Uma cantora imensa

Jessye Norman tinha um timbre riquíssimo e uma excepcional amplitude de voz: sendo basicamente uma soprano dramática conseguia, tanto mais com os anos, atingir os registos de meio-soprano e mesmo contralto.

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Denis Balibouse/ REUTERS

Grandiosa, Jessye Norman era uma cantora grandiosa. De voz imensa e de presença imponente. Com raízes afro-americanas, facto que marcou muitas das suas opções, Norman, nascida em 1945, seguiu em 1969, concluídos os estudos e a pós-graduação, para a Europa, em concreto para a Deutsche Oper de Berlim (ocidental), onde se estreou no papel de Elizabeth no Tannhäuser de Wagner. Cedo se distinguiu em papéis nobres — em particular a prima donna de Ariadne de Naxos de Richard Strauss. 

Tinha um timbre riquíssimo e uma excepcional amplitude de voz: sendo basicamente uma soprano dramática, conseguia, tanto mais com os anos, atingir os registos de meio-soprano e mesmo contralto. Foi uma das raras cantoras a interpretar as duas grandes personagens femininas de Os Troianos de Berlioz, a Cassandra da primeira parte, A Queda de Tróia, e a Dido da segunda parte, Os Troianos em Cartago

Mas Jessye Norman esteve muito longe de se confinar à ópera. O seu domínio de eleição foi a canção, e em particular o Lied com orquestra.

A sua presença era suficiente para preencher um espectáculo. Em 1982 fez com Bob Wilson Great Day in the Morning, em que durante duas horas ou quase, sentada numa cadeira, dir-se-ia que imóvel, cantava espirituais negros. Depois de se terem reunido de novo numa ópera — monodrama de uma mulher ansiosa, Erwartung, de Schönberg, no Festival de Salzburgo —, colaboraram ainda numa versão encenada do ciclo A Viagem de Inverno, de Schubert.

Concebeu também um espectáculo com a Alvin Ailey Dance Company e co-criou com o coreógrafo Bill T. Jones How! Do! We! Do! — ​e note-se que ambos, Ailey e Jones são também afro-americanos. E com Michel Legrand gravou um disco, I Was Born In Love With You. E foi ela que na Bastilha cantou A Marselhesa nos 200 anos da Revolução Francesa.

Era decididamente uma cantora fora de normas, uma personalidade incomum. E era imensa Jessye Norman, imensa.

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