Assembleia Geral da ONU: “É falácia dizer que a Amazónia é património da humanidade”, diz Bolsonaro

Num discurso marcado ideologicamente, o chefe de Estado brasileiro atacou Cuba e a Venezuela e voltou a considerar “colonialistas” as críticas à sua política para a Amazónia. A seguir, Trump, que enfrenta a reeleição em 2020, falou do perigo do socialismo.

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Socialismo e Amazónia foram dois grandes eixos do discurso Reuters/CARLO ALLEGRI

Havia muitas expectativas sobre o que diria Jair Bolsonaro no seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas, que abriu nesta terça-feira em Nova Iorque. Mas ele foi igual a si próprio. “Em primeiro lugar quero dar graças a Deus por estar vivo”, foi a sua primeira frase de um discurso em que até falou da facada que sofreu durante a campanha eleitoral. “Apresento-me perante vocês para mostrar um Brasil novo que renasceu do socialismo”.

Os primeiros momentos do discurso do Presidente brasileiro serviram-lhe para atacar o “socialismo” - do qual considera ter salvo o seu país, ao tirar o Partido dos Trabalhadores do poder - e fazer o contraste com outras nações da América Latina, e ao mesmo tempo buscar a aproximação com os Estados Unidos de Donald Trump. “Na busca pela prosperidade, adoptámos políticas que nos aproximam dos outros países que conseguiram o desenvolvimento e consolidaram as suas democracias. Não pode haver liberdade política sem liberdade económica”, disse Bolsonaro.

Falou de Cuba e da Venezuela. “O meu país estava à beira do socialismo que nos levou à corrupção, a uma recessão económica e a níveis de criminalidade elevados”. “Deixámos de contribuir para a ditadura cubana, deixámos de enviar 300 milhões de dólares por ano, como se fazia”, afirmou Bolsonaro.

“A Venezuela que era um país democrático sofre agora da crueldade do socialismo. O socialismo está na Venezuela: toda a gente é pobre, não há liberdade. Fizemos o que pudemos para ajudá-los”.

A delegação de Cuba abandonou a sala enquanto o Presidente brasileiro falava, segundo o jornal Estado de São Paulo.

O tema seguinte foi a Amazónia - os incêndios na maior floresta tropical do mundo foram um dos assuntos mais polémicos deste Verão. “O meu Governo comprometeu-se com a defesa do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável”, assegurou Bolsonaro. “Somos um dos países que mais protege o ambiente. Os ataques sensacionalistas que sofremos devido aos incêndios da Amazónia instigaram o nosso sentimento patriota”, disse, frisando que um líder estrangeiro insultou o Brasil (referência a Emmanuel Macron).

“Um país, em vez de ajudar, embarcou nas mentiras dos media e portou-se de forma desrespeitosa e de forma colonialista”, disse o Presidente brasileiro. “Um deles, ousou sugerir a aplicação de sanções ao Brasil sem sequer nos ouvir.”

"O ser humano índio"

“É uma falácia dizer que a Amazónia é património da humanidade e é um equívoco dizer, como dizem os cientistas, que é o pulmão da humanidade”, afirmou, queixando-se da interferência de líderes estrangeiros. “Aqueles que nos atacam não estão preocupados com os indígenas como seres humanos, mas sim com as riquezas das reservas indígenas”, afirmou. 

“Vale ressaltar que há queimadas praticadas por índios e pessoas que moram na região. Problema qualquer país tem”, afirmou.

O que é necessário é um novo “modelo de desenvolvimento indígena” no Brasil, defendeu Bolsonaro, frisando várias vezes que os “nossos nativos são seres humanos”. Na visão do Presidente brasileiro, os índios estão a ser manipulados. “São usados como peças de manobra por interesses estrangeiros, usados por ONG que teimam em usar nossos índios para os manter como verdadeiros homens das cavernas. Índio não quer ser latifundiário pobre em cima de terra rica. Especialmente os Yanomani na reserva Raposa do Sol, onde existe diamantes, nióbio e outras riquezas, numa área enorme, de 20 mil km quadrados, o equivalente a Portugal, mas onde vivem apenas 15 mil índios. Esses interesses não estão preocupados com o ser humano índio mas com a biodiversidade e a riqueza nessas áreas”, declarou Bolsonaro.

O Presidente brasileiro leu extractos da carta de uma índia brasileira, Ysani Kalapalo, que tentou impor como uma nova porta-voz dos indígenas, em oposição ao conhecido cacique Raoni Kaiapó, um líder ambientalista.

Trump e os patriotas

Como é tradição desde 1955, o Presidente do Brasil é o primeiro chefe de Estado dirigir-se à Assembleia Geral. Segue-se sempre o dos Estados Unidos. 

Proclamando que o futuro pertence aos “patriotas”, não aos “globalistas”, Donald Trump tocou nos temas que se previam. Falou na imigração, explicando que está a trabalhar com os países vizinhos, sobretudo o México, para travar o fluxo, e ligando, como tem feito, imigração a segurança. "A imigração ilegal em massa é insegura para todos os envolvidos. Gostava de enviar uma mensagem para os activistas das fronteiras abertas: as suas políticas são más e dão poder às organizações criminosas”.

Falou na guerra comercial entre o seu país e a China, para dizer que quer um acordo com Pequim mas não a qualquer preço. Mencionou o Irão, que acusou de ser responsável pela instabilidade regional e de pretender obter armas nucleares, chamou “ditador” a Nicolás Maduro, o Presidente da Venezuela - e acusou Cuba de se aproveitar da riqueza venezuelana”. “O socialismo e o comunismo não são sobre justiça e igualdade. O socialismo não quer tirar os pobres da sua condição. Só quer o poder para a classe que ocupa o poder. A América jamais será um país socialista”, disse Trump. O Presidente dos EUA tem usado a arma da ameaça socialista nos comícios que tem realizado para promover a sua recandidatura nas eleições de Novembro de 2020 perante os candidatos do Partido Democrata, sobretudo Bernie Sanders e Elizabeth Warren.

Donald Trump terminou o seu discurso anunciando uma "iniciativa global de empoderamento das mulheres, para garantir que todas as mulheres do planeta possam ter propriedades e aceder aos mesmos postos de trabalho que os homens”.

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