Comandante de Bombeiros critica “graves omissões” do estudo de impacte do aeroporto do Montijo

Miguel Cardia, especialista em protecção civil, considera local escolhido “um dos piores” em Portugal para fazer um aeroporto

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daniel rocha

Miguel Cardia, comandante dos Bombeiros Voluntários de Samora Correia e coordenador do Serviço Municipal de Protecção Civil de Benavente, considera que a Base Aérea do Montijo é “um dos piores” locais que poderia ser escolhido em Portugal para construir um aeroporto. Numa exposição de 50 páginas, que entregou no âmbito da avaliação de impacte ambiental do projecto do novo aeroporto e remeteu aos mais altos responsáveis políticos do país, Miguel Cardia alerta para um conjunto de riscos de acidentes graves e/ou de catástrofes que, no seu entender, foram ignorados ou omitidos no estudo de impacte ambiental (EIA).

“Este processo de avaliação de impacte ambiental está ‘ferido de morte’ por várias ilegalidades, irregularidades e graves omissões cometidas, que deveriam levar à sua anulação imediata”, defende Miguel Cardia, que é também formador na área da protecção civil. No seu entender, essas falhas revelam-se em vários domínios, desde os riscos da proximidade de um terminal de 175 mil metros cúbicos de combustíveis e produtos químicos, aos riscos de sismicidade e de tsunamis, passando pelas dificuldades de socorro a um eventual acidente em pistas que terminam em zonas do estuário do Tejo cobertas de lodos.

Miguel Cardia conclui, por isso, que existem “graves omissões na elaboração do EIA, algumas delas clara e inequivocamente ‘fabricadas’ para que o EIA pudesse ser viabilizado” e avisa que, se a Declaração de Impacte Ambiental for favorável e o aeroporto do Montijo for construído, “os respectivos decisores técnicos e políticos terão para sempre uma total responsabilidade legal e moral” por eventuais acidentes graves.

O especialista em protecção civil enviou esta sua participação ao Presidente da República, ao primeiro-ministro, à Procuradora-Geral da República, à Provedora da Justiça e aos autarcas da região. No documento, acompanhado por muitos dados técnicos, começa por sustentar que o EIA “adultera falaciosamente” a realidade para menorizar os aspectos negativos “especialmente na análise (incipiente) de riscos de acidente grave ou catástrofe”.

Nesse sentido, Miguel Cardia sublinha que o EIA “omite que a Base Aérea do Montijo se encontra dentro da Zona de Perigosidade 1 do Alkon Terminal de Lisboa, que armazena, em 25 tanques à superfície, 175 000 metros cúbicos de derivados de petróleo e diversos para a indústria química, com destaque para o amoníaco, a apenas 3, 5 quilómetros do edifício principal do aeroporto”. Na sua opinião, o maior risco vem mesmo da presença do amoníaco, que em caso de libertação pode ser empurrado pelos ventos em direcção ao aeroporto gerando riscos muito graves para os utilizadores.

Miguel Cardia considera, também, “incompreensível” que a Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil não esteja representada na Comissão de Acompanhamento da Avaliação de Impacte Ambiental e alerta que a Base Aérea do Montijo está, também, numa das zonas de mais elevado risco sísmico do País. No seu entender, o desenho das pistas configura um elevado risco de acidentes com queda de aeronaves nas águas do Estuário do Tejo, onde as condições de socorro serão, sustenta, muito difíceis, podendo gerar enormes perdas de vidas.

“O estudo não cumpre as normas de 1000 metros após o final das pistas com boas condições de acesso”, salienta Miguel Cardia, vincando que a maior parte dos acidentes envolvem saídas das pistas e que, neste caso, as pistas previstas desembocam em áreas de muito difícil de acesso, com extensas áreas lodosas a descoberto nos períodos de maré baixa onde as embarcações não conseguem aceder. Os riscos de colisão com aves são também abordados por Miguel Cardia, que sublinha, num movimento anual de 46 mil voos, podem ocorrer mais de 149 colisões, com aves de muito maior porte do que as circundam o actual Aeroporto de Lisboa.

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