decidissem por si. 

Não há justificação possível, quando tivemos nestas legislativas o maior número de opções de sempre. Vinte e uma! Não quero acreditar que a desculpa costumeira de que somos todos iguais seja a verdadeira razão desta alienação. A partir de hoje podemos dizer que não é essa a razão, mas sim, exceptuando os casos que se justificam, seja por falta de mobilidade ou outros impedimentos físicos, uma total ausência de responsabilidade cívica que deveria envergonhar a todos os que desbaratam desta forma a maior das conquistas da liberdade. Envergonhem-se em vez de reclamar. 

O povo falou!

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