A despolítica do clima na crise capitalista

Enquanto a UE ameaça fazer sanções ao Brasil se o atual presidente continuar suas políticas predatórias à maior floresta tropical do mundo, Bolsonaro acusa a UE por sua política colonialista e de ser ela a verdadeira predadora do meio ambiente nos países periféricos. Nesse debate, quem tem razão? Todos e ninguém!

Se por um lado o grande apelo ao debate acerca da questão ambiental e a iminência das mudanças climáticas, traz à luz uma discussão que se estabelece como preocupação pública global, também se constitui como um marco de despolitização permeado por discursos pós-políticos.

Erik Swyngedouw, especialista em ecologia política e professor da Universidade de Manchester, defende que foi já nos anos 80 que o movimento ecológico passou a centrar-se na produção capitalista. Desde então, é imprescindível considerar os jogos e ações de poder de cada lugar na sua relação direta com o desenvolvimento e promoção do próprio capitalismo, para quem quer perceber como se solidificou no passar dos anos um desenvolvimento social ecológico tão desigual a partir de uma política de consensos. Swyngedouw chama atenção, ainda, ao cuidado que devemos ter com o caráter populista despolitizador que assombra as discussões em torno do clima e da ecologia, que muitas vezes com um discurso romantizado visa a suspensão de sua dimensão política. Nesse formato, a política é progressivamente substituída pela administração social especializada e fecha as portas da democracia e da luta social. Como afirma Rancière quando defende que pela anulação dos dissensos, o consenso ambiental pós-político se configura como o fim da política.

A política ambiental é reduzida à capacidade de policiar procedimentos deliberativos supostamente participativos, dentro de uma distribuição hierárquica de funções, reduzidas a debates institucionais de governo enquanto que orientações políticas de esquerda e direita são subordinadas a regimes tecnocráticos.

O desastre catastrófico que emerge como iminente já aconteceu e está a acontecer, especialmente para as populações que vivem em situação de precariedade nas periferias do mundo. Ela é denunciada há muito tempo, principalmente pelas comunidades que resistem mesmo diante da invisibilização social e política. O apartheid climático, onde ricos pagam para escapar do sobreaquecimento, da fome e do conflito só torna evidente que as pessoas menos responsáveis pelas emissões globais são também as mais atingidas por ele.

Ademais, o perigo do discurso pós-político é que, a alternativa política a ele seja monopolizada por um movimento reacionário, exemplo disso é a figura de Jair Bolsonaro. O recente debate entre o atual presidente do Brasil e lideranças da União Europeia é uma boa amostra do discurso vazio, que ainda permeia o debate ecológico. Enquanto a UE ameaça fazer sanções ao Brasil se o atual presidente continuar suas políticas predatórias à maior floresta tropical do mundo - a Amazônia - Bolsonaro acusa a UE por sua política colonialista e de ser ela a verdadeira predadora do meio ambiente nos países periféricos. Nesse debate, quem tem razão? Todos e ninguém!

Com menção a passagem bíblica, “a verdade vos libertará”, diante do mundo, Jair Bolsonaro marcou sua participação na abertura da Assembleia Geral da ONU com “suas verdades”: um programa de ultradireita, pró-ditadura e anti indígena. Para o Brasil, assim como para os demais países do sul global, que ainda detém grande parte das reservas naturais florestais e hídricas do mundo, sem dúvida é necessário travar as políticas predatórias neoliberais, mas sem que isso signifique perda da soberania, de suas reservas e essas não mudem apenas de mãos opressoras. Portanto, esse debate não deve fechar os olhos sobre a responsabilidade dos Estados imperialistas e sua política de exploração capitalista na crescente degradação do meio ambiente, que contribui para a expansão da violência que assombra as comunidades indígenas e periféricas do mundo.

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